Do
jornalista pernambucano Flávio Tiné, hoje radicado em São Paulo, no seu
prestigiado blog:
Em março
de 1964, quando assessor de imprensa da prefeitura do Recife, tomei por
empréstimo um gravador da Agência Nacional, na época dirigida pelo jornalista
Antônio Avertano Barreto da Rocha, para gravar discurso do presidente João
Goulart e, se necessário, mostrar ao chefe de Gabinete, Paulo Cavalcanti, e ao
prefeito Pelópidas Silveira. Ninguém pediu o tal discurso, que podia ser ouvido
em qualquer emissora de rádio ou lido nos jornais. As Forças Armadas estavam de
prontidão e o clima era tenso.
Além
do gravador, levara para a assessoria meu pequeno rádio Semp. Algumas pessoas
estranharam ao ver-me sair da prefeitura com tais equipamentos sonoros debaixo
do braço. Atravessei a ponte e fui ao prédio dos Correios, na avenida
Guararapes, onde funcionava a Agência Nacional. Devolvi o gravador e exigi um
recibo, assinado pelo jornalista Moacir Sena Dantas, que conservo até hoje.
Dia
seguinte, o Jornal do Comércio noticiou que eu fugira da prefeitura levando
poderoso sistema de comunicação, com o qual mantinha contato com os comunistas,
que queriam tomar o Poder no país. Também conservo o recorte do JC até hoje.
O singelo episódio mostra a paranóia reinante à época entre os que temiam a
tomada do Poder pelos comunistas, que segundo os estatutos do Partidão defendiam
uma revolução pacífica, sem uso da força, pelo convencimento das pessoas. Claro
que entre os comunistas havia os descontentes, os que defendiam atitudes mais
práticas, violentas, tanto é que novos grupos de esquerda, mais radicais, foram
surgindo. O Partido Comunista Brasileiro (PCB), também conhecido como Partidão,
deu origem ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), sem vínculos com Moscou, e
novas agremiações foram surgindo no seio da sociedade e entre católicos. Mesmo
assim, não chegamos a virar Portugal, que na década de 70 possuía dezenas de
partidos comunistas.
Atualmente,
alguns intelectuais admitem a iminência de novo golpe de direita. O temor se
baseia em atitudes pouco claras, aqui e ali sutilmente manifestas. Resta-nos
esperar que a liberdade de expressão de que desfrutamos atualmente clareie
essas suspeitas, revelando todas as suas nuances e provocando reações
antecipadas. O temor de que o Governo está se revelando ditatorial não passa de
uma idiossincrasia de descontentes. Não justifica a ocupação de cargos públicos
com o objetivo de dominar administrativamente o país. (Na ilustração o livro do cartunista e escritor Henfil com um dos seus mais famosos personagens: "Ubaldo, o paranoico).
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