Por
Eugênio Aragão
O governo
do capitão da reserva Jair Bolsonaro parece ser, aos olhos de nós, pobres
mortais, de uma improvisação catastrófica. Digo que “parece ser”, porque é
compreensível, dentro de minhas limitações, que um sujeito que conseguiu chegar
lá por meio de sofisticadíssimo estratagema de impulsionamento global de
mensagens mentirosas, com capacidade de iludir massas, esteja construindo um
governo tão barbaramente desqualificado, sem que haja propósito nisso!
Posso
estar vendo chifre em cabeça de cavalo. Sempre é bom ficar com um pé atrás,
diante da arte do ilusionismo que tomou conta da política brasileira. Nem tudo
é o que parece ser. Começo a duvidar até de meus olhos. Apenas as lembranças
históricas não costumam falhar…
Hitler e
sua malta de odientos fascistas alucinados, ao assaltarem a Polônia em 1939, se
propuseram a eliminar uma nação do mapa, começando por dizimar sua inteligência
– professores, intelectuais, artistas, escritores, pesquisadores e técnicos
qualificados. O que sobrasse dos polacos – “subumanos eslavos”, segundo a
novilíngua nazista – deveria se tornar, para o resto dos tempos, um povo
submisso de lacaios a serviço da “Herrenrasse” ariana.
O
“empreendimento Tannenberg”, como se chamava a operação, foi meticulosamente
preparada pelo Amt II da SD (serviço de inteligência da SS), com produção de
listas de nomes das pessoas a serem detidas e assassinadas. Restaria, ao final,
pelo desejo dos invasores, apenas uma sociedade de terra arrasada, incapaz de
se opor a sua germanização.
Os tempos
são outros, mas os canalhas se adaptam. Invadir o Brasil para dizimar sua
inteligência seria algo anacrônico. Hoje se usa o “softpower” para destruir e
submeter. Chamam-no de “guerra híbrida”. Desviam-se as potencialidades e se
aproveitam as debilidades estruturais e funcionais de uma sociedade doméstica,
faz-se uso de doutrinação subliminar. As redes sociais com sua veiculação
impulsiva de bronca se prestam muito bem a isso.
Não é
difícil verificar que o beócio do capitão da reserva que ganhou a corrida
presidencial não está sozinho no seu projeto, que só é “seu” na sua fantasia e
na fantasia de seus filhos oligofrênicos, bem como daquelas pobres criaturas
ainda inebriadas com a miragem do “mito”. Quem, no entanto, comanda a operação
arrasa-Brasil não mora aqui. Está tão distante quanto os servidores que
disseminaram “en masse” mensagens mentirosas na campanha presidencial.
Ocupar os
cargos do governo com gente incapaz, vaidosa e despreparada parece ser parte da
estratégia de dominação. Trata-se de forma “soft” de matar a “intelligentsia”
no aparato estatal. Tacham-se os melhores quadros de “marxistas” e sobram os
ingênuos, “useful idiots”, para levar a máquina pública a seu descalabro.
Depois, vêm os salvadores do FMI, do Banco Mundial e do Federal Reserve, para
cuidar da massa falida, para transformar o Brasil no “Generalgouvernement”
americano.
De bobo
não tem nada, quem está por detrás desse plano. Bobos somos nós que só olhamos
para as aparências, achando que o capitão da reserva manda alguma coisa. Bobos
são os que acham que foi a “corrupissaum dos petralhas” a causa dessa
indignidade porque nossa nação vai fatalmente passar. Mas o buraco é mais
embaixo, como diz a sabedoria popular.
Tome-se
como exemplo a escolha do futuro chanceler do Brasil. Um idiota de carteirinha.
Um zero à esquerda que conseguiu ser promovido este ano a ministro de primeira
classe por um governo à deriva, certamente à base de muito beija-mão, como sói
ser na casa de Rio Branco. Beijou mãos podres e golpistas. Produziu um blog de
terceira categoria para puxar o saco do capitão e de seus filhos-diádocos,
ousando o que nenhum diplomata de raiz ousaria. Depois, fez publicar um texto
cheio de asneiras sobre a salvação da “civilização ocidental” por Donald Trump
– um texto que faria corar até o mais inestudado aluno de relações
internacionais.
Mas a
escolha tem sua razão de ser. O aparente besteirol do diplomata lunático tem
sistema, como o tiveram mensagens sobre a URSAL ou sobre a suposta defesa da
pedofilia pelo candidato adversário do capitão da reserva, serve sobretudo para
confundir e transformar a comunicação numa sopinha de letras, longe de qualquer
consenso sobre significantes e significados. É com essa guerra semiótica que se
desestruturam diálogos essenciais numa sociedade.
O Brasil
está alvo de um forte ataque e só não vê quem não quer. Aprofundou-se a
fragmentação política de modo a impedir a adoção de qualquer agenda. As
eleições, ao invés de estancar a polarização paralisante de pós-2013, a
radicalizaram. Não há conversa possível com quem sugere que a embaixada da
Alemanha peca por ignorância quando explica que o nazismo foi uma prática da
direita política. O discurso da turba ficou tão absurdo que se reduz a um
latido. E a latidos se responde com latidos. Uau-uau!
A quem
interessa essa destruição do país? A importância estratégica do Brasil pode
oferecer muitas respostas, mas o certo é que só não interessa às brasileiras e
aos brasileiros. De uma pujante potência periférica vamos nos transformar num
parque de diversões das nações centrais. Vão rir muito de nós enquanto
surrupiam nossos ativos. E são, para variar, os mais pobres – os “subumanos
cucarachos”, na novilíngua trumpista – que pagarão a conta, com extinção das
políticas públicas, com o fim de direitos econômicos e sociais e com a
degradação dos serviços públicos mais básicos, pois, quem tem dinheiro, se
juntará à gargalhada da plateia gringa em Miami, com Bolsonaro, o Bozo, a se
apresentar como protagonista do quadro de humor desse triste circo brasileiro.
*Eugênio
Aragão é ex-ministro da Justiça
Nenhum comentário:
Postar um comentário