A expressão “libanização” foi
cunhada para designar aquelas sociedades onde o estado deixou de funcionar,
enquanto agente público responsável pela segurança dos cidadãos e cidadãs. A
“libanização” ocorre quando o ente público-estatal perdeu o monopólio legal da
violência e esta passa a ser utilizada por milícias paramilitares ou
particulares com objetivos e interesses próprios, ao largo de qualquer ordem
jurídica, constitucional ou legal. Ela expressa assim o caos e a anomia
reinante num país ou região.
A situação do estado do Rio
de Janeiro, paradoxalmente governado por um bispo da Igreja Universal e um juiz
aposentado, evangélico e conservador, vem se aproximando inquietantemente de um
estado de anomia ou “libanização”, não só por um aumento exponencial da
violência contra cidadãos e cidadãs comuns, mas inclusive contra parlamentares
da oposição de esquerda. Se já eram preocupantes a ameaça e os ataques por
questões de intolerância religiosa sexista ou de homofobia, imagine-se a
escalada da violência contra deputados e vereadores escolhidos como alvos dessa
intolerância. Como se diz, no estado fluminense os milicianos que exploram os
moradores das comunidades mais pobres são o Estado, não há outro poder
disciplinador que garanta a segurança e os direitos desses moradores.
Contudo, mas assustador é
pensar que o modelo “libanizador” do Rio de Janeiro pudesse ser exportado para
o resto do país como resposta à violência, aos assaltos e homicídios praticados
contra os habitantes de outras grandes cidades brasileiras (Belém, Fortaleza,
Recife). Aqui há uma perigosa convulsão de dois elementos: primeiro, o discurso
do endurecimento do combate à violência, como solução para a insegurança
jurídica e física das pessoas. Vai nesta linha, por exemplo, a liberalização da
venda de armas e o recente do juiz-ministo da Justiça, Sérgio Moro, em relação
ao comprimento de penas ou ao regime de progressão das penas, tanto quanto a
construção de mais presídios e mais policiais. Esta é uma resposta que visa
tranquilizar os eleitores de Jair Bolsonaro e ao mesmo tempo para atender aos
interessas da chamada bancada da bala. O segundo elemento é mais sério: A
bandidagem organizada em negócio altamente lucrativo, através de achaques,
extorsões e ameaças aos cidadãos amedrontados das periferias urbanas.
Agora, o arremate final: E se
o discurso de endurecimento de combate à violência fosse uma cortina de fumaça
para esconder da sociedade a ligação entre membros do atual governo e essas
bandidagens organizadas, através de um esquema “de participação nos lucros”
nesse negócio criminoso, que prospera à margem da falta e poder público – isto
é o que parece vir a tona pelas últimas informações sobre a maneira como o
patrimônio como um dos filhos do Bolsonaro vem crescendo vertiginosamente. E a
sua relação com figuras que atuam no submundo desses negócios escusos
alimentando suas contas bancárias, através de sucessivos depósitos feitos por
assessores parlamentares e pessoas de confiança da família Bolsonaro?
“Modelo perigoso esse. O
fascismo e o nazismo sempre empregaram a violência de Estado contra os
opositores e discordantes. Mas havia aí um conteúdo político, uma doutrina, um
pensamento. Mas o processo de “libanização” do Estado brasileiro parece estar a
serviço de interesses inconfessáveis e não ousam dizer o seu nome ou mostrar a
sua cara.
*Imagem: Zguiotto
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