Marina Silva, que em poucos dias
de fundação da Rede de Sustentabilidade conseguiu dezenas de adesões ao novo
partido político, foi parar nas páginas de El País, um dos principais jornais
da Espanha e da Europa.
O artigo é assinado por Juan
Arias, que em alguns trechos se revela totalmente simpático a Marina e suas
teses ambientalistas:
A ambientalista Marina Silva,
que segundo ela mesma “ganhou perdendo” nas últimas eleições presidenciais
enquanto sua adversária, a presidenta Dilma Rousseff, “perdeu ganhando”,
poderia ressuscitar, amparada por seu partido, a Rede Sustentabilidade, que acaba
de ser legalizado. Continuará sendo o enigma da eterna esfinge?Marina poderá gostar ou
não, mas é difícil, em vista da crise que vive o país, não reconhecer que tinha
previsto alguns dos problemas que se agigantaram agora. Como a crise política,
produzida em parte pelas velhas práticas do chamado “fisiologismo”, que
antecipou na última campanha eleitoral. Tinha razão ao dizer que a sociedade
aceita cada vez menos a “velha política”, na qual vê a matriz dos escândalos de
corrupção.
A vocação de defesa da
natureza e do meio ambiente, que ela encarna, e que foi reconhecida
internacionalmente, também se tornou cada vez mais crucial para salvar o
planeta, o que levou o papa Francisco a dedicar ao tema sua primeira encíclica
Laudato Si e a insistir nisso em sua viagem aos Estados Unidos.
A aposta de Marina Silva
em uma forma diferente de governar, tenha ela ou não a força para impô-la,
continua tendo apelo nas ruas. A ambientalista mantém ainda, apesar de seu
silêncio e até a quarta-feira sem um partido legalizado, um capital de mais de
30 milhões de votos, segundo as últimas pesquisas, superando uma possível
candidatura de Lula.
Nas batalhas
presidenciais anteriores, a voz de Marina já indicava uma terceira via, com sua
defesa de um modo novo de governar, convencida que a política tradicional
formada por partidos sem ideologia nem programas, que se vendem em troca de
cargos e privilégios, está esgotada.
Desta vez, depois do
terremoto do escândalo de corrupção da Lava Jato, as ideias de Marina se
revelam duplamente alternativas à dos partidos tradicionais.
Marina foi duramente
criticada nas últimas eleições por sua então adversária política, a candidata
Dilma Rousseff, por afirmar que desejava governar com os “melhores”, os não
corruptos. E é a presidenta que se vê hoje em dificuldade para nomear seus
novos ministros por não saber se estarão ou não envolvidos em algum escândalo
de corrupção. Também Dilma agora procura desesperadamente os melhores. Vai com
a lanterna do Diógenes em busca de políticos limpos.
O que a ambientalista
Marina sempre defendeu é que pode haver outras formas de governar, o que
coincide com o que sente e parece desejar a sociedade que defende uma forma
diferente e menos corrupta de dirigir os destinos do país e com uma maior
participação ativa da sociedade.
Há quem tema que, se
Dilma fosse derrubada, poderia aparecer algum aventureiro como aconteceu com
Fernando Collor de Mello. Pode-se considerar uma possível candidatura de Marina
Silva, com o apoio de seu pequeno e incipiente partido, uma aventura para o
futuro do Brasil ou uma esperança de algo diferente?
Haverá ainda hoje, depois
da inquietação que está vivendo o segundo mandato Dilma, quem se atreva a
acusar Marina de querer arrancar a comida do prato dos pobres?
Durante a última
campanha, ela cunhou uma frase que agora soa profética: “Pode-se perder
ganhando e ganhar perdendo”. Hoje, em vista da crise que vive o Brasil, depois
das eleições que deram a vitória ao gigante Golias contra o pequeno Davi,
contradizendo o relato bíblico, seria possível dizer que não lhe faltava razão.
Ela perdeu ganhando,
porque foi reconhecida a injustiça a que foi submetida pelo tanque eleitoral, e
Dilma, que ganhou nas urnas, hoje sofre na carne os resultados de uma vitória
que se converteu em derrota.
A ambientalista poderia
ser mais que uma voz no deserto, como muitos a acusam. Hoje é necessário
colocar o trem descarrilado da economia e da decência política no binário de
uma nova era de esperança que volte a unir os sofridos eleitores brasileiros.
O país não precisa de
mais rasteiras políticas, nem mais enfrentamento e violência. Precisa recuperar
sua vocação de país que ainda acredita que se pode ser feliz sem necessidade de
roubar para ser milionário.
Marina Silva, de novo
ressuscitada, aparece como uma mistura de utopia e realismo, de profetismo e
pragmatismo, capaz de abrir um debate sobre o que os brasileiros desejam e
esperam dos políticos, no momento em que sua estima pela velha política nunca
foi tão colocada em discussão e contestada com tanta violência.
A ambientalista, talvez
tão temida quanto amada, volta a ser, pois, uma incógnita.
Quando o ex-presidente
Lula escolheu seu sucessor, pensou em Dilma e Marina, duas ex-ministras. Ambas
mulheres de caráter. Lula conhecia melhor Marina, com quem tinha convivido 25
anos no mesmo partido e com uma biografia parecida com a sua. Ele a apreciava
ao mesmo tempo que a temia.
Talvez hoje, quando o
ex-presidente confessa que o PT deveria ser refundado para voltar a suas
origens, arrependa-se de não tê-la escolhido naquela altura. Marina Silva é
hoje um espinho para ele e seu partido, e Dilma Rousseff, sua grande dor de
cabeça.
O futuro está por
escrever.
*Titulo usado no Blog O Cafezinho