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CARTOLA - GRANDES NOMES DA MPB - 90º

Um dos maiores intérpretes da música popular brasileira, Ney Matogrosso, gravou em 2002 um CD com 20 músicas de Cartola. Não era a primeira vez que o ex-integrante do Secos e Molhados cantava a poesia do velho compositor do Morro da Mangueira. Nem foi o único. Antes dele, muitos artistas do primeiro time da MPB descobriram o talento de Agenor Oliveira.

Na década de 30 Cartola foi gravado por artistas do porte de Araci de Almeida, Francisco Alves (o rei da voz), Carmen Miranda, Mário Reis e Silvio Caldas.

Dos anos 70 para cá, quando foi redescoberto, teve suas canções interpretadas por cantores consagrados da música brasileira. Clara Nunes, Beth Carvalho, Paulinho da Viola, Nara Leão, Elza Soares, Emílio Santiago, Luiz Melodia, Paulo Ricardo (RPM), Cazuza, Caetano Veloso, Leny Andrade, Alcione, Zeca Pagodinho, Nélson Gonçalves e Fagner estão entre os artistas que gravaram o autor de “O Mundo é um Moinho”.

O site lastfm.com.br, que traz uma boa biografia do compositor carioca informa que ele é autor de mais de 500 canções e somente “O Sol Nascerá”, feita em parceria com Elton Medeiros, recebeu cerca de 600 regravações.

Como se vê Agenor de Oliveira (registrado como Angenor) foi um verdadeiro “monstro” da Música Popular Brasileira, um compositor genial, que pode ser colocado no mesmo patamar de Noel Rosa, Adoniran Barbosa, Chico Buarque e outros bons letristas da canção nacional.

Agenor nasceu no Catete, no Rio de Janeiro e perdeu a mãe com apenas 15 anos de idade. Por conta de dificuldades financeiras da família foi morar no morro, onde na época começava a se formar uma favela. A vida difícil não lhe permitiu estudar. Fez só o antigo primário e começou a trabalhar. Foi vigia de prédio, pedreiro, lavador de carros, pintor de paredes e contínuo de repartição pública.

Numa de suas atividades, como pedreiro ou servente, começou a usar um gorro ou chapéu para se proteger do cimento que caía na sua cabeça. Foi aí que os colegas de trabalho o batizaram com o nome que artístico famoso: Cartola. Ficou esquecido o Agenor, hoje citado apenas por dever profissional ou curiosidade.

Menino, aos 8 anos, já se interessava pelo Carnaval. Morando no Morro da Mangueira, com um grupo de amigos, fundou a Escola de Samba com o nome do bairro e compôs o primeiro samba da agremiação carnavalesca, a música “Chega de Demanda”.

Cartola nasceu no dia 11 de outubro de 1908 e morreu em novembro de 1980 na mesma cidade do Rio de Janeiro. Quando nos deixou, era um compositor respeitado, idolatrado pelas novas gerações, embora só tenha conseguido ele mesmo gravar um disco poucos meses antes de completar 66 anos de idade.

O reconhecimento veio na velhice, mas veio. Mesmo depois de sua morte continuou sendo gravado e vários foram os tributos feitos ao artista, através de discos, shows, livros e até filme.

As canções feitas por Cartola são poéticas, têm letras muito bem elaboradas, com grandes “achados”, capazes de surpreender pela riqueza da melodia ou dos versos. Criado no morro, com pouco estudo, Agenor compôs músicas dignas de artistas universitários ou mesmo com “diploma de doutor”.

Em 1978, no LP que o consagrou como cantor e intérprete, quando gravou Jura Secreta e Revelação, o cearense Fagner fez também uma versão definitiva de As Rosas não Falam, de Cartola. Com uma valorização muito forte de violinos, o cantor usa sua voz agreste, cheia de sentimento, para transformar o clássico numa das coisas mais bonitas de se ouvir no universo da MPB. A letra é incrível:

Bate outra vez
Com esperanças o meu coração
Pois já vai terminando o verão,
Enfim
Volto ao jardim
Com a certeza que devo chorar
Pois bem sei que não queres voltar
Para mim
Queixo-me às rosas,
Mas que bobagem
As rosas não falam
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti, ai
Devias vir
Para ver os meus olhos tristonhos
E, quem sabe, sonhavas meus sonhos
Por fim

Outra música de Cartola largamente conhecida é “Autonomia”, que no CD de Ney Matogrosso de 2002, citado anteriormente, recebeu belíssima interpretação; um belo sax fazendo a introdução e o acompanhamento,  e a ótima voz do cantor valorizando cada verso:

É impossível nesta primavera, eu sei
Impossível, pois longe estarei
Mas pensando em nosso amor, amor sincero
Ai! se eu tivesse autonomia
Se eu pudesse gritaria
Não vou, não quero
Escravizaram assim um pobre coração
É necessário a nova abolição
Pra trazer de volta a minha liberdade
Se eu pudesse gritaria, amor
Se eu pudesse brigaria, amor
Não vou, não quero.

Esse compositor tão talentoso, que foi gravado por cantores conhecidos dos anos 30, deu uma sumida na década de 40. Possivelmente deprimido pela morte de sua primeira mulher, Deolinda. Cartola só voltou a gravar quando o jornalista Sérgio Porto (Stanislaw Ponte Preta), o encontrou por acaso, em 1956, lavando carros no bairro de Ipanema.

O profissional de imprensa incentivou Agenor Oliveira a voltar a trabalhar com música e surgiram novas composições do talentoso artista.

No final dos anos 50 o compositor estava mal cuidado, desdentado e bebendo. Foi aí que entrou em sua vida Eusébia Silva do Nascimento, a Dona Zica, que apaixonada por ele começou a cuidar do sambista e o ajudou a se reerguer.

Cartola e Zica viveram 12 anos juntos e depois se casaram. O casal criou um boteco no morro (onde o compositor voltou a morar), denominado de Zicartola. O bar fez sucesso e virou ponto de encontro de sambistas anônimos e famosos do Rio de Janeiro.

Foi ao lado de Dona Zica que cartola compôs “As Rosas não Falam”, “Nós Dois” (dois dias antes do casamento de Cartola e Dona Zica), “Tive Sim” e “O sol Nascerá” (parceria com Elton Medeiros e gravada na voz de Nara Leão).

Apesar do grande sucesso de seus sambas, cartola morreu pobre, morando numa casa doada pela prefeitura do Rio de Janeiro.

Agenor Oliveira não deixou patrimônio financeiro. Nem casas, nem terrenos ou carros. O seu legado à música e a cultura do país, porém, é milionário. Foi um dos mais férteis e ricos compositores do Brasil e suas canções são eternas. Estão sendo cantadas, regravadas e assim continuará a ser. Cartola é um gigante da MPB e seu repertório é uma fonte quase que inesgotável de criatividade. Lá ainda há de se beber muito, de modo a enriquecer, reencontrar e renovar a música nacional a partir das suas raízes mais autênticas.

(Faltam apenas 10 artistas para encerrarmos esta série sobre os Grandes Nomes da MPB).

O MUNDO É UM MOINHO - Cartola passou 40 anos sem falar com o pai, Sebastião Joaquim de Oliveira. O vídeo do yotube que escolhemos registra o reencontro dos dois, quando o artista canta a belíssima canção O Mundo é um Moinho. Para acessar basta clicar o nome da música, toda em maiúsculo.

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