No Recife funcionou durante alguns anos o Cine de Art AIP. Era uma sala pequena, com os bancos apertados entre si, gerando desconforto aos que a procuravam em busca de bons filmes. Além disso, ficava no 13º andar do prédio da Associação de Imprensa de Pernambuco, dificultando o acesso pois os elevadores eram velhos e em mais de uma ocasião deram problemas.
Foi neste cