Por Junior Almeida
Hoje
em dia com a modernidade e a tal globalização os costumes em todas as áreas da
nossa sociedade são outros. Com as brincadeiras não é diferente. A molecada atual, mesmo nas cidades do interior, brinca diferente de alguns anos
atrás. Existe atualmente Playsation, Nitendo Wii, X-Box, computadores modernos que permitem jogar em rede, onde um
jogador interage com outro mesmo que esteja do outro lado do mundo, tem uns
joguinhos em celulares, tablets e
vídeo games portáteis que prendem a atenção dos mais jovens.
Dos jogos
eletrônicos, preferência da maioria da garotada, é raro algum que faça quem está
jogando se exercitar e suar. Alguns acessórios dos consoles mais modernos já fazem
o jogador dançar, pular ou mesmo jogar tênis sem raquete, tirando um pouco quem
se diverte do sedentarismo. Há algum
tempo atrás, coisa de vinte, trinta anos, as crianças das cidades grandes já
viviam presas em seus apartamentos sendo "educados" pela televisão e brinquedos,
mas por falta dessa tecnologia toda sempre existia as brincadeiras que faziam
as crianças de mexerem.
Vídeo games e computadores já existiam, mesmo que bem
diferentes dos de hoje. Os pioneiros foram o Tv jogo,
depois Atari, Odyssey, e Master System.
O computador pessoal com seu monitor de imagens esverdeadas já começava
aparecer nos lares das famílias mais abastadas. Um dos mais famosos da época
era o MSX, já com imagens coloridas,
que tinha duas entradas para cartuchos de programas ou jogos. No interior era
muito difícil uma criança ter acesso a esse tipo de divertimento. Quem possuía um
brinquedo eletrônico, por exemplo, que era uma enorme ostentação falar que seria um produto “da Estrela”, se referindo
a famosa marca, mesmo não sendo, era quem tinha dinheiro. Naquele tempo não
existia, como nos dias atuais, tantos produtos importados, os ditos do Paraguai.
O bom mesmo em ser criança no
interior eram as brincadeiras. Pega-pega, brincar de bola, de futebol ou queimado,
mãe da rua, garrafão, carrinhos de madeira puxados com cordão, barata,
lambreta de madeira, esconde-esconde, barra bandeira, pião, pipa, polícia e ladrão entre
outras. Algumas brincadeiras dos meninos eram bastante violentas, como a “mãe
da rua”, em que um único menino fica na rua e os demais na calçada. O objetivo desta brincadeira é
quem está na rua, no caso, no calçamento, puxar os vários meninos que ficam na calçada pro seu
lado e fazer ele pisar com os dois pés no chão. Acaba quando se consegue que o último garoto pise com os dois pés no calçamento.
Os que ficam na calçada podem
atravessar a rua para o outro lado, desde que pulando num pé só. O detalhe
violento dessa brincadeira é que o “milú” que pegava os meninos na calçada podia apanhar sem dó. O que supostamente amenizava a violência da brincadeira era não
poder bater na cabeça e face do mãe da rua, como se isso adiantasse e
abrandasse a sova que eles geralmente levavam. Outra brincadeira nesse estilo
era o “garrafão”, que tinha esse nome por ser desenhado no chão, geralmente com
giz ou carvão, um traçado de linhas formando corredores e uma entrada para os
mesmo que lembrava a forma de uma grande garrafa.
Como na mãe da rua, apenas um
garoto corria atrás dos demais para tocar neles e esse ser o pega, ou como se
diz por aqui: o “milú”. Tinha que correr pelos corredores do garrafão sem pisar
nas linhas, pois se isso acontecesse um outro menino gritava dizendo: “acuso”, e
então os outros podiam descer o sarrafo. Para se livrar da surra, quem fosse
pego pisando na linha tinha que correr para “manja”, geralmente um poste perto
do garrafão. Não era difícil um ou outro moleque ir pra casa com o pé do ouvido
inchado. Também me lembro das corridas de barata com rodas de rolimã que
infernizavam os moradores da Praça João Borrego. Além do barulho ensurdecedor
das rodas de ferro nos espaços do mosaico, a zoada maior era da enorme plateia
de moleques gritando e torcendo para alguém se arrebentar.
