Por Luís Fernando Praga
Olá,
amigo,
Você
não me conhece, apesar de um breve aperto de mão trocado na Faculdade de
Direito de Franca, numa palestra sua, em meados dos anos 80, na flor de minha
adolescência…
Sei
que está sozinho numa cela espartana de uma carceragem cinza, numa cidade fria.
Sei que são tempos sombrios, onde pessoas, ditas direitas, regozijam-se de sua
prisão. Isso só pode ser doloroso, mas quero que saiba que, como eu, há milhões
dispostos a dividir consigo o peso de sua dor, até que se finde essa
injustiça.
Amigo,
os tempos mudaram e agora é muito difícil poder chamar alguém de amigo. Eu, que
já me decepcionei e deixei de ser amigo de tanta gente próxima, atrevo-me a
chama-lo assim, porque sinto que posso, porque sinto que é meu amigo, é amigo
dos seres humanos, é amigo do mundo sustentável, amigo da transformação, amigo
da utopia, é amigo da coragem, da resistência e é amigo dos valores dos quais
também sou amigo.
Sou
grato e precisava muito de um amigo como você!
A
dureza desses tempos me fez ver que algumas raras pessoas sabem amar, isto é,
desejam o bem de todos, sem desejarem mal a ninguém. Outras estão aprendendo a
amar, enquanto outras se iludem que amam, mas erram por definição e permanecem
estacionadas no ódio.
Ninguém
gosta de se admitir dominado e motivado pelo ódio, porque, na sociedade que
alimentada a ilusão a perfeição, é preciso ser gente de bem, e gente de bem não
odeia.
Só
que perfeição não existe; e, quando alguém aprende a não admitir as naturais
imperfeições humanas, jamais admitirá as suas próprias e acabará caindo na
armadilha de escondê-las, de ressaltar as alheias, de condenar os outros, de
torcer pra que ninguém o condene, de não dar importância para o amor do qual
abriu mão e de fingir que não foi o ódio que ocupou o lugar daquele amor.
É
assim que, dentre todas as naturais imperfeições humanas, a hipocrisia assume a
ponta e toma um papel preponderante na formação do perfil de uma sociedade.
É
desse perfil social que você e todos nós, tanto os assumidamente imperfeitos
quanto os falsos perfeitos, nos tornamos vítimas, meu amigo.
Quem
ama precisa ter consciência de suas imperfeições e de que continuará e cometerá
erros até a morte; entretanto, já não pode estar disposto a se equivocar no
ódio, a desejar o mal, a ser injusto, a impor culpas e exigir castigos e
punições de forma alucinada, como se a vida fosse isso. Quem ama se equivoca de
várias outras formas condicionadas à ignorância humana, mas procura, a todo o
tempo, distância do ódio, da prepotência e da injustiça.
O equívoco humano da injustiça, mesmo que
amparado pela lei vigente, além de abrir brechas para que outras injustiças se
enquadrem na legalidade, sempre irá gerar estilhaços sociais e fará sempre mais
do que uma única vítima. Os prejuízos se vão acumulando, um após o outro, como
uma bola de neve, até que a situação se torne insustentável, como me parece
este nosso hoje, onde irmãos humanos vivem loucos por prender e matar uns aos
outros.
Onde
existe ódio não existe razão o suficiente para se discernir que o ser humano
sempre errou, historicamente, ao rotular, definir e julgar como inferior outro
ser humano.
Nossa
suposta prerrogativa de julgar é fruto da prepotência, sequela da doença da
certeza, e virá sempre emaranhada aos muitos tentáculos de nossa ignorância,
mas um dia, amigo, aprenderemos o caminho do amor, e só então entenderemos o
que é agir com justiça.
Eu
gosto de ser seu amigo porque entendo que você ama de verdade e não na
hipocrisia: na lista das prioridades do amor humano, o primeiro passo é aceitar
que todos merecem viver com igual dignidade (o que é muito diferente de luxo).
O segundo passo é lutar para que uma vida digna seja garantida a todos, e você
lutou!
A
garantia de que a dignidade se estenda a toda a população não depende de que se
aumentem os salários e regalias de juízes e políticos, mas depende de se acabar
com a fome, de se proteger do frio, de se eliminar a miséria, de se ampliarem
as liberdades, de se dissolverem os preconceitos, de se esclarecerem as
ignorâncias, de se abraçarem os carentes.
