Quando Fernando Collor foi presidente do Brasil o cinema
nacional foi à lona. O País das Chanchadas da Atlântida, dos filmes cabeça de
Glauber Rocha, da Palma de Ouro em Cannes com “O Pagador de Promessas”, dos
pornochanchadas dos anos 70, das promessas dos anos 80, tudo isso como que
desapareceu na gestão do alagoano descompromissado com um projeto cultural para
a Nação.
Em 1994 uma jovem atriz e cineasta, Carla Camurati, realizou
um filme fugindo aos padrões nacionais ou mesmo estrangeiros e contou um período
importante da História do Brasil de um modo pra lá de satírico. O longa,
lançado ainda na fase difícil da produção cinematográfica nacional, foi um
grande sucesso de crítica e de público, marcando o que seria rotulado como a “retomada
do cinema brasileiro”.
Carlota Joaquina, Princesa do Brasil”, este o nome do filme
de Camurati, possibilitou que cineastas e atores tomassem gosto novamente pela
sétima arte no país e após esse êxito comercial muitas outras produções
tupiniquins chegaram às salas de exibição do Sudeste, Sul, Centro Oeste, Norte
e Nordeste.
Destaque para a boa direção de Carla e o banho de
interpretação de Marieta Severo e Marco Nanini, que interpretam respectivamente
o rei Dom João VI e a princesa, depois rainha, Carlota Joaquina.
O longa é praticamente um “escracho” e arrasa com
personagens históricos de Brasil e Portugal, como Dom João, Carlota e Dom
Pedro. Exageros à parte o filme é engraçado e desperta o interesse de jovens
estudantes e adultos de todas as idades por saber um pouco mais sobre um
determinado período da vida nacional.
Abaixo vou transcrever um artigo de João Luís de
Almeida Machado, doutor em educação pela PUC, São Paulo, que escreveu um texto
muito bom sobre o filme “Carlota Joaquina”. As impressões do acadêmico a
respeito do filme são semelhantes a do jornalista e ele analisou o trabalho de
Carla Camurati com muita propriedade, daí termos escolhido sua crítica para
ilustrar nossa série Filmes Inesquecíveis.
“Carla Camurati é saudada como a responsável pelo sucesso
abre-alas da retomada do cinema nacional depois dos problemas da Era Collor, em
que a produção tupiniquim quase pereceu de vez. Jovem cineasta de talento,
atriz promissora que se revelou competente em sua carreira, Carla resolveu
filmar a história do Brasil, em busca de nossas raízes e acabou escolhendo o
período em que a família real portuguesa, acuada pela invasão das tropas
napoleônicas, cruzou o Atlântico e se instalou no Brasil.
“História de difícil digestão quando estamos numa sala de
aula, o filme de Camurati acabou se transformando num grande sucesso. Reduzida
a fatos como a abertura dos portos às nações amigas, aos tratados de comércio e
navegação ou a chegada da Missão Francesa, a apresentação do chamado Período
Joanino pode ser realmente entediante. Aliás, é necessário que os professores
passem a usar recursos como esse filme para dinamizar a aula, gerar maior
interesse entre os alunos, fazê-los entender que esses acontecimentos e
personagens realmente existiram!
"Como qualquer filme, há várias liberdades tomadas pela
diretora e pelos roteiristas, nada que possa comprometer o aproveitamento do
recurso ou o desenvolvimento da temática em aula. Basta ter discernimento para
apontar as idéias ou princípios que mais lhe interessam para a composição e,
estar por dentro do assunto que será possível fazer bom uso desse material.
"A grande crítica que se faz ao filme "Carlota
Joaquina" reside no aspecto caricato dos membros da família real
portuguesa, principalmente Dom João e a própria Carlota. Dom João é comilão,
preguiçoso, influenciável e um governante indeciso (às vezes, irresponsável).
Carlota tem um apetite sexual insaciável, tendo passado Dom João para trás
várias vezes, o que não lhe causa nenhum tipo de arrependimento ou remorso.
Pode-se perceber nessa caracterização uma tentativa de apresentar elementos que
nos permitam visualizar em Dom João um retrato da nobreza européia. Em Carlota,
podemos entrar em contato com os hábitos dessa nobreza no que se refere aos
casamentos e relacionamentos amorosos onde não há vínculos estreitos já que se
tratavam de acordos que uniam famílias, posses e poder.
"Outro aspecto interessante a se destacar reside na
influência dos ingleses quanto à vinda da família real para o Brasil. Isso
normalmente é ressaltado no desenvolvimento das aulas, o personagem de Lorde
Strandford serve como referência importante a esse acontecimento e pode fazer
com que se desenvolva uma discussão em que se debatam os interesses que moveram
a Inglaterra a auxiliar a fuga de Dom João e companhia.
"A chegada a terras brasileiras e a adaptação de lusos ao
novo ambiente e de brasileiros aos hábitos dos visitantes ilustres também
merece destaque. A necessidade de ceder suas casas aos portugueses, os apertos
relativos ao mercado e a pequena oferta de alimentos e demais gêneros (que
causavam aumento de preços) foram alguns dos problemas enfrentados pelos
brasileiros. O calor, os novos alimentos, a convivência muito estreita com
negros e mestiços e os insetos foram dificuldades encontradas pelos portugueses
no Brasil.
"Há seqüências que, a princípio, deveriam ser encaradas como
trágicas, mas que são hilárias, como no caso da retirada da família real
portuguesa da metrópole (que D. Maria, a louca, entendeu como sendo uma fuga)
ou a primeira noite do casal João e Carlota, ainda jovens, que quase terminou
em tragédia.
"Preste atenção aos hábitos despojados da corte no Brasil que
contrastam enormemente com a morbidez dos mesmos personagens quando viviam em
Portugal. Infelizmente, Carla Camurati não contou com um orçamento generoso, o
que restringiu as possibilidades de uma grande reprodução de época, no entanto,
no geral as locações e os figurinos não comprometem a compreensão desse
período, pelo contrário, tentam ser fiéis ao que conhecemos de então.
"Se por um lado faltaram dinheiro e recursos materiais, por
outro, o elenco colocado à disposição para as filmagens foi de primeira.
Especial destaque para Marieta Severo como Carlota e para Marco Nanini como Dom
João, eles estão impagáveis e muito seguros em seus papéis. Bem conduzidos,
realizaram uma pequena pérola do cinema nacional".
*Filmes nacionais resenhados nesta série:
1. O Pagador de Promessas
2. Vidas Secas
3. Cidade de Deus
4. Central do Brasil
5. Tropa de Elite
6. O Quatrilho
7. Dois Filhos de Francisco
8. Carandiru
9. Pixote - A Lei do Mais Fraco
10. Pra Frente Brasil
11. Eles não usam Black-Tie
*Filmes nacionais resenhados nesta série:
1. O Pagador de Promessas
2. Vidas Secas
3. Cidade de Deus
4. Central do Brasil
5. Tropa de Elite
6. O Quatrilho
7. Dois Filhos de Francisco
8. Carandiru
9. Pixote - A Lei do Mais Fraco
10. Pra Frente Brasil
11. Eles não usam Black-Tie

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