Declarações feitas em junho e reiteradas recentemente pelo deputado Eduardo Bolsonaro (filho do
candidato a presidente), divulgadas nos últimos dias pela imprensa assombram juízes,
o próprio Supremo Tribunal Federal e até jornalistas conservadores, como a
global Miriam Leitão, conhecida pela posição crítica em relação ao PT.
O desprezo do deputado pelo Supremo, demonstrado mais de uma vez, já foi tema de reportagens do Jornal Nacional e do programa Fantástico, ambos da Rede Globo. Ministros do Supremo também reagiram à atitude do parlamentar.
Jair Bolsonaro, ao saber das afirmações que o STF poderia ser fechado com um "cabo e um soldado", sem saber que tinham sido feitas pelo filho, comentou: "Se alguém disse isso tem que levar para o psiquiatra.
Em dois artigos para reflexão dos brasileiros,
jornalista conhecidos nacionalmente falam do país e do risco do país ficar parecido com a Venezuela.
Leiam e tirem suas conclusões.
RISCO VENEZUELA NÃO TEM IDEOLOGIA
Por Míriam Leitão
A reação à declaração do deputado Eduardo Bolsonaro foi forte, pela
grande probabilidade de eleição do seu pai, mas também porque o candidato
sempre foi associado ao pouco apreço pelas instituições democráticas. O temor é
de que a ida do seu grupo ao poder signifique o início de um processo de cerco
à democracia, que na Venezuela do coronel Hugo Chávez começou pelo
enfraquecimento do Judiciário. O risco Venezuela sempre esteve associado ao PT,
e o partido fez por merecer, mas na verdade o perigo não é de direita nem de
esquerda. É do autoritarismo.
A ameaça sobre a democracia atualmente não é a de um assalto. É a de ver
seus pilares minados por atos de um governante populista e autoritário como foi
Chávez. O ataque se dá por aproximações sucessivas e não mais como vimos nos
anos 1960 no Brasil. Hugo Chávez tentou um golpe no estilo clássico, em
fevereiro de 1992. Alegava ser contra a corrupção. Conseguiu o apoio de uma
parte das Forças Armadas, mas fracassou. E esse Chávez é que recebeu elogios de
Jair Bolsonaro. O coronel foi preso, indultado, mas, em 1998, chegou ao
Miraflores pelo voto, dizendo que faria uma revolução socialista. E foi esse
Chávez que recebeu o apoio do PT.
Ao contrário do que acha o PT, não existe ditadura do bem. É o que o
chavismo mostrou. Fui à Venezuela em 2003. Havia uma greve geral no país,
comandada por empresários, contra o governo. Eu o entrevistei no Miraflores.
Era uma presidência militar. Ele vivia cercado de militares de alta patente em
seu gabinete e ministério. O ambiente no Palácio me lembrou o clima do Planalto
na ditadura brasileira. Chávez brandia a Constituição que acabara de aprovar. E
depois mudou várias vezes. Ele já havia alterado a composição do Conselho
Nacional Eleitoral. Depois fez o mesmo com a Suprema Corte. Perseguiu e fechou
órgãos de imprensa. Sua escalada sobre a ordem constitucional se deu por
mecanismos que pareciam democráticos: quando a economia melhorava, as benesses
com o dinheiro do petróleo aumentavam, ele convocava um plebiscito. Os que
perdia, não respeitava. Os que ganhava, aumentavam seus poderes e enfraqueciam
um pouco mais a democracia venezuelana, até que nada restou dela. Mas o
ex-presidente Lula chegou a dizer que havia “excesso” de democracia na
Venezuela. O PT apoiou o regime venezuelano de diversas formas, fingindo não
ver seu caráter cada vez mais autoritário. Jair Bolsonaro, que se identificara
com aquele coronel impulsivo, passou a criticá-lo quando ele se definiu como
socialista, mas nunca reprovou seus métodos antidemocráticos.
A inaceitável fala do deputado Eduardo Bolsonaro não surge do nada. Ela
reflete o ambiente político no qual seu pai sempre esteve imerso, de defesa do
regime militar. Era ele atrás do pai, repetindo em mímica, o nome do torturador
homenageado durante o voto do impeachment. Essa é a sua formação. Quando ele
diz “a gente até brinca lá...” Lá onde? Antes de dizer que “sem desmerecer” o
cabo e o soldado, bastava mandar os dois para fechar o Supremo. No meio do
caminho do cabo e do soldado tem a Constituição que completa 30 anos, que nos
custou uma luta de décadas, mas o deputado Eduardo Bolsonaro sequer entende que
é essa a força moral que impede dois militares sem patente de fechar o órgão
máximo da magistratura. Por isso, o ministro Celso de Mello chamou-o de
golpista — aqui sim a palavra faz sentido — e o ministro Dias Toffoli afirmou
que atacar o Judiciário é atacar a democracia. Alias, petistas também falaram
em reduzir poderes do STF.