Estas
são as prioridades e devem ser cumpridas, mesmo que, para isso, um médico, um
juiz, um grande empresário, um lobista, um político, um grileiro ou um grande
latifundiário precisem comer arroz, feijão e filé de frango ao invés de caviar,
filé mignon e moet chandon.
Sei,
amigo, que este país que você ama e pelo qual tanto lutou e fez já aprontou
poucas e boas com você: já o tratou feito lixo, já o privou de comida e de
água, já foi omisso quanto à sua educação, já lhe infligiu sofrimentos
absurdos, extraiu seus direitos e o privou de entes queridos, mas, apesar
disso, você não desistiu deste país!
Eu
juro que o entendo e que, apesar de tudo, também amo este país.
Você
enfrentou uma rígida e cruel estrutura, criada há muito tempo, com a única
finalidade de manter nossa desigualdade social, mantendo assim este sinistro
status quo. Você não se acovardou diante do poder de oponentes tão poderosos,
não se entregou ao pessimismo ou ao desânimo, e, o mais importante, você não se
vendeu; e demonstrou que não é para todo mundo que o dinheiro é tudo!
Mas
a verdade é que você não é nenhum santo! Você também errou e deixou muito por
fazer!
Outra
verdade é que, como a hipocrisia foi um dos obstáculos para que eu mantivesse
certas amizades, vivo me policiando para que essa devoradora de caracteres não
devore o meu, então me questiono: quem é o santo (Geraldo Alckmin não vale!)?
Quem não errou? Quem não deixou algo por fazer? Quem dimensionou o tamanho do
seu erro e decidiu que você deveria ser afastado da sociedade, excluído do
processo eleitoral e privado de sua liberdade?
Esteja
certo, meu amigo, você não foi preso por seus erros ou por sua omissão, muito
longe disso: você foi preso por uma estrutura que mantém reinantes na sociedade
a ignorância e a desigualdade social, você foi preso por uma estrutura nefasta
criada há séculos, só porque, finalmente, alguém acertou na mosca no que tange
às prioridades nacionais, no que tange a entregar dignidade a um povo, no que
tange a transformar o País, e esse alguém foi você!
Você
mostrou para este sistema, que se alimenta de corrupção, que nada vale mais que
a vida de ninguém. Você mostrou que a vida humana é o bem maior e não há
sistema corrupto que sobreviva a esta consciência!
Este
sistema, que pensa que pode comprar quem e o que ele quiser, identificou em
você uma ameaça, porque não o pode comprar, e então faz de tudo para manchar
sua imagem e o anular; ele o calunia, limita e oprime covardemente.
Você, nascido miserável num país de 3º mundo,
conseguiu chegar à presidência da república, elevou o País a sexta economia
mundial, promoveu transformações drásticas, essenciais e quase que
inacreditáveis que pudessem ocorrer num lugar dominado por uma elite econômica
tão predatória como a nossa!
Num
país onde o “ter” é mais do que o “ser”, quem compra tudo fácil e julga que as
dificuldades alheias, a fome, o frio, a miséria e a exclusão social são
consequências da vagabundagem dos vagabundos não consegue engolir o seu
sucesso.
Quem
nunca precisou viajar milhares de quilômetros num caminhão pau de arara para
sobreviver e vê você chegar aonde chegou, sem ter se vendido, sem ter se
esquecido dos seus e de suas origens, intimamente necessita de diminuir seu
feito e a dimensão humana e histórica que você alcançou.
Aqueles
que olham nosso sistema penitenciário abarrotado de pretos pobres e concluem
que os negros são mais bandidos que os brancos são os frutos da ignorância que
o sistema plantou e são incapazes de enxergar a que a elite branca que fazia as
leis, que nomeava juízes brancos para punirem negros e pobres e que enriquecia
explorando a vida dos escravos é a mesma elite escravagista que ainda manda e
desmanda nesse país: a perpetuadora da violência e da desigualdade social.
Essa
elite dominante, que sempre teve nas mãos o poder de manipular e que posa de
gente de bem, trabalhadora e empreendedora nas páginas de nossa História, é
ridiculamente imitada e adulada por uma massa humana sem ideais, sem empatia
para com seu semelhante, sem consciência de classe e sem cidadania, criminosamente
instruída a competir e cuja única perspectiva na vida é conseguir consumir mais
do que o vizinho.
