Por Altamir
Pinheiro
O nordestino, de um modo geral é um povo espiritual
e místico. O capoeirense em particular, além do exercício espiritual que
pratica, por natureza é devoto de corpo e alma. Para esse povo, Deus não é um
PROBLEMA mas uma SOLUÇÃO de seus problemas e o sentido derradeiro de seu viver
e de seu morrer. Ele sente Deus acompanhando seus passos, celebra-o nas
expressões do cotidiano como as famosas frases de terminações adjetivadas no
seu cotidiano quando diz: "se Deus Quiser", “meu Deus”, “graças
a Deus”, “Deus lhe pague”, “Deus o acompanhe" “queira Deus” e “ que Deus o
abençoe e Frei Damião siga os seus passos e que seja o seu guia”. Geralmente, os
mais velhos, ao desligar o telefone se despedem com o tradicional “fique
com Deus”. Se não tivesse Deus em sua vida, certamente, não teria resistido com
tanta fortaleza, humor e sentido de luta no seu dia-a-dia de ostracismo social.
No tocante a religião CATÓLICA, o povo em geral não
demonstra de uma maneira autoritária ser obcecado em suas crenças, quase
sempre dispensa o fanatismo religioso. Esse mesmo povo é apenas tolerante, pois
crê que Deus está em todos e todos os caminhos terminam nele. No que diz
respeito ao PROTESTANTISMO versus CATOLICISMO, durante séculos, eles
se combateram oficialmente e, hoje, o clima é muito fraterno, haja vista no
religioso município de Capoeiras haver um grande progresso em direção a
uma convivência harmoniosa e frutífera e porque não dizer que toda essa
fraternidade, benevolência e irmandade se expressam ou se expandem
por todo o Agreste Meridional.
Para melhor se compreender a identidade religiosa
dos nordestinos, nada mais adequado do que começar fazendo uma célebre citação
das maiores expressões da literatura brasileira, e vamos começas pelo escritor
EUCLIDES DA CUNHA (1866-1909), célebre autor do livro OS SERTÕES. Senão
vejamos: “A princípio êste reza, olhos postos na altura. O seu primeiro
amparo é a fé religiosa. Sobraçando os santos milagreiros, cruzes alçadas,
andores erguidos, bandeiras do Divino ruflando, lá se vão, descampados em fora,
famílias inteiras – não já os fortes e sadios senão os próprios velhos
combalidos e enfermos claudicantes, carregando aos ombros e à cabeça as pedras
dos caminhos, mudando os santos de uns para outros lugares. Ecoam largos dias,
monótonas, pelos ermos, por onde passam as lentas procissões propiciatórias, as
ladainhas tristes. Rebrilham longas noites nas chapadas, pervagantes, as velas
dos penitentes”. (Cunha, 1967, p. 101.)". Isto posto ou lido, é uma prova
cagada e cuspida de quem tem orgulho de ser nordestino e, depois da Bíblia
Sagrada, o livro de cabeceira de todo esse nosso povo sertanejo ou agrestino
seria OS SERTÕES, leitura que valoriza e propicia a gente conhecer um pouco
mais da história do bravo povo nordestino, seus hábitos e costumes
Ninguém melhor do que a cidade de Capoeiras para nos
brindar com as eternas caminhadas missionárias, donde nos vem a lembrança, do
então prefeito José Valtaso de Macedo, ao patrocinar para sua comunidade as
famosas Santa Missões com a presença IN LOCO do missionário Frei
Damião de Bozzano. O famoso frade capuchinho que foi uma figura
importante e polêmica na história do catolicismo popular sertanejo do Nordeste
brasileiro, quando sua presença foi marcante e quase que rotineira nesse
município agrestino, ocasião que levava multidões ao se deslocarem para aquela
cidade vindo de todos os CANTÕES desta vasta região. Multidão que, muitas das
vezes superava um contingente que hoje frequenta o Festival de Inverno de
Garanhuns.
Vem ou salta aos nossos olhos a extensão da FILA que
se formava na Igreja de São José, com o povo em sentido de prontidão para se
dirigir ao confessionário do religioso. Daí, hoje, se faz uma indagação: Por
que o povo gostava de se confessar com o Frei Damião?!?!?! Porque ele tinha
fama de Santo. A sua fama se espalhou devido ao seu visual, a sua imagem, o
aspecto performático. Também pela sua austeridade: o jejum, a penitência. O
povo dizia que ele não dormia, apenas tirava um cochilo deitado no chão. As
pessoas chegavam a dizer que ele voava numa nuvenzinha. Naquela época, as
pessoas viviam aflitas pelo fim do mundo. O sucesso de Frei Damião é que ele
provocava no povo uma purificação, um prazer coletivo. Não com relação ao que
faz o neo-pentecostalismo hoje. Não era um show como se faz hoje nas Igrejas e
nas praças. O SHOW ERA A PRÓPRIA IMAGEM DO FREI.
E assim caminha Capoeiras em sua eterna devoção. A
vibração dos devotos em função da figura santa de Frei Damião era uma coisa
santificada presenciada por todos nós, tudo isso acompanhado pelo até hoje
Padre Geraldo. Leonardo Boff, conhecido como o pai da Teologia da
Libertação no Brasil e teólogo, é enfático em dizer que os pais passaram aos
filhos o que Frei Damião, em suas missões, sempre repetia. Ele simbolizava a
continuidade, o patrimônio cultural do povo do Nordeste brasileiro. Os
seus milagres e os seus aconselhamentos confirmavam a herança recebida. A bem
da verdade, o povo queria era sempre tocá-lo, vê-lo, ficar perto dele, sentir a
sua santidade. É por essas e outras (Festa de São José), que
Capoeiras tem um povo devoto e temente a Deus e a Frei Damião também!!!
*Na foto a estátua de Frei Damião, inaugurada na Serra do Quati, no início da década de 90, na administração do prefeito Zezinho. O religioso italiano esteve presente a este momento, acompanhado por Frei Fernando, Monsenhor Geraldo de uma multidão.
Foi em uma dessas Santa Missão que eu fui daqui de Garanhuns, arrumei uma namorada e hoje é minha Santa esposa. eheheheheh
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