CONTEXTO

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Pesquisas Eleitorais

DEMOCRACIA TUTELADA - Por Homero Fonseca


Hoje, os golpes militares não se fazem com tanques nas ruas. Pode-se, por exemplo, intimidar o STF.
Pessoas esclarecidas que negam ter havido um golpe em 2016 (destituição de Dilma Roussef) costumam alegar que “as instituições estão funcionando, logo a Democracia foi mantida”. Esse raciocínio equivocado não leva em conta as evidências de que a engenharia dos golpes mudou, hoje é muito mais sofisticada.
Já em 1965, o alto comando militar buscava uma saída negociada para João Goulart (inclusive com sua permanência no poder, expulsando os esquerdistas do governo), quando tudo foi precipitado pelo general Mourão (Olímpio Mourão Filho), conhecido como “Vaca Fardada” (ele se refere ao apelido em sua autobiografia “Memória – A verdade de um revolucionário”), que pôs os tanques na rua, tornando a opção armada um fato consumado. Por coincidência, os EUA mandaram parte de sua poderosa frota do Caribe para o litoral brasileiro (Operação Brother Sam, já de domínio público, pesquisem).
Hoje, a solução armada é adotada em última instância, em muitos casos. Agora, usam-se outras vias, menos ostensivas e mais difíceis de denunciar (até de compreender). No Brasil — de 2016 até a eleição de Bolsonaro — tivemos uma conjunção complexa de fatores que provocou a tempestade perfeita: uma força-tarefa do Judiciário, treinada nos EUA, agindo acima da lei; uma mídia alinhada em bloco, manipulando a opinião pública; um Congresso oportunista e em grande parte venal; interesse estratégico da geopolítica americana envolvendo o Pré-sal; um empresariado sempre disposto a sacrificar a Democracia para tirar direitos dos trabalhadores; erros do PT e da esquerda em geral, nos campos político e ético, oferecendo um flanco aberto para a investida da direita, e os quartéis de sobreaviso, atuando pela via da intimidação (lembrem da famosa fala de Romero Jucá, quando revelou que a trama do golpe contava com “o Supremo, com tudo” e, do trecho menos badalado, revelando que as articulações envolviam os comandantes militares, que temiam um levante do MST.
Claro que a vitória de Bolsonaro foi um efeito colateral imprevisto, mas tolerado pelos donos do poder enquanto ele obedecer à agenda ultraliberal com a qual se comprometeu por necessidade eleitoral. E assim mergulhamos numa Democracia tutelada.
A prova disso é a nova manifestação nas redes sociais do general Vilas Boas, mais uma vez ameaçando o STF, quando entra em julgamento a pauta da prisão em 2ª instância, que teoricamente poderia libertar Lula da Silva. Seja qual for o resultado do julgamento iminente, dificilmente isso ocorrerá. E, se essa hipótese remotíssima se concretizasse, existe à mão um arsenal jurídico a ser manejado para Lula continuar trancafiado.
Exército x Supremo
Essa visão talvez seja pessimista. Mas vale a pena apelar à História para entender como as coisas andam em nossa cambaleante Democracia.
Em 1892, após assumir a Presidência da República com a renúncia de Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto teve seu mandato contestado, pois, constitucionalmente, deveria convocar eleições e não permanecer no cargo. Ele reagiu, prendendo militares, políticos e jornalistas. Rui Barbosa impetrou habeas corpus no STF em favor dos perseguidos. Floriano fez a célebre afirmação: “Se os juízes do Tribunal concederem habeas corpus aos políticos, eu não sei quem amanhã lhes dará o habeas corpus de que, por sua vez, necessitarão”.
Em 1964, com as tropas golpistas do general Mourão nas ruas, o Congresso Nacional, aproveitando que Jango buscou refúgio no Rio Grande do Sul onde Brizola era governador, decretou vaga a Presidência da República. O STF legitimou o golpe.
No dia 3 de abril de 2018, véspera do julgamento no STF do habeas corpus em favor de Lula, o general Vilas Boas postou no seu twitter: “Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”. Repetiu a ameaça de Floriano, de forma mais sutil. Lula continuou preso, Bolsonaro venceu a eleição e, com sua incontinência verbal, agradeceu descaradamente ao general por sua “little help”.
E quando o Supremo julgava novo habeas corpus de Lula, Floriano Peixoto baixou por inteiro no general Augusto Heleno, que proclamou, aos gritos e murros na mesa em plena reunião ministerial, que Lula deveria ficar em prisão perpétua (que não é prevista em nossa Constituição).
*Homero Fonseca é jornalista recifense. Está escrevendo uma coluna semanal no Jornal no Jornal GGN e regularmente colabora também com este blog.

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