Vem de Portugal o
melhor texto que se escreveu sobre a concessão do Prêmio Camões de Literatura
ao escritor e compositor Chico Buarque de Holanda.
Pedro Tadeu, editor
do Diário de Notícias, em Portugal, escreveu um texto não apenas belo e
comovente, mas também fez uma leitura (interpretação) atenta, valiosa, da obra
de Chico, mostrando de forma inteligente os muitos significados dos versos,
palavras, poesias, do genial artista brasileiro.
GANHAMOS NÓS, assim o jornalista Pedro Tadeu
comemorou a notícia da conquista do autor de Budapeste, Gota D´água e Leite
Derramado. Vale a pena ler, reler e enviar para os amigos ou os que apreciam um
texto impecável, como o que segue:
Quando recebi no telemóvel o alerta "Chico
Buarque ganha o Prémio Camões" senti-me no direito de comemorar uma
vitória: "ganhei eu, caramba, ganhei eu!".
Fui ler a notícia. Os seis membros do júri
explicavam a razão desta atribuição do galardão literário pela
"contribuição para a formação cultural de diferentes gerações em todos os
países onde se fala a língua portuguesa".
E o que é que este português, de 55 anos, que
escreve estas linhas, aprendeu com Chico Buarque?
Aos cinco anos de idade o meu corpo saltitava
sempre que no rádio grande do meu pai soava "A Banda", a música que,
quando passava, diz o verso final do refrão, ia "cantando coisas de
amor". Chico Buarque impulsionou-me a dança.
Aos 10 anos de idade percebi como um indivíduo
sozinho nada pode contra o cerco violento da indiferença. Bastou-me ouvir a
história circular do operário de "Construção", que "morreu na
contramão atrapalhando o sábado". Chico Buarque ensinou-me a identificar a
injustiça social.
Aos 11 anos de idade percebi a inutilidade da
divindade quando o coro masculino MPB4 repetia, em Partido Alto, "Diz que
Deus dará/ Não vou duvidar, ô nega/E se Deus não dá?/Como é que vai ficar, ô
nega?". Chico Buarque deu-me razões para ser ateu.
Aos 12 anos de idade intui, com os versos de Fado
Tropical, como a brutalidade da colonização sangrou a pele dos povos e como as
cicatrizes prevalecentes demoram séculos a fechar: "E o rio Amazonas/Que
corre Trás-os-montes/E numa pororoca/Desagua no Tejo/Ai, esta terra ainda vai
cumprir seu ideal/Ainda vai tornar-se um Império Colonial". Chico Buarque
ofereceu-me uma identidade, um medo e uma esperança na Lusofonia.
Aos 13 anos de idade percebi, pela letra do
pseudónimo Julinho da Adelaide (um autor inventado, usado para ludibriar a
censura da ditadura brasileira, que até falsas entrevistas deu aos jornais...),
que confiar na polícia pode ser perigoso, como constata "Acorda
amor": "Tem gente já no vão de escada/Fazendo confusão, que
aflição/São os homens/E eu aqui parado de pijama/Eu não gosto de passar
vexame/Chame, chame, chame, chame o ladrão, chame o ladrão". Com Chico
Buarque descobri que, às vezes, está tudo certo se se ficar do lado errado.
Aos 14 anos de idade conspirei o sentido da canção
"O que será (à flor da pele): "Será, que será?/O que não tem decência
nem nunca terá/O que não tem censura nem nunca terá/O que não faz
sentido..." Chico Buarque revelou-me o secreto significado da palavra
"liberdade".
Aos 15 anos de idade compreendi, ao ouvir
"Mulheres de Atenas", que a minha mãe, a minha irmã e a minha
namorada viviam num mundo pior do que o meu: "Mirem-se no exemplo daquelas
mulheres de Atenas/Geram pro seus maridos os novos filhos de Atenas/Elas não
têm gosto ou vontade/Nem defeito nem qualidade/Têm medo apenas". Chico Buarque
justificou-me o feminismo.
Aos 16 anos de idade espantei-me com o atrevimento
de "O Meu Amor". "Eu sou sua menina, viu?/E ele é o meu
rapaz/Meu corpo é testemunha/Do bem que ele me faz". Chico Buarque fez-me
entender como o sexo pode, ou não, fazer um par com a palavra afeto.
Aos 17 anos comovi-me com "Geni", a
prostituta que salva a cidade mas que a cidade despreza: "Joga pedra na
Geni!/Joga bosta na Geni!/Ela é feita pra apanhar!/Ela é boa de cuspir!/Ela dá
pra qualquer um/Maldita Geni!". Chico Buarque confrontou-me com a
dignidade dos indignos.
Aos 18 anos de idade a história de "O
Malandro" exemplificou-me como é sempre o mexilhão que se lixa: um tipo
que foge de um tasco sem pagar a cachaça que bebeu provoca uma crise mundial.
Mas, no final das crises, há sempre um bode expiatório: "O garçom vê/Um
malandro/Sai gritando/Pega ladrão/E o malandro/Autuado/É julgado e condenado
culpado/Pela situação". Chico Buarque antecipou-me a globalização e fez de
mim um comunista.
Aqueles anos foram os tempos do meu caminho até à
chegada à idade adulta, uma época anterior aos romances que Chico Buarque
escreveu e que completam, com a verdadeira poesia de muitas das suas canções,
um currículo mais do que suficiente para a atribuição do mais importante prémio
literário em Língua Portuguesa.
Aqueles anos foram os tempos que moldaram o meu
carácter.
Aqueles foram os tempos que moldaram o carácter de
tantos outros e de tantas outras que, como eu, cresceram a ouvir estas canções,
mas que entenderam nelas tantas coisas que eu não entendi, que compreenderam
nelas tantas coisas que eu não percebi, que tiraram conclusões destes textos
muito diferentes das que eu tirei.
Mas, tenho a certeza, apesar de pensarem e sentirem
de maneiras tão diferentes da minha, ontem, milhões de vós, ao saberem da
notícia do Prémio Camões atribuído a Chico Buarque, tiveram o mesmo impulso que
eu e comemoram: "ganhei eu, caramba, ganhei eu!".
*Foto: Jornal Cruzeiro do Sul
Tenho uma porção de músicas "preferidas do Chico", mas seu esquerdismo de petralha caviar se enquadra no mesmo diagnóstico que o grande jornalista Reinaldo Azevedo aplicou a Oscar Niemeyer: gênio na arte, mas cretino na política. É uma lástima aplaudir um cantor porque lutou contra a ditadura, seja porque não tem vergonha de, do alto de seus 74 anos, entoar com sua inconfundível voz o coro de Lula Livre.
ResponderExcluirP.S.: - Chico Jabuti é um LULISTA TURRÃO que não se envergonha de defender ladrão e onde quer que seja ou esteja ainda vomita O TAL DO LULA LIVRE... Nojo puro!!!