Conhecido pela postura fraterna, por sua defesa dos direitos
humanos e pela resistência à ditadura militar, o arcebispo emérito da
Arquidiocese de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, morreu nesta quarta, feira,
aos 95 anos. O cardeal — que dedicou 71 anos ao sacerdócio e 76 à vida
franciscana — estava internado desde 28 de novembro, com broncopneumonia, na
capital paulista.
Catarinense
de Forquilhinha, quinto da prole de 13 filhos de um casal de descendentes de
alemães, dom Paulo fez parte de um clã de benfeitores dedicados à infância e à
juventude brasileiras. Sua irmã mais ilustre, a pediatra Zilda Arns Neumann,
fundou a Pastoral da Criança, com a colaboração do religioso. Ao chorar a morte
de Zilda, uma das vítimas do terremoto do Haiti, em janeiro de 2010, dom Paulo,
do alto de sua resignação sacerdotal, afirmou:
— Ela
morreu de uma maneira muito bonita, morreu na causa em que sempre acreditou.
Dedicado
à defesa de pobres, perseguidos e injustiçados na maior parte das suas nove
décadas e meia de vida, o arcebispo comprou brigas com poderosos dentro e fora
da Igreja.
Por
causa de suas posições, estremeceu até mesmo o coração da cúpula católica. Seu
nome era tão temido em Roma que, ao som dele, "arrepiavam-se todos os
pelos dos braços" do alto clero, como declarou no final dos ano 1990 o
então secretário de Estado do Vaticano, Agostino Casaroli.
Na luta
contra os desatinos da ditadura militar no Brasil, dom Paulo levou generais à
loucura visitando prisões, denunciando casos de tortura e se empenhando pessoalmente
contra a censura. Em 5 de maio de 1971, revoltado com o que ocorria nos porões
do país, o cardeal foi a Brasília para fazer um pedido formal ao presidente da
República em nome dos bispos de São Paulo:
— Venho
pedir que o senhor assuma a situação lá, onde pessoas estão sendo mortas,
torturadas, ou então desaparecem.
Irritado,
diante da batina preta do religioso, o general Emílio Garrastazu Médici
levantou-se e sugeriu:
— O
senhor cumpra a sua missão e fique na sacristia.
Acostumado
a ver suas ordens cumpridas, o general presidente deu por encerrada a
audiência-relâmpago no Palácio do Planalto com a certeza de ter sido claro e
definitivo. Dom Paulo deixou o gabinete disposto a nunca aceitar aquele
conselho.
Frade
franciscano, o cardeal rebelde era desapegado de bens materiais. Quando decidiu
vender o suntuoso Palácio Pio XII, a residência episcopal em São Paulo, foi
criticado até mesmo por parte dos fiéis. Venceu as resistências e, com os US$ 5
milhões do negócio, construiu centros comunitários para pobres e nordestinos.
Sua postura em defesa dos direitos humanos muitas vezes lhe valeu acusações de
"protetor de bandidos". Seus incontáveis defensores, porém, lhe
apoiavam pelos mesmos motivos que outros lhe viravam o rosto.
Em 1992,
em função de um acidente de carro na República Dominicana, dom Paulo sofreu uma
fissura no crânio, teve de reduzir o ritmo de trabalho e se submeter a
tratamento especial para evitar a perda da memória. Formado em Filosofia e
Teologia, era doutor em Letras pela Universidade Sorbonne, na França. Sempre
esteve lúcido o bastante para escrever dezenas de livros, entre eles, a sua
autobiografia (Da Esperança à Utopia — Testemunho de uma Vida), lançada em
setembro de 2001, quando completou 80 anos, revelando bastidores de suas
atribuladas relações com o Vaticano e com os militares.
Uma de
suas últimas aparições públicas foi em outubro, durante homenagem por seus 95
anos, completados no mês anterior. Fragilizado pela idade, dom Paulo falava
pausadamente diante de um auditório repleto de militantes de movimentos
sociais, como Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e Pastoral do
Povo de Rua. O cardeal não tocou no atual momento da política brasileira em sua
fala:
— O
discurso já está preparado, é uma palavra só, porque o povo está cansado:
obrigado.
*Texto: Jornal Zero Hora de Porto Alegre
**Foto: Folha de São Paulo
Esse foi o responsável pela desmoralização da igreja católica.
ResponderExcluirO verdadeiro LOBO em pele de cordeiro.