Por Roberto Rockmann/Repórter Brasil
Encontro sigiloso com o presidente da
República e com o ministro da Fazenda; pedido de reunião com o ministro das
Minas e Energia; cartas endereçadas a Michel Temer e posteriormente encontradas
na casa do ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures. Em uma sequência de
reuniões e encontros escusos, autoridades britânicas e altos executivos da
petrolífera anglo-holandesa Shell fizeram, entre março e abril do ano passado,
lobby com altos cargos do Executivo brasileiro para conseguirem vantagens na
exploração do pré-sal.
Essas investidas aconteceram em meio a
mudanças nas leis de exploração do petróleo brasileiro. Em outubro de 2016, o
Congresso aprovou projeto de autoria do senador José Serra (PSDB-SP) que
extingue, entre outros pontos, a necessidade da participação da Petrobras nos
leilões do pré-sal. Em abril do ano passado, poucos dias após a investida de
autoridades britânicas e de executivos da Shell, o governo brasileiro anunciou
novos campos do pré-sal a serem leiloados. Em agosto, Temer editou medida
provisória que isenta impostos de petrolíferas estrangeiras.
O lobby das
autoridades britânicas para que o governo brasileiro reduzisse tributos e
afrouxasse regras de licenciamento ambiental foi denunciado pelo jornal
inglês The Guardian em novembro, com informações obtidas
pelo Greenpeace.
A Repórter Brasil levantou, por meio da Lei de
Acesso à Informação, a agenda do Ministério das Minas e Energia, do Ministério
da Fazenda e do presidente Michel Temer. As informações obtidas corroboram a
denúncia e dão detalhes sobre esses encontros.
A cronologia do lobby
Em 9 de março do ano passado, a agenda
do Ministério de Minas e Energia revela uma visita do encarregado de Negócios
da Embaixada do Reino Unido no Brasil, Wasim Mir, que “reiterou o convite para
que o ministro Fernando Coelho Filho [Minas e Energia]” participasse do evento
“UK Energy in Brazil”, no dia 21 de março.
A atividade ocorreria no Rio de
Janeiro, com objetivo de fomentar negócios entre os dois países. A nota enviada
pelo ministério informa que o “ministro agradeceu” e que deveria “participar de
um evento junto com o Presidente da República na mesma data”. Coelho Filho não
pôde comparecer, mas enviou o então secretário-executivo do ministério de Minas
e Energia Paulo Pedrosa.
De acordo com o jornal The Guardian, o
ministro de Comércio britânico, Greg Hands, havia relatado a Pedrosa as
reclamações de companhias petrolíferas, como a Shell, a respeito de regras de licenciamento
ambiental e aumento de impostos – e que o secretário-executivo havia informado
que o ministério estava trabalhando para alterá-las.
Um dia depois do evento no Rio de
Janeiro, em 22 de março, o chefe do escritório da Shell em Brasília, Tiago de
Moraes Vicente, enviou uma carta ao presidente Michel Temer, cujo conteúdo
continua sigiloso. Curiosamente, a carta foi encontrada entre os documentos
mantidos pelo deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), alvo de mandado
de busca e apreensão pela Polícia Federal.
O parlamentar, então assessor de Temer,
foi acusado de receber propinas para defender interesses de empresários e de
receber dinheiro em nome do presidente. Na ocasião, os policiais também
encontraram um documento com textos enfatizando a necessidade de revisão dos
preços mínimos de petróleo e gás natural – mas não foi possível identificar a
autoria deles.
No dia 3 de abril, às 11 da manhã, na
Esplanada dos Ministérios, o presidente da Shell no Brasil, André Araújo,
reuniu-se com o então ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho.
Dois dias depois, às 16 horas, no Palácio do Planalto, Temer e o então ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, receberam o presidente mundial da Shell, Ben van Beurden, que visitava o país. Não há transcrição do conteúdo de nenhum desses encontros.
Dois dias depois, às 16 horas, no Palácio do Planalto, Temer e o então ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, receberam o presidente mundial da Shell, Ben van Beurden, que visitava o país. Não há transcrição do conteúdo de nenhum desses encontros.
A intensa movimentação naquelas semanas
não ocorria por acaso. As petroleiras estavam de olho na abertura de negócios
com o óleo do pré-sal. Em 11 de abril, o governo federal anunciou a oferta de
novas áreas em leilões até 2019. Retomava-se, ali, a licitação de poços na
região, que estava parada desde 2013.
Os leilões do pré-sal ocorreram em
outubro de 2017, quando se venderam seis das oito áreas ofertadas. O governo
federal arrecadou R$ 6,1 bilhões, pagos por consórcios liderados por três
empresas: Petrobras, Shell e Statoil. A Shell, que levou duas áreas como
operadora e uma como participante, reafirmou seu forte interesse no pré-sal
brasileiro, onde se tornou a segunda maior produtora.
Quatro meses depois, em 23 de janeiro
de 2018, o presidente da Shell encontrou Temer em audiência durante o Fórum
Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. Ben van Beurden saiu do encontro
“otimista” com o Brasil.
“Não comentamos [na Shell] a política
do país. Mas eu gostaria muito que houvesse continuidade econômica, e da
regulamentação na nossa indústria”, afirmou. Ele também elogiou as mudanças na
regulamentação do setor, afirmando que elas o tornam mais estável, conforme
relato do jornal Folha de S. Paulo.
Para justificar as mudanças que
atendiam as petroleiras privadas, o governo apontou a necessidade de estimular
a economia nacional num momento de fragilidade da Petrobras. Sob novas regras e
mantido o cronograma de leilões nos próximos anos, empresas como a Shell terão
uma presença maior no ranking de produção de petróleo no Brasil, enquanto a
Petrobras perderá relevância.
Em nota enviada pela assessoria do
Ministério de Minas e Energia àRepórter Brasil, o então secretário-executivo
Paulo Pedrosa defende que encontros com autoridades estrangeiras e executivos
fazem parte da rotina do cargo.
“São situações onde cada nação
apresenta informações sobre assuntos de suas áreas técnicas nas quais o Governo
Britânico tem projetos de colaboração e troca de experiências com o Governo
Brasileiro. Os temas foram sobre: a Competitividade e a Reforma do setor de
energia no Brasil; Descomissionamento de Instalações Offshore, Recuperação
Avançada de Petróleo e Armazenamento de Energia. Também conversaram sobre
Construção e Manutenção Naval e Offshore”.
À Repórter Brasil, a Shell também diz
que os encontros com autoridades brasileiras são comuns. “A Shell esclarece que
encontros bilaterais entre autoridades de governo são comuns nos círculos
diplomáticos, e frisa que não pautou ou agendou qualquer encontro entre o
ministro britânico e autoridades brasileiras. Sobre carta enviada ao
ex-assessor especial da Presidência da República, o documento solicitava uma
reunião entre representantes da companhia e o Presidente da República, e foi
encaminhada através dos canais apropriados de interlocução para pedido de
agenda. Ressaltamos que a Shell opera em dezenas de países em todo o mundo,
seguindo as leis e normas vigentes em todos eles no que toca a interações e
contatos com agentes públicos e representantes de governo”.
APOIO:
PCB (PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO) DE GARANHUNS - PE
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