De Eduarda Barbosa, na Folha
de Pernambuco:
Depois de perdas provocadas
por seis anos de seca, os produtores de leite de Pernambuco agora enfrentam uma
nova crise: a queda das compras por parte das indústrias de laticínios, que
estão optando pela mercadoria em pó de grandes produtores de outros estados e
até de fora do País.
Bacia
leiteira encara queda de vendas e de preços em PEFoto: Ed Machado/Folha de Pernambuco
A bacia leiteira de Pernambuco enfrenta uma
nova crise.
Depois de seis anos críticos
devido à seca, o problema agora está na dificuldade de escoamento da produção,
com o represamento da mercadoria e preços em queda livre. Isso ocorre porque as
indústrias de laticínios instaladas em Pernambuco estão comprando o leite em pó
de outros estados do Brasil e até mesmo de outros países como matéria-prima. Nesse
cenário, os produtores de leite local estão comercializando apenas para as
queijarias e algumas fábricas, o que tem provocado perdas financeiras para a
maioria deles.
Vendido há seis meses por cerca de R$ 1,50, o litro do
leite hoje está sendo comercializado pelos produtores por aproximadamente R$ 0,90. Uma queda
considerável diante de uma realidade que deveria ser de retomada do
fornecimento.
“As indústrias
estão comprando leite
em pó em outros lugares por ser mais barato e por não
precisarem ir buscar o leite nas fazendas, já que isso representa um custo
elevado. Essas empresas conseguem comprar mais barato em outros lugares porque
são países e estados que produzem muito e possuem grande estoque. Muitas vezes
o leite está perto de vencer, por exemplo, e o preço cai bastante”, explicou o
presidente do Sindicato
dos Produtores de Leite de Pernambuco (Sinproleite-PE), Saulo
Malta.
Atualmente, Pernambuco concentra cerca de 400 mil produtores de
leite, contabilizando os de todos os portes. Esse número representa
aproximadamente uma produção de 1,6 milhão de litros de leite por dia no
Estado.
Produtor de leite há 35 anos, Edson Felix
teve prejuízo durante todos os meses deste ano, sendo novembro o período mais
crítico. “No mês passado, perdi cerca de R$
0,15 por litro de leite. Isso representou uma perda de R$ 18 mil porque a cada
dia eu produzo 4 mil
litros. E essa situação de perdas vem acontecendo desde o
início deste ano”, relatou Felix,
que é proprietário da Fazenda
Baronesa, localizada no município de Altinho, Agreste de Pernambuco.
Com 180
vacas em produção, o fornecedor se vê diante de uma difícil
situação financeira. “Eu não sei quanto vai ser o litro do leite em dezembro
porque a empresa não informa com antecedência. Acaba sendo imprevisível para os
produtores”, defendeu Felix.
O produtor rural Álvaro Carrazzoni,
proprietário da Fazenda
Pedra Preta, também afirma que a relação está difícil com a
indústria. “A bacia leiteira é concentrada nas cidades de Bom Conselho, Pedra e
Venturosa, por exemplo. Quando o leite não é comprado localmente, esses
municípios sofrem com o desemprego”,
destacou Carrazzoni.
Entre os principais locais de onde as
indústrias compram o leite em pó estão países como o Uruguai e a Argentina. No Brasil,
se destacam o Grande do
Sul, Santa
Catarina e Paraná.
“Este é o período do ano em que se tem mais produção de leite no Brasil e os
preços caem consideravelmente. Por isso, há um desespero por parte dos
produtores do Rio Grande
do Sul, Paraná
e Santa
Catarina, principalmente, para poder escoar a produção. O
momento é mais difícil para o Nordeste porque a região é invadida por produções
de outras regiões onde está sobrando leite”, registrou o presidente da Federação da Agricultura de Pernambuco (Faepe),
Pio Guerra.
De acordo com o Sindicato das Indústrias de
Laticínios e Produtos Derivados do Estado de Pernambuco (SindiLeite), o problema
central está relacionado à liberação da hidratação do leite, ou seja, o produto
em pó poder ser transformado em líquido. “A culpa não é das indústrias porque a
indústria é uma empresa que vai em busca de lucro e de melhorias econômicas.
