O
site Diário do Centro do Mundo - DCM
- publicou uma matéria de um dos seus autores, Joaquim de Carvalho, bem interessante,
de como pode [deixar de] funcionar a Justiça brasileira em alguns casos, com
seu rigor ao extremo com uns e a complacência com outros. A matéria leva o
leitor a refletir sobre certas decisões tomadas nas várias esferas do
judiciário em todo país, e se perguntar se a tese de “bandido bom é bandido
morto” valeria para todos, se por acaso, utopicamente falando, essa medida
tivesse força de lei. Abaixo o texto e fotos do DCM:
Desde que foi divulgada a notícia do
Habeas Corpus concedido em favor do filho da presidente do TRE do Mato Grosso
do Sul, a desembargadora Tânia Freitas Borges, a caixa de comentários do DCM
ficou lotada de mensagens que comparam o caso de Breno (foto 1)a outros que envolvem
pessoas pobres, em geral negros.
Nenhuma comparação é tão simbólica
quanto a de Rafael Braga, conhecido como “o cara do Pinho Sol”.
Em 2013, Rafael (foto 2), que é negro e era
catador de recicláveis (latinha principalmente), foi preso sob acusação de
produzir coquetel molotov para uso nos protestos.
Rafael tinha nas mãos duas garrafas,
uma de desinfetante, outra de cloro, encontradas, segundo ele, na garimpagem
que fazia na rua.
Rafael foi condenado, mesmo sem
provas, por fabricar os artefatos explosivos. Quando foi colocado em regime
aberto, com tornozeleira, voltou a ser detido, na comunidade do Cruzeiro.
A polícia diz que ele portava 0,6
gramas de maconha e tinha um morteiro. Foi acusado de associação para o
tráfico.
Como na prisão em 2013, não havia
provas, mas o juiz Ricardo Coronha o condenou assim mesmo, com o argumento de
que não poderia duvidar da palavra dos policiais.
“Nos depoimentos policiais acima
mencionados, nada há que elida a veracidade das declarações feitas pelos agentes
públicos que lograram prender o acusado em flagrante delito. Não há nos autos
qualquer motivo para se olvidar da palavra dos policiais, eis que agentes
devidamente investidos pelo Estado, cuja credibilidade de seus depoimentos é
reconhecida pela doutrina e jurisprudência. Os testemunhos dos policiais acima
referidos foram apresentados de forma coerente, neles inexistindo qualquer
contradição de valor, já estando superada a alegação de que uma sentença
condenatória não pode se basear neste tipo de prova”, escreveu o magistrado.
Rafael está preso no Complexo de Bangu
e não deverá sair de lá tão cedo. Tem uma condenação de 5 anos por causa do
desinfetante e outra de 11 anos pela condenação por tráfico.
Já o filho da desembargadora do Mato
Grosso do Sul, Breno Solon Borges, tinha sido preso por porte ilegal de arma,
foi apanhado em flagrante com 130 quilos de maconha, uma pistola 9 milímetros e
farta munição para armas de uso restrito.
Estava sendo investigado por planejar
o resgate de um chefe do tráfico no Estado, recolhido numa penitenciária, e por
negociar droga com o PCC. É dono de várias empresas e ostentava, no facebook,
uma vida nababesca.
Breno ficou três meses na cadeia e
conseguiu o habeas corpus para se tratar numa clínica, pois teria síndrome de
boderline e seria dependente químico.
A libertação dele foi concedida por
dois desembargadores, depois que um juiz de primeira instância, dada a
gravidade da acusação, não concordou em transferir Breno para uma clínica.
O compromisso da defesa é que a
desembargadora Tânia será tutora do filho.
139
quilos x 0,6 gramas
Os dois casos escancaram a
seletividade da Justiça brasileira.. Um caso é no Rio, outro no Mato Grosso do
Sul, mas nas duas decisões há um fundamento subjetivo: a justiça de classe.
O que vale para uns, não vale para
outros.
Este mesmo princípio de dois pesos e
duas medidas se aplica a ação judiciária em casos de administração pública.