Quando estive na Venezuela, falei com os dois lados em conflito,
visitando inclusive famílias divididas. Os que se opunham ao chavismo alertavam
que havia o risco de o Brasil virar uma Venezuela. As instituições brasileiras
foram fortes o suficiente e impediram o primeiro movimento, quando o
ex-ministro José Dirceu quis instaurar um órgão de controle da mídia. O PT
permanece com esse item na agenda. Por outro lado, os métodos de Bolsonaro de
defender a relação direta com o eleitor são os mesmos do chavismo. O populismo,
de esquerda e de direita, sempre desmerece as instituições. Por isso é que o
pai Jair Bolsonaro acha que basta “advertir o garoto”. Na fala do deputado
Eduardo Bolsonaro há uma ameaça gravíssima. Foi um alento a reação forte do
STF.
A AMEAÇA AOS JUÍZES
Por Matheus Pichonelli
Tem alguma coisa muito errada na campanha quando, a
menos de uma semana da eleição, o principal assunto do país é saber com quantos
jipes e soldados se fecha uma Suprema Corte.
De duas uma: ou a fala de Eduardo Bolsonaro,
proferida durante uma palestra enquanto o pai, Jair, já era candidato a
presidente, é uma groselha típica de quem não sabe o que diz ou ela define
exatamente o que seu grupo político almeja quando chegar à Presidência.
No primeiro caso, o Brasil está prestes a colocar a
faixa em um comediante do tipo Ben Stiller na Sessão da Tarde. Na pior das
hipóteses, estamos prestes a empossar o pesadelo que move parte considerável
dos eleitores em 2018: um regime à venezuelana.
Vamos aos fatos. Fora de qualquer debate público
para expor qualquer ideia, Jair Bolsonaro tem se comunicado com seu eleitorado
fiel por meio de lives e transmissões sem qualquer mediação jornalística – não
jornalistas de emissoras e apresentadores de auditório amigos, mas sim
profissionais indispostos a transformar entrevista em palanque ou jogo de
vôlei, em que bolas são cortadas quando levantadas.
Pelo contrário: o que não falta nesta campanha é
desprezo pelos profissionais da imprensa. Uns são expulsos de eventos
partidários, outros ameaçados e perseguidos nas redes, tendo a credibilidade
contestada em espécies de linchamento virtual. Todos são suspeitos de vestir
vermelho ao primeiro sinal de contestação.
O sonho desse time é um país sem contestação. E o
destino de todo mundo que estiver no caminho, segundo as palavras do próprio
presidenciável, é a prisão ou a expulsão.
Sabe onde opositores são perseguidos e obrigados a
buscar refúgio para sobreviver? Isso mesmo, na Venezuela.
Bolsonaro tem angariado apoio com um discurso do
tipo “aos amigos, a minha simpatia; aos inimigos, a metralhadora”. E
qualquer um pode ser inimigo se não demonstra a disposição em dobrar a espinha.
A metralhadora já foi apontada contra o partido
adversário, contra ativistas, contra a imprensa “vendida”.
Agora os integrantes da mais alta corte do país
perceberam que a metralhadora também está apontada para eles.
Em um vídeo que circula nas redes, o filho do
candidato do PSL, que acaba de se reeleger deputado com expressiva votação,
afirmou que se quiser fechar o STF basta mandar para lá um soldado e um cabo.
Isso, claro, se a corte resolver investigar seu pai por supostas irregularidades.
Digamos arrecadação de caixa 2, por exemplo.
“Se você prender um ministro do STF, você acha que
vai ter uma manifestação popular a favor do ministro do STF?”, prosseguiu.
A fala foi seguida de uma série de desmentidos e
desautorizações. O vice de Bolsonaro, general Mourão, classificou a declaração
de “arroubo juvenil”. Para eles, claro, é só o filho do vizinho que vai pra
cadeia em caso de “arroubo juvenil”.
Se não tinha acontecido antes, a fala ligou o
alerta de quem imaginava escapar da categoria “ativista” em caso de guerra ao
inimigo do futuro governo.
“Atacar o Poder Judiciário é atacar a democracia”,
disse o presidente do STF, Dias Toffoli.
“Essa declaração, além de inconsequente e golpista,
mostra bem o tipo (irresponsável) de parlamentar cuja atuação no Congresso,
mantida essa inaceitável visão autoritária, só comprometerá a integridade da
ordem democrática e o respeito indeclinável que se deve ter pela supremacia da
Constituição”, afirmou o decano, Celso de Mello.
“Isso é crime tipificado na Lei de Segurança
Nacional. Artigo 23, Inciso terceiro. Incitar animosidade entre Forças Armadas
e instituições civis”, reforçou o ministro Alexandre de Moraes.
Por enquanto, entre ânimos exaltados e ameaças de
eliminação simbólica com armas imaginárias, fica o dito pelo não dito.
Mas, para quem passou a eleição evocando o fantasma
da Venezuela para justificar o próprio medo, não custa procurar no Google o que
fizeram os arquitetos do regime chavista ao assumirem o poder: prenderam ou
expulsaram opositores, aumentaram o número de juízes na Suprema Corte,
tutelaram o Judiciário e conseguiram mudar a Constituição como bem queriam.
Esse
filme já foi visto antes, e ele não é uma comédia romântica da Sessão da Tarde
MÍDIA MORTA NÃO TEM VEZ, NEM VOZ, ESSA GENTE VAI TER QUE PROCURAR OUTRA PROFISSÃO NOS PRÓXIMOS ANOS.
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