Esse verso é do poema "A Triste Partida", do cearense Patativa de Assaré, eternizado na música homônima interpretada por Luiz Gonzaga.
Não estamos vivendo um período de seca, como retratado na canção, mas estamos nos aproximando de dezembro, do final do ano.
Os anos passam rapidamente.
Parece que foi ontem que estava em pé, no Hospital Português, no Recife, esperando o nascimento de Maria Roberta Martins de Almeida, minha primeira filha.
Quando a vi experimentei um sentimento nunca vivenciado antes. Uma sensação de continuidade e a ilusão da eternidade.
De certa maneira isso está certo. Ela carrega meus genes e os passou também para Cassiano, meu neto.
E muitos anos depois de minha partida eles ainda estarão aqui, como "pedaços de mim".
O ano era o de 1979, o mesmo em que Arraes voltou a Pernambuco e foi recebido por 60 mil pessoas em Santo Amaro, no Recife. E eu estava lá, momento inesquecível da história, das lutas políticas pernambucanas.
Apenas um ano antes ingressara no curso de jornalismo, na Universidade Católica, onde conheci algumas das pessoas mais interessantes de toda minha vida.
Gente que gostava de teatro, cinema, literatura, música, pintura e até de política.
Era um desbunde. Antes da entrada nos anos 80 e na turma já se falava abertamente de sexo, mulheres demonstravam preferência por mulheres, homens por homens e ninguém estava nem aí para as preferências de cada um.
Ainda não havia damares nem nikolas, o Brasil vivia sob uma ditadura, porém de certa maneira parecia menos careta, pelo menos para nós, jovens, embriagados pela poesia e desejos de mudar o mundo.
Foi lá que conheci Judy, mãe de Roberta, de Lulinha e João Paulo.
Velhos tempos, belos dias...
A Jovem Guarda já tinha acabado, é claro e os ídolos não eram mais os mesmos.
Aquela moçada gostava mais de Chico, Caetano, Gonzaguinha, Simone, Rita Lee, Bethânia, Ivan Lins...
Rita e Gonzaga Júnior já estão no outro plano.
A roqueira eu vi de perto uma vez, no Festival de Inverno de Garanhuns, defendendo a nome de Lula para presidente.
Assisti um show de Gonzaguinha no Teatro do Parque, só voz e violão. Ele começou a apresentação, vestido todo de branco, interpretando de forma bastante emotiva a belíssima "É Preciso".
Já se passaram 48 anos desde tempo de Unicap e de sonhos. Daqui a pouco completa meio século.
Muitos já se foram, alguns bem jovens, e ainda estou aqui, exilado entre sete colinas, recolhido a minha casa simples onde criei mais três filhos, vivi uma nova paixão, saí pelo mundo, até que o destino me fez parar.
Mas nunca reclamei. Apenas dói um pouco envelhecer sem o conforto provavelmente merecido.
Sonhei demais e não doei aos filhos todo o ouro que eles merecem e precisam.
Vivi com a ilusão que basta o amor.
Já no final deste mês começam as festividades do Encantos do Natal.
Aqui tudo é mais tranquilo, em relação à capital. O clima é melhor, pode-se apreciar com calma a beleza da cidade, os amigos estão próximos e se dá bom dia à vizinha com sinceridade, de segunda a domingo.
Antes, a cada final de ano, milhões pelo país esperavam o lançamento do disco de Roberto, que em dezembro estava nas lojas; as músicas tocando em todas as rádios e na avenida, no serviço de som.
Agora tudo está na internet, que engoliu as rádios, os jornais e até diminuiu a força da TV.
E o Rei está velho e esquecido.
Tenho sete filhos, sete netos, uma mulher que envelheceu comigo, que suporta minhas idiossincrasias e que não mantém mais a serenidade imensa dos primeiros anos.
Porque o tempo passou...
Com ele vêm os cabelos brancos, as rugas, as doenças, as impaciências e impertinências.
Faz parte.
"Cada coisa tem o instante em que ela é. Eu quero me apossar do É da coisa". Clarice Lispector.
"Se Deus não existe, então tudo é permitido". Dostoiévski.
"Se eu não acreditasse em Deus seria um homem desesperado". Ariano Suassuna.
"Antes que o céu e a terra existissem
Já era o Ser
Imóvel, sem forma,
O Vácuo, o Nada, berço de todos os Possíveis". Lao-Tsé.
Já estamos perto de dezembro, meu Deus que é de nós?
Dezembros (assim mesmo, no plural), que inspirou o título da crônica, é uma bela canção assinada por Zeca Baleiro, Fagner e Fausto Nilo. Essa música se encaixa bem nesse final, pretensiosamente filosófico.
a reflexão sobre o final do ano, a aceitação e o processo de envelhecer, e a importância de revisitar memórias para valorizar a vida. A tranquilidade nos dá a calmaria de viver em melhor qualidade os pequenos momentos diante do alvoroço da correria do dia a dia. E que venha o Natal nos resgatar dos tempos idos e que nem tudo foi tempo perdido pois éramos tão jovens.
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