A jornalista Maria Cristina Fernandes
mostrou como o governo do Estado de São Paulo está sendo blindado pelo
Judiciário. Alckmin ganhou todas as vezes em que precisou recorrer à
presidência do Tribunal de Justiça, em ações de seu interesse.
O levantamento foi feito por uma
pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas, Luciana Zaffalon, que analisou 566
processos que passaram pela presidência do TJ entre 2012 e 2015.
O estudo, base da tese de doutorado da
pesquisadora, será divulgado em livro, com o título “Uma Espiral Elitista de
Afirmação Corporativa: Blindagens e Criminalizações a partir do Imbricamento
das Disputas do Sistema de Justiça Paulista com as Disputas da Política
Convencional”.
Fernando Haddad, quando foi prefeito
de São Paulo, chegou a comparar as ações do Ministério Público propostas contra
sua gestão com a da gestão anterior, de José Serra/Gilberto Kassab.
A desproporção era 5 para 1.
Um exemplo dessa seletividade: a
Justiça proibiu Haddad de usar o dinheiro arrecado com as multas para pagar
salários na CET. Já na gestão de João Doria, a mesma justiça liberou as multas
para pagar os agentes de trânsito.
O modelo de uma balança com dois pesos
e duas medidas vem da cúpula do Judiciário.
Como entender que o mensalão do PSDB,
de Minas Gerais, gênese do mensalão do PT, em Brasília, não teve decisão efetiva
ainda?
O caso é anterior, mas o Supremo não
quis julgá-lo e mandou para a primeira instância, quando o ex-presidente
nacional do partido, Eduardo Azeredo, renunciou ao mandato para perder o foro
privilegiado.
Esse mesmo princípio não valeu para o
caso de José Genoíno.
Lula foi proibido pelo Supremo
Tribunal Federal de assumir a Casa Civil, no governo Dilma, numa decisão
fundamentada pela interpretação de que era desvio de finalidade: ele estaria
sendo nomeado para garantir foro privilegiado.
No governo Temer, Moreira Franco foi
promovido a ministro, através de medida provisória, depois que foi alvo da
denúncia de corrupção e, com isso, garantiu o foro privilegiado.
O mesmo Supremo que proibiu Lula de
assumir o Ministério, numa época em que a presença de Lula, como articulador
político de Dilma daria outro rumo ao governo, liberou o foro privilegiado para
Moreira Franco.
Justiça pune os pobres e pune também
quem faz políticas para pobres e poupa os ricos e poupa também quem faz
política para ricos.
Há muitos outros exemplos.
No gabinete dos juízes brasileiros,
reina a máxima expressa pelo ministro Marco Aurélio Mello, na decisão que
devolveu o mandato para o senador Aécio Neves — flagrado pedindo 2 milhões de
reais a um empresário corrupto a quem oferecia vantagens.
O ministro disse que se tratava de um
homem com “carreira notável”, “chefe de família”.
A decisão que libertou Breno, filho de
desembargadora e liberado pela ação de dois desembargadores, segue o mesmo
padrão cultural:
Ele também pertence a um mundo de
pessoas com carreiras notáveis e de chefes da família.
Já para Rafael, o cara do Pinho Sol, a
realidade é a que foi expressa num muro da comunidade onde ele tirou foto, no
curso período em que cumpriu pena em regime aberto (com tornozeleira):
— O Estado te esmaga de cima para
baixo.
Por conta desta foto, exposta em rede
social, passou dez dias em solitária.
A Justiça é implacável. Com os pobres.
Mas que papo furado, todos sabemos que esse vagabundo POBRE não vai ficar 6 meses na cadeia.
ResponderExcluirAliás vagabundo nenhum pega a cadeia que merece, seja preto, verde, branco, rico ou pobre.
Aí essa petralhada, que construiu esse império da impunidade no Brasil, e defende todos os dias na câmara a política do Desencarceramento, ainda vem com essa conversinha de mulher de malandro?
Haja saco para tanta baboseira.