Por Homero Fonseca
É impossível destituir o presidente sem criar condições políticas para isso. E entrar com pedidos oficiais, esbravejar na internet e repetir slogan não é suficiente.
Nem falo das estridências nas redes sociais pedindo impeachment já de Jair Bolsonaro.
Penso na oposição
institucional, atulhando a mesa da Câmara dos Deputados com pedidos de
destituição do perverso presidente da República, quando todas as análises
indicam não haver número legal para isso. Nem sequer uma tendência nessa
direção.
O que os partidos de oposição
querem? Que a proposta seja colocada em votação e derrotada, de certa forma
legitimando o extremista de direita no Planalto? Ou simplesmente esquecem que
um decisão drástica dessas é um ato político (vide Collor e Dilma)?
Sendo um ato político (em que
o aspecto jurídico é apenas um pretexto, como a ridícula acusação de pedaladas
fiscais), é preciso que sejam criadas as condições objetivas para a destituição
do mandatário. Enquanto o sujeito mantiver altas taxas de aprovação popular,
nada feito. O Congresso jamais irá contra a corrente.
Condições políticas objetivas
são, entre outros fatores: perda de legitimidade (popularidade é indicador);
sensibilização ou oportunismo dos parlamentares diante dessa fragilidade;
abandono do governante pelas elites ou parte expressiva delas; adesão da mídia
à ideia, com ataques maciços contra o alvo; concordância tácita ou explícita
das forças armadas; ação vigorosa e fincada nas bases de uma oposição
articulada; protestos de massa nas ruas. Talvez hajam outros fatores. Quem
souber ajude aqui.
Aparentemente, algumas dessas
condições objetivas estão preenchidas (críticas sistemáticas por uma parte da
mídia e manifestações de descontentamento de setores importantes das elites,
inclusive no Judiciário).
Mas a popularidade — e em
consequência a legitimidade — do ex-capitão continua firme, montada em pilares
como as redes sociais e o apoio de pastores evangélicos. O Exército se locupleta
de cargos e privilégios no governo e parece estar longe de embarcar numa onda
destitucionista, como fez na defenestração de Dilma e na prisão de Lula.
São fatores externos à
vontade e ao escopo da oposição de esquerda. Esta, em parte por estar amordaçada
na mídia e em parte por incompetência e falta de criatividade, não consegue
convencer a opinião pública majoritária à tese do impeachment, nem mobilizar as
massas. Fora da oposição institucional, os movimentos sociais não têm ânimo ou
meios de promover demonstrações massivas, em boa medida devido à pandemia.
Sinceramente não sei o
caminho das pedras. Mas sei que, sem serem criadas aquelas condições objetivas,
incluindo uma ação competente e efetiva da oposição, exigir a saída imediata de
Bolsonaro do poder é desconhecer os fundamentos da política e as lições da
História. Lamento informar, mas os sinceros e impacientes protestos nas redes
sociais não têm força para fazer valer a nossa vontade (pelo amor de Zeus, não
interpretem como uma crítica paralisante, continuem o barulho, mas entendendo o
contexto). Nem mesmo as dezenas de pedidos oficiais de impeachment por parte
dos partidos de esquerda que jogam para a plateia, mas não arregaçam as mangas
para dissuadir, conscientizar e organizar as massas populares nessa terrível
quadra histórica. Isso vale para o PT.
Resumindo essas modestas
reflexões: no que nos diz respeito, gritar e pichar “impeachment já” é condição
necessária, mas está longe de ser suficiente. Somente contribuiremos para
alcançar essa meta, juntando forças para criar as condições políticas para
isso, por meio da articulação política (envolvendo frente ampla pela
democracia) e conscientização, organização e mobilização das massas.
O resto é catarse.
*Homero Fonseca é jornalista e escritor. Foi editor da Revista Continente Cultural. É autor do romance "Roliúde", dentre outras obras.
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