É
ao poder dessa elite sádica que você representa uma ameaça, Lula, e é dessa
elite sádica e aristocrática que o brasileiro mal informado tomou as dores. É
aos interesses dessa elite genocida que os pobres de direita (agora ainda mais
pobres de direitos) e as marionetes do sistema defendem. Por isso pensam que
devem odiá-lo como a elite o odeia.
Lula,
você, superando qualquer expectativa, é a flor que floriu e perfumou esperança
no solo mais árido do mais inclemente clima, é o fruto temporão que alimentou e
adoçou a boca dos famintos na pior das secas. Você é a ressurreição de uma
ideia antiga e linda que, de tempos em tempos, vem dar o ar da sua graça à humanidade.
Você
fez crescer em todos nós, até nos temporariamente cegos e corrompidos, a ideia
de que este sistema precisa parar de ser alimentado com vidas humanas, de que
ninguém deve ser dono ou posse de ninguém, de que viver pode ser muito mais do
que tem sido!
Você,
com todas as suas imperfeições, não é mais imperfeito que nenhum de seus
acusadores e algozes, porque você mostrou a esperança, o amor e a liberdade
para um povo escravizado, violentado e sem perspectivas, enquanto eles, seus
acusadores, covardemente o mantêm encarcerado, tolhido da liberdade e do
contato com aqueles lhe desejam o bem, enquanto pilham a nação livremente.
Mas
saiba, Lula, os que lhe desejam o bem somos muitos! Você, hoje, é uma ideia
plantada no coração de milhões e cuja semente em breve irá frutificar!
Nós,
meu amigo Lula, que lhe desejamos o bem e que não sentimos vergonha disso,
porque não há motivos para vergonha no querer bem, também nos sentimos presos,
de mãos atadas, sem ação diante desse golpe, mas a esperança não permite que
nos abatamos!
Estamos
acordados, na vigília da História, cientes do golpe e dos golpes por trás do
golpe, feridos, inconformados, rebeldes, transformadores e prontos pra lutar!
Quando chegar o momento, seremos milhões de Lula(s) a espalhar amor e
entendimento sobre este país, hoje dominado pelo ódio e pela ignorância! Por
favor, meu amigo, por mais que tudo pareça desanimador, não se sinta
abandonado! Amanhã há de ser outro dia!
Por
ora, meu querido amigo, diante deste cenário aterrador e carente de afetos, eu
só quero que meu texto se transforme num abraço sem hora pra acabar, um abraço
do mais profundo querer bem, um abraço de desabafo, cumplicidade e troca da
melhor energia, um abraço de poder chorar no ombro, compreensivo, afetuoso e
bem apertado naquele senhor de 73 anos que, quando menino, fugiu da seca para
mudar o mundo, que fez a seca fugir do Nordeste e que está preso há quase um
ano num cubículo triste em Curitiba.
Que
este abraço se estenda a todos os meus amigos, os meus milhões de amigos “Lula”
espalhados pelo mundo e que sequer conheço, mas que são meus amigos, porque não
são amigos do ódio, da covardia e da injustiça!
Feliz
Natal e um 2019 repleto de Justiça, de Liberdade e de Amor, Lula(s)!
*Fonte:
Carta Campinas
Após ler tão extenso texto, lembrei-me de Eduardo Galeano: "Então, para que serve a utopia? A utopia serve pra caminhar. A utopia está no horizonte; caminho dois passo, a utopia se distancia dois passos... Caminho mais dois passos e o horizonte corre dez passos mais adiante... É para isso que serve a utopia... Para caminhar.” - É ISSO... Poucos percebem a injustiça nas costas dos outros!
ResponderExcluirA maior frase escrita por Lula até hoje: "não troco minha dignidade pela minha liberdade".Provado estar que ele tem plena consciência de que foi condenado sem provas de ser o dono do Triplex do Guarujá e do sitio de Atibaia e que as 2 prisões foram ilegais violando a constituição federal.
ResponderExcluirEstá em um quarto com cama confortável, TV, microondas, engordando, está melhor do que eu, e com muito chupa-sacos, chegando lá para fazer uma boquinha diariamente.
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