Cada época do ano a
moda das brincadeiras ia e voltava. No inverno, que a terra estava úmida, era tempo
pra rodar pião e jogar “chimbre”, que em outros lugares chamam de bola de gude.
Enquanto na capital o jogo de bola de gude mais comum é o “triangulo”, aqui no
interior é o jogo de buraco. Na brincadeira de Recife se risca no chão um triangulo
pequeno de cerca de trinta centímetros em cada lado e a bolinhas ficam dentro.
De certa distância vai se jogando outra chimbre para tirar as que estão dentro
do espaço. Já no jogo do interior são três buracos parecidos com os da
mesa de sinuca, com uns dois metros de um para o outro que formam um triangulo
grande, cavados na terra. O objetivo do jogo é acertar a bolinha nos três em sequência,
sendo os buracos um, dois e três, e quando depois do terceiro se entra novamente
no primeiro, esse é o “mata”. Depois desse a bolinha que for atingida por quem está
“matando” está fora do jogo.
No verão era a época de soltar pipas. Quem fazia a
maioria das pipas dos meninos de Capoeiras na época era Jurandir de
Cesária, que depois ganhou o apelido de “Jupi”. O lugar preferido de a gente
empinar pipas era o Estádio Carlos Rios. Não era oficial, mas era como uma
espécie de regra, cada dia da semana ser dedicado a uma brincadeira. Na segunda
era o “se esconder”, terça mãe a rua, na quarta se brincava de garrafão, na
quinta e até na sexta aproveitando as bancas da feira tinha a brincadeira de
polícia e ladrão. Muitos chamavam de “pixinhá”, que é o barulho do zumbindo da
bala quando sai do revolver, igual o que se via nos filmes da tv.
Era em cada
tiroteio imaginário que os meninos travavam na praça principal de Capoeiras, que fazia graça.
Confusão mesmo da molecada era quando se discutia onde o suposto tiro tinha
atingido o adversário. Quando não se chegava a um acordo desmanchava-se a brincadeira e então
só depois, quando se esquecesse da arenga.
Hoje soa estranha essa cultura de
andar armado, pois a violência impera em todo lugar e existem leis que proíbem
isso, mas naqueles tempos era até normal se andar armado. Imagino que isso
dava a sensação de poder, de status. A molecada para imitar os adultos tinha
suas armas de plástico, as de metal com espoleta, e quem não podia comprar, fazia as suas armas de brinquedo e andava com elas na
cintura. Fazia-se as coronhas de madeira dos revolveres e espingardas, esculpindo
na madeira como verdadeiros artesãos e os canos eram de alumínio, hastes de
antenas de televisão. Dentro desse cano se colocava um estalo de bebê, essas
bombinhas que em alguns lugares chamam de palitinho, só para simular um tiro de
verdade.
Uma brincadeira que hoje depois de adulto tenho a consciência que era
perigosíssima, mas pra criança era apenas mais uma aventura: brincar de “milú”
correndo em cima da parede do campo de futebol. Passa na cabeça de alguém
normal fazer uma coisa dessas? Também, como já foi dito, se
brincava correndo por cimas das bancas de feira nas quintas e sextas. Vez por
outra um menino se arrebentava por pisar e quebrar uma tábua podre de alguma
banca. A brincadeira de carrinhos de madeira era boa demais.
Alguns meninos não
tinham dinheiro sequer de comprar um carrinho desses, então faziam os seus de
garrafas vazias de água sanitária. Era assim: pegava-se uma, duas ou até três
garrafas usadas e se enchia de areia colocando os eixos de arame. Com pedaços
quadrados recortados de outra garrafa enfiados com pregos se fazia o acessório
de fazer o barulho do carrinho. Nas calçadas quando passava uns três desses era
um barulho insuportável. Outro tipo de carrinho era o de lata de óleo de soja.
Simplesmente se abria uma lata, batia com um martelo até que ela ficasse reta
parecendo uma folha de papel ofício.
Nela se recortava dois bancos do brinquedo e pregava-se numa armação de
madeira quadrada, colocando-se as molas também de lata, só que dobrada para
ficar mais forte, e rodas.
