Carlos Zara (camisa branca) e Reginaldo Farias (torturado) são destaques
Em 1970 o Brasil formou a melhor seleção de futebol do mundo. Carlos Alberto, Clodoaldo, Gerson, Rivelino, Jairzinho, Tostão e Pelé eram os principais craques do time que conquistou o tricampeonato mundial, disputado no México. O país vivia a euforia do “Milagre Econômico” e somado esse fato à conquista memorável nos esportes o ufanismo tomou conta da população.
O presidente era o general Garrastazu Médici, que gostava de futebol e usou a seleção brasileira para alavancar seu prestígio. Há uma versão, inclusive, de que João Saldanha foi demitido do comando técnico da canarinha porque deixou de fora o jogador Dario, o “peito de aço”, contrariando as vontades do militar.
Pra Frente Brasil, realizado em 1982, pelos irmãos Reginaldo e Roberto Farias, registra com muita competência esse momento particular da história do Brasil.
O longa, no entanto, denuncia de forma corajosa os que acontecia no país enquanto o futebol alienava e dopava as massas.
“O futebol era o ópio do povo brasileiro em 1970” . Enquanto a alegria explodia nos estádios e na frente do televisor, jovens e engajados na luta armada eram mortos e torturados. O pior é que as vítimas não eram só militantes políticos. Inocentes também penavam na mão de policiais e milícias a serviço da ditadura.
O filme de Roberto Farias começa com o “Hino da Seleção”. Na época se cantava “90 milhões em ação, parece que todo Brasil deu a mão...”. Logo após o início, com a música, aparecem dois personagens que serão o fio condutor da história. Jofre Godoi da Fonseca, homem de classe média, apolítico, pega uma carona com Sarmento, com quem tinha travado conhecimento numa viagem de avião.
Sarmento era um militante político de esquerda. O carro que leva os dois é perseguido e o opositor do regime é metralhado. Fonseca é levado pelos assassinos, é preso num lugar isolado da cidade e passa a ser torturado barbaramente, à frente um tal de Dr. Barreto.
Jofre Fonseca não aparece em casa e sua mulher, Marta, a princípio pensa ser alguma “estripulia” do marido. Telefona para o cunhado, Miguel, pedindo notícias e chega a desabafar: “Seu irmão não gosta mais de mim”.
Como no filme “Desaparecido”, de Costa Gravas, começa então uma jornada de Marta e Miguel em busca de Jofre Fonseca. A polícia não sabe de nada e, pior, também quer saber o paradeiro do homem.
O filme alterna momentos dos jogos da Copa de 70 com os conflitos políticos daquele tempo e a tortura nos porões do regime.
Marta, Miguel e seu irmão Fonseca eram alienados. Não tinham consciência das barbaridades cometidas pelos militares e seus aliados.
Vão descobrir o horror com o desaparecimento de Jofre, ao ponto de também entrarem na mira da polícia.
Para tornar ainda mais empolgante o enredo, Miguel é apaixonado por Mariana, uma jovem idealista que participa de grupos armados de oposição ao regime militar. Ela tenta se distanciar do namorado, com o objetivo de protegê-lo, porém as circunstâncias terminam por deixá-los ainda mais próximos.
Apesar das limitações do cinema brasileiro do começo dos anos 80, Roberto Farias, com a ajuda do seu irmão Reginaldo conseguiu fazer um filme enxuto, objetivo, com um bom roteiro, bem dirigido e contando com um ótimo elenco.
Vamos ao nome das “feras”: Antônio Fagundes interpreta Miguel, Reginaldo Farias é Fonseca, Natália do Valle vive a atormentada Marta, Elisabeth Savalla é Mariana, Cláudio Marzo representa o militante político Sarmento. Destaque para Carlos Zara, totalmente convincente como o torturador Barreto.
Fagundes é o mesmo ator bom de sempre. É engraçado vê-lo agora quando ainda era um rapazote. Elisabeth Savalla, que hoje interpreta dondocas nas novelas da Globo, era uma moça linda. Nunca foi grande atriz, mas neste filme está melhor do que hoje nas telinhas.
Pra Frente Brasil ganhou prêmios no Brasil e no exterior. Inicialmente foi censurado sendo liberado em 1983. A ditadura começava a abrandar e dois anos depois seria restabelecida a democracia no país.
Curioso que Roberto Farias, diretor dos filmes “alienados” da trilogia de Roberto Carlos - o mesmo cineasta que realizou o elogiado “Assalto ao Trem Pagador” - seja também o responsável por essa denúncia levada ao cinema contra a ditadura de Garrastazu Médici.
É um trabalho que merece ser conhecido e revisto. Pode não ser uma obra prima, um filme de arte, mas ninguém de bom senso pode negar seus méritos. Pra Frente Brasil é a demonstração clara que filmes políticos ou engajados podem ter boa qualidade. Uma história que não deve ser esquecida. A do filme e a da ditadura instalada por aqui em 1964.
Alguns filmes comentados nesta série do blog:
- Casablanca
- O Grande Ditador
- Janela Indiscreta
- Coração Valente
- Assim Caminha a Humanidade
- Os Brutos Também Amam
- Gandhi
- Mississipi em Chamas
- Um Sonho de Liberdade
- ET – O Extraterrestre
- Uma Linda Mulher
- O Exorcista
- Carrie a Estranha
- Ghost – Do Outro lado da vida
- Luzes da Cidade
- A Felicidade não se compra
- Suplício de Uma Saudade
- E O Vento Levou
- Cidade de Deus
- O Poderoso Chefão
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