Quando o primeiro tempo terminou no quente estádio Nelson Mandela Bay os holandeses devem ter agradecido aos céus por estar só 1 a 0, em belo gol de Robinho, aos 10, ao receber um passe de Felipe Melo que Gérson, o Canhotinha de Ouro da Copa de 1970, assinaria com gosto.
Antes do gol mesmo, em bela trama, Daniel Alves estava impedido, razão pela qual o gol brasileiro de Robinho foi bem anulado.
Kaká disputou a primeira metade do jogo intensamente e só apanhou menos que Luís Fabiano, que mais pareceu um boi de piranha que um centroavante, missão que cumpriu com valentia.
O pé esquerdo de Robben era marcado impiedosamente, ora por um, ora por outro, ora por mais um defensor brasileiro, de maneira exemplar.
Mais uma vez, enfim, o time brasileiro contra cachorro grande mostrava ser maior, coisa que virou hábito na gestão Dunga, certamente porque para tentar jogar permite-se que o Brasil jogue.
No último minuto, depois que Juan mandou por cima o que poderia ter sido o segundo gol, Maicon ia ampliando num lance que lembrou o famos quarto gol de Carlos Alberto Torres no fecho da Copa de 70, segunda referência aqui a um momento mágico do futebol, porque a seleção canarinho assim fez por merecer.
Aliás, neste lance, o goleiro desviou para escanteio e a fraca arbitragem japonesa não viu.
E Robben, ainda foi pego como falso malandro por Daniel Alves, em seu melhor momento porque não estava bem, ao querer enganar os brasileiros numa cobrança de escanteio.
E o Brasil ainda teve 53% de posse de bola.
E o segundo tempo veio.
Logo aos 8, injustiça pelo ar.
Sneijder cruzou na área, Júlio César saiu em falso e Felipe Melo desviou para dentro do gol.
A isso, em futebol, se dá um nome: Brasil x Holanda, jogo de cachorro de grande. Ficaria maior?
Prudente, porque virou guerra, Dunga tirou Michel Bastos, com amarelo, e botou Gilberto em campo, aos 16.
A superioridade brasileira virou equilíbrio.
Tudo poderia acontecer.
E aconteceu!
Na cabeça de Sneijder, aos 22, em cobrança de escanteio por Robben: 2 a 1.
Era hora de reação, pois pela primeira vez a Seleção estava em desvantagem na África do Sul.
A exemplos das Copas de 1986 e 1990, quando o Brasil foi eliminado, pela Argentina e pela França, em suas melhores apresentações, a Holanda despachava os pentacampeões mundiais.
Mas havia tempo se houvesse cabeça, coisa que Felipe Melo, sabidamente não tem.
E depois de pisar Robben, o brasileiro foi bem expulso aos 28.
Se lembrou Gérson em 70, lembrou a expulsão de Luís Pereira em 74 também.
Ficou praticamente impossível.
Robben enlouqueceu o time nacional.
A maioria holandesa fazia a festa no Nelson Mandela Bay e Dunga trocava Luís Fabiano por Nilmar, uma tentativa correta de trocar a força de um pela habilidade de outro num momento de inferioridade técnica e numérica.
A Holanda estava sempre mais perto do terceiro gol do que o Brasil do segundo.
Notas:
Júlio César falhou no primeiro gol: 5;
Maicon fez o que pôde: 6,5;
Lúcio e Juan, dois gols por cima: 5;
Michel Bastos saiu-se melhor do que a encomenda: 6,5;
Gilberto Silva trabalhador como sempre: 6;
Felipe Melo, do céu ao inferno: 4;
Daniel Alves, a maior decepção da Copa: 4
Kaká, muito bem no primeiro tempo, caiu no segundo: 6,5;
Robinho, exatamente como o Kaká, talvez um pouco acima: 7;
Luís Fabiano, um leão sem dentes: 6;
Nilmar, nada pôde fazer: 5
Dunga não merecia a derrota num jogo como o de hoje e, como na Olimpíada de Pequim, não conseguiu o que queria, embora tenha brilhado depois em tudo que disputou. Uma pena: 6 (A foto que ilustra o artigo do Juca Kfouri, publicado no Portal UOL, é do site globoesporte.globo.com).
A SELEÇÃO DE DUNGA É TRISTE COMO A DE JORGE ZAGALO
3 de julho de 1974: repórter de esportes do Estadão na época, eu estava no belo Westfalenstadion, em Dortmund, e vi de perto o jogo pelas semi-finais da Copa da Alemanha, no dia em que o alegre carrossel da Holanda de Cruyff e Neeskens botou na roda o Brasil retrancado e triste de Zagalo.
2 de julho de 2010: assisto ao primeiro tempo de Brasil e Holanda na lanchonete Route 858, em Porangaba, pequena cidade do interior paulista. Desta vez, começamos melhor do que eles, e logo me esqueci daquele dia da derrota de Dortmund, que me meio à lembrança quando estava indo para a cidade. Tivemos um gol anulado logo no começo, Robinho fez um belíssimo gol aos 10 minutos, e parecia que tudo seria diferente.
Só eu não conseguia me animar para participar da festa que começou no intervalo, com a juventude dourada da cidade dançando e cantando na rua em volta do “paredão de som” instalado no porta-malas de um carro, que tocava música de discoteca no último volume, bem no lugar onde os antigos fregueses amarravam os cavalos, no tempo em que o bar ainda se chamava “Primeiro Gole” e não tinha hamburguer.
Tive um estranho pressentimento, sei lá, e achei melhor voltar para o sítio e assistir ao segundo tempo sozinho com meus cachorros. O resto vocês já sabem. Depois de tomar o gol de empate, numa lambança da defesa, o Brasil se perdeu em campo, tomou logo o segundo, teve jogador expulso, entregou os pontos.
Nem de longe este time da Holanda fez lembrar a “Laranja Mecânica” que encantou o mundo em 1974, mas o Brasil de Dunga parecia o mesmo de Zagalo, sem talento e fôrça para reagir.
Assim que o jogo acabou, minha filha Mariana me ligou e ouvi um choro sentido no celular. Era minha neta Laura, de sete anos, que passou as últimas semanas colecionando figurinhas da Copa, na maior alegria, sempre vestida com a camisa da seleção, agora inconformada com o Brasil fora da disputa. “Eu nunca vi o Brasil ser campeão!”, queixava-se, e chorava.
Para piorar, a sua cachorrinha, a Pipoca, estava na maior alegria, pulando e latindo, querendo brincar com ela. Travou-se então este diálogo:
_ Mãe, por que a Pipoca não está chorando?
_ Porque ela é apenas uma cachorra…
_ Então, eu preferia ser uma cachorra também…
Calma, Laurinha, 2014 vem aí. Este nosso time de 2010, como o de 1974, não vale a tua tristeza. (jornalista Ricardo Kotscho).
Acabou a Era Dunga. Pelo menos é o que eu espero (jornalista Ricardo Noblat).
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