Logo
no segundo ou terceiro dia no Hospital da Restauração, meu estado de saúde
piorou muito. Comecei a ficar por demais enjoado e a vomitar sem parar. As
enfermeiras ou atendentes vieram, os médicos foram avisados da situação
delicada e imediatamente as medidas necessárias foram tomadas.
Fui
colocado numa maca e conduzido ao bloco cirúrgico. Eu estava fraco, o enjoo não
passava, nem ao menos a vontade de vomitar. Terezinha ao meu lado, todos os
segundos, dava-me forçar para lutar, não desanimar e crer que ficaria bom.
Fiquei
por 20 ou 30 minutos num determinado local, numa “fila de espera”, com outros
doentes em volta, cada um em sua maca.
Até
que fui conduzido a uma sala de cirurgia e lá me deram uma anestesia e apaguei.
Os
médicos fizeram uma microcirurgia para colocação de uma válvula ou dreno na
cabeça. Fizeram uma incisão na barriga e outra na cabeça para colocar a tal
pecinha, que agora carrego comigo para o resto da vida, assim como a marca
abaixo do tórax.
Com
o dreno o líquido do tumor e do cisto, alojados ao lado do cérebro, iria escoar
– não sei se essa é a expressão exata a ser usada, pois sou completamente leigo
em medicina – por caminhos corretos, sem me causar tantos danos. Isso faria com
que os enjoos e os vômitos diminuíssem ou parassem.
Quando
voltei a si já estava novamente na minha cama na enfermaria 505. Por conta dos
efeitos da anestesia, para evitar que eu fizesse alguma besteira enquanto me
recuperava do procedimento adotado, amarraram as mãos e os pés nas grades
levantadas em redor do leito.
Como
não tinha sido avisado de nada do que ia acontecer estranhei ficar preso
daquela maneira e o fato de não poder praticamente movimentar as mãos, os
braços e as pernas me deixaram verdadeiramente desesperado.
Quanto
mais ficava consciente maior a angústia e com pouco eu estava implorando a
minha companheira Tereza que me desamarrasse. Ela, instruída pelos médicos a me
deixar daquele modo explicava não poder fazer nada o que me levou a ficar
revoltado com ela.
Lembro-me
de ter dito, magoado: “Filhinha, tanto que nos amamos e você permite que eu
fique assim, amarrado. Por amor de Deus me solte...”. Vi lágrimas rolando dos seus olhos azuis, certamente pelo meu sofrimento e pela sua impotência diante do caso.
Essa
situação angustiante durou pelo menos dois dias, apelei também para as
enfermeiras e atendentes, mas ninguém atendeu os meus pedidos e continuei preso
às grades, vivendo alguns dos piores instantes da minha vida.
Acredito
que todos reagem do mesmo jeito quando são presos daquela maneira, pois dias
depois vi de perto outros pacientes serem amarrados ao leito e ficarem tão
nervosos quanto eu fiquei.
Felizmente
no terceiro dia eles me liberaram e foi uma felicidade ter os pés e as mãos
livres novamente. Hoje eu entendo perfeitamente a atitude dos médicos e
auxiliares, assim como da minha mulher. Todos estavam apenas preservando a vida
do paciente, que não estava em condições de ficar solto enquanto não passasse
totalmente o efeito da anestesia que tinham me dado.
Por
sinal enquanto não fizeram a cirurgia para retirada do tumor e do cisto, com a
doença avançando, fiquei muito instável durante a noite, a pressão aumentava e
eu como que me descontrolava – às vezes até durante a madrugada. Terminei, em
alguns momentos, sem consciência do que fazia, sendo grosseiro com Terezinha,
Tiago e minha filha Roberta.
Disse
coisas terríveis para eles que jamais falaria em condições normais. Algumas das
besteiradas que fiz na madrugada do Recife
só tomei conhecimento depois, porque minha mulher me contou os detalhes.
Uma
ocasião, ela revelou, eu levantei da cama e saí correndo pelo corredor do
hospital, tentei até escalar uma janela (felizmente não consegui, lembrando que
estávamos no 5º andar) e Tereza desesperada tentando me devolver a razão,
pedindo ajuda de alguém, porém todos estavam dormindo nessa hora.
No
outro dia eu não lembrava absolutamente de nada.
Depois
as coisas se normalizaram mais, nós íamos vivendo aquela vida “comunitária”
dentro da enfermaria do Restauração, enquanto esperávamos o dia da bendita
cirurgia para retirada do tumor e do cisto.
O ELETRICISTA - Um
dos pacientes do hospital era Arlindo, um rapaz que morava no bairro dos
Coelhos, no Recife, e que viu de perto o “trabalho” que eu estava dando a minha
companheira e acompanhante. Ele ganhava ou ganha a vida como eletricista.
No
dia seguinte a um “sermão” que dei em Terezinha, Arlindo me aconselhou a ficar
mais calmo e tratar melhor a mulher. Disse que ela era uma grande companheira,
que todo mundo via ali o amor que ela me dedicava e era injusto
responsabilizá-la por qualquer sofrimento meu.
Fiquei
envergonhado, é claro. Mas a verdade é que agi daquela maneira com uma mudança
de comportamento ditada pela doença.
Esse
rapaz, o Arlindo, parecia um sujeito calmo e nem parecia estar num hospital,
com tanta serenidade que aparentava.
Ele
teve alta antes de mim, porém depois teve de voltar. Vejam que situação: tinha
também um tumor na cabeça, já tinha sido operado duas vezes e como os médicos,
talvez por imperícia, não tinham conseguido retirar tudo iria passar por uma
terceira cirurgia.
Arlindo
estava triste e aborrecido com razão. Ninguém merece passar três vezes por uma
situação daquelas, arriscando a vida, ainda mais quando se sabia que os
médicos, se tivessem sido mais eficientes, poderiam ter resolvido o problema do
rapaz desde a primeira vez.
Quando
saí do HR e retornei 30 dias depois para a primeira revisão médica, Arlindo
ainda estava na enfermaria esperando sua vez.
Não
tive notícias mais dele. Peço ao bom Deus que proteja o eletricista recifense e que os médicos
lhe tenham deixado curado de sua doença para sempre.
(Continua...)
Roberto....que bela série, parabéns mais uma vez, pelo grande cidadão que es, pela perseverança e paciência da família...tudo isto é amor!
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