Muitos pneus dos carrinhos eram feitos de pedaços de
sandália havaiana cortados com facas e lixados no chão para melhor acabamento.
Essas rodinhas deixavam os carros “virão”, como a gente falava. Isso quer dizer
que os carrinhos viravam muito por conta da aderência da borracha. Os brinquedos bons mesmo
eram os que tinham molas de serraria, que eram simplesmente pedaços de serras dentadas de
cortar madeira que a gente arranjava nas serrarias da cidade.
Quem fazia os melhores
carrinhos pra nós era Cícero Pitão e seus filhos, Zé de Cordeira e Silvinho. Os
“Corcels”, “D20s” e caminhões que eles faziam com compensado e fórmica eram os mais resistentes, portanto, os preferidos da garotada. Com o passar
do tempo a molecada ia enfeitando os carrinhos. Os principais acessórios eram as lameiras, recortadas de borrachas de câmara de ar, e rodinhas de plástico, essas tiradas de brinquedos usados. Elas ajudavam o
carrinho “rabear” mais, que era uma vantagem.
Em tempos de política a meninada
fazia carreata, comício e tudo mais como os adultos. A Rural de brinquedo, que era o carro de som, tinha em
cima dela seus alto-falantes de plástico, que eram os “gogós” das garrafas de
água sanitária e vinagre cuidadosamente recortados e arrumados como se fossem de verdade. Uma brincadeira sem graça, pelo menos para os adultos, mas bem divertida para os moleques, era tocar a campainha e correr. A meninada tinha decoradas as casas que
possuíam “cigarra”. Quando não tinha, os meninos batiam palmas ou batiam na porta, depois corriam e se
escondiam, ficando brechando os donos
das casas virem ver quem chamava. Quando a vítima do trote se zangava e dizia algum
desaforo, aí é que essa casa ficava perfeita, segundo os meninos, para fazer isso de novo.
Menino do interior
que se prezava parecia ter que desafiar os pais e ir roubar frutas nos sítios e
tomar banho de açude. Como era e é até hoje, bom comer manga verde com sal,
a meninada sempre ia nos sítios atrás da fruta. Muitos já levavam o sal de
casa. A zona rural era farta de mangueiras e cajueiros, e alguns proprietários não
deixavam entrar em suas terras por que muitos moleques só queriam “capar” os
cajus, que era só tirar a castanha para vender. A fruta sem a amêndoa logo
apodrecia e caia do pé.
Nos banhos de barragens, eram perdidas as tantas
recomendações dos mais velhos, pois não tinha barreiro ou barragem nas
redondezas que os moleques não fossem. Onde hoje é o Bairro Quati existia
muitos buracos de olaria cheios d'água. Constantemente vivia cheio de moleques
tomando banho. Nas margens da PE 193, na saída para São Bento do Una tinha a
barragem de “seu” Zezinho, que era tão suja que o que mais tinha lá era sangue
suga.
Quase dentro da rua, perto do açude da cidade existia a olaria com sua
água barrenta, mas mesmo assim lotada de gente. Lá era perfeito para brincar de
“milú”, pois a água turva escondia quem passava o “pitu” no outro. Entrando por trás do “finado” campo de
futebol existia a barragem de Silva Cadete, essa com águas mais limpas, por
isso o dono proibia tomar banho nela, mesmo assim os meninos iam escondido. De vez
em quando a molecada levava uma carreira. Deixaram de ir nesse açude
quando o dono colocou um monte de mandacaru dentro para que ninguém mais
entrasse. Ficou perigosa demais.
No caminho até chegar nessa barragem era cheio
de pés de pirim, fruta silvestre azedinha rara nos dias de hoje. O pior de tudo
era que não tinha como esconder os banhos proibidos de barreiro. A pele
cinzenta, os olhos avermelhados e os cabelos duros feito barbante denunciavam
todos. Não eram raras as surras ao chegar casa. Acho que a infância bem vivida
das crianças do interior foi mais ou menos assim, de brincadeiras, “bigus” nos
carros de boi e caminhões, peraltices e muitas aventuras. Hoje é só lembrar com
saudade do tempo bom que passou.
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