Elas compram de locais em que a produção é de larga escala e por isso têm
preços menores. Então o que deveria ser feito é o governo proibir a hidratação
do leite. Assim, a produção local será incentivada”, explicou o presidente do SindiLeite, Alex Costa.
Para os produtores do Estado, as indústrias poderiam
incentivar a produção local, já que elas são implantadas com benefícios fiscais
do Governo Estadual.
“Essas empresas vieram para Pernambuco com benefícios fiscais do ICMS através
do Prodepe [Programa
de Desenvolvimento de Pernambuco]. Então, defendemos que o esforço do produtor
local seja reconhecido porque a compra do leite gera renda para toda a região”,
defendeu Felix.
Por sua vez, o Governo de Pernambuco estuda a
possibilidade de criar uma forma de as indústrias comprarem uma cota mínima do
leite local. “Os outros estados têm uma produção em larga escala, então as
indústrias negociam melhores preços a grande volume. E o outro ponto é que o
leite em pó quando chega a Pernambuco
já tem passado pelo processo de controle de qualidade. Então as
empresas não se preocupam em comprar o leite in natura para ainda ser
fiscalizado pelos órgãos fitossanitários”, explicou o presidente da Agência de Desenvolvimento Econômico de
Pernambuco (AD Diper), Antônio Xavier.
No entanto, o Governo entende que é justo o pleito dos
produtores, já que a competitividade fica desigual. “O deputado Claudiano Filho (PP)
apresentou um projeto para que as indústrias comprem um mínimo de leite do
produtor local. A AD Diper recebeu essa solicitação e incluiu no conselho do
Prodepe para ser discutida. Então, estamos trabalhando em um ponto de consenso
para que os fornecedores de Pernambuco consigam comercializar a produção
atendendo a uma qualidade e a uma quantidade que as indústrias necessitam”,
disse Xavier, ao informar que a discussão deve acontecer na AD Diper ainda este
mês, possivelmente na próxima reunião que será realizada no dia 27.
Queijaria artesanal é saída para o
setor
Diante das dificuldades para escoamento da
produção do leite para as indústrias,
muitos produtores estão vendendo a mercadoria para as queijarias artesanais
presentes em Pernambuco.
Essa comercialização minimiza o problema do leite represado e até mesmo o leite
que está sendo jogado no lixo em alguns locais. Nesse cenário, as queijarias
representam um setor importante, já que utilizam 100% do leite do fornecedor
local para produzir a mercadoria.
De acordo com o presidente do Sindicato dos Produtores de Leite de
Pernambuco (Sinproleite-PE), Saulo Malta, essa é uma
alternativa que reduz o problema. “O leite daqui está indo para as queijarias,
que também estão com muito queijo. Acontece que as queijarias também não estão
com demanda de venda suficiente e os preços do produto também foram reduzidos”,
explicou Malta.
Desde setembro o preço do queijo está sendo
vendido mais barato para o comércio. “Houve uma queda no preço do queijo em
torno de 20% a 30%, sendo novembro o mês de queda mais acentuado. Isso porque
estamos comprando o leite mais barato dos produtores e também porque precisamos
vender por um preço menor para enfrentar a concorrência das queijarias
informais, que vendem mais barato”, explicou o representante da Associação de
Certificação de Queijo Coalho do Agreste de Pernambuco, Romildo Bezerra.
No entanto, Bezerra explica que o preço do queijo não está sendo
reduzido para o consumidor final por motivo comercial. “Nós estamos vendendo
para as empresas do comércio com preços mais baratos, mas eles não repassaram
para o consumidor final”, disse Bezerra. Atualmente, 38 queijarias artesanais
são registradas na Agência
de Defesa e Fiscalização Agropecuária de Pernambuco (Adagro).
Segundo dados do Sinproleite-PE, mais de 90% das queijarias são de pequeno e
médio porte no Estado.
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