Com apenas 19 anos de idade Raquel de
Queiroz publicou O Quinze, um romance surpreendente. Tanto que Graciliano
Ramos, já consagrado, duvidou de que a autora do livro fosse uma moça de pouca
idade. Imaginou que por trás do nome da autora estivesse um homem usando um pseudônimo. É que o livro
trata de um tema árido (a grande seca de 1915) e parece realmente obra de uma
pessoa mais madura.
O Quinze não é um romance tão denso e bem
elaborado quanto Vidas Secas, mas foi escrito antes, por uma mulher, recém saída
da adolescência. Poucas mulheres escreviam romances no Brasil, na época, ainda
mais retratando um problema social tão sério quanto o gerado pelas estiagens do
Nordeste.
Mas Raquel de Queiroz não ficaria só
no bom romance de estreia. Em mais de 90 anos construiu uma obra literária
respeitável e se tornou a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de
Letras, o que aconteceu em 1977. Reduto conservador, verdadeiro “Clube de
Bolinha” de intelectuais, a Academia se rendeu no final dos anos 70 ao talento
da escritora cearense.
Raquel foi professora, jornalista,
cronista, teatróloga e romancista. Nasceu em Fortaleza, filha de proprietários
rurais. Tendo saído do Nordeste para o Rio de Janeiro, em 1915, fugindo dos
horrores que ela retratou no seu livro de estreia. Morou dois anos em Belém e
depois regressou ao Ceará, onde prosseguiu seus estudos e ingressou no
jornalismo com apenas 17 anos.
Mais tarde a escritora fixou
residência no Rio e passou a colaborar com grandes publicações do seu tempo,
como a Revista O Cruzeiro, além dos jornais Diário de Notícias e O Jornal, escrevendo
artigos de crítica teatral. Também escreveu, já na década de 80, no Estado
de São Paulo e no Diário de Pernambuco.
Publicou os romance João Miguel
(1932), Caminho de Pedras (1937), as Três Marias (1939) e Memorial de Maria
Moura (1992), obras premiadas e adaptadas para o cinema ou televisão.
Escreveu ainda textos infantis e
crônicas, muitas delas reunidas no livro “Cem Crônicas Escolhidas”.
Raquel foi laureada
com os seguintes prêmios e honrarias: Prêmio Machado de Assis, da Academia
Brasileira de Letras, pelo conjunto de obra (1957), Prêmio Nacional de
Literatura de Brasília para conjunto de obra (1980); título de Doutor Honoris
Causa pela Universidade Federal do Ceará (1981), Medalha Marechal Mascarenhas
de Morais, em solenidade realizada no Clube Militar (1983), Medalha Rio Branco,
do Itamarati (1985), Medalha do Mérito Militar no grau de Grande Comendador
(1986) e Medalha da Inconfidência do Governo de Minas Gerais (1989).
Seu último grande
sucesso literário foi Memorial de Maria Moura (1992) que se tornou minissérie
de televisão. Sofrendo de diabetes, morreu enquanto dormia em sua casa no
bairro do Leblon, na zona sul do Rio de Janeiro, 13 dias antes de completar 93
anos (17/11), vítima de um infarto do miocárdio. A escritora cearense já havia
sofrido um derrame (1999), tinha dificuldades de locomoção e era acompanhada
por uma enfermeira, e o corpo dela foi velado no prédio da Academia Brasileira
de Letras, no Rio, e enterrado no mausoléu de sua família no Cemitério São João
Batista, em Botafogo, ao lado de seu segundo marido, Oyama de Macedo, com quem
viveu 42 anos.
“Uma vontade
obscura e incerta de ascender, de voar! Um desejo de se introduzir a grandes
passos na imensa treva da noite, e a atravessar, e a romper, esquecido das
lutas e trabalhos, e penetrar num vasto campo luminoso onde tudo fosse beleza,
e harmonia, e sossego. Desejo de se integrar numa natureza diferente daquela
que o cercava, de crescer, de subir, de bracejar num emaranhado de ramos, de se
sentir envolto em grandes flores macias, de derramar seiva, a seiva viva e
forte que o incandescia e tonteava. Mas o cansaço o amolentava.”
“Onde ficava afinal
o mérito superior do Paulo, que o colocava tão alto no conceito da família, que
punha sob o bigode branco do major um sorriso desvanecido, quando dizia, numa
conversa:
– Meu filho, o
doutor...
Seria por suportar
com mais paciência a maçada das aulas, onde um velho pedante disserta, por se
enfrascar com inexplicável interesse em leituras difíceis, que só de recordá-las
sentia calafrios de preguiça e de tédio? E o seu esforço constante, sua
energia, sua saúde, sua alma que nunca suportou a servidão a uma disciplina ou
a um professor, que não admitia que o mandassem agir e que o mandassem
pensar... não valeriam muito mais que um interesse estéril de juristas por
abstrações, ou o quase culto do servilismo de aluno pelo mestre; depois de
formado, o mestre fora substituído pelo juiz, de quem suportava as anedotas e a
carranca, de quem comia os jantares, a quem namorava a filha, visando apenas
promoção, prestígio... Então ser superior é renunciar ao seu feitio e à sua
vontade e, recortando todo o excesso de personalidade, amoldar-se à forma comum
dos outros?”
viva Raquel de Queiroz,Carlos Drummond Vinicius de Moraes Carlos janduí e Ronaldo Cesar, os nossos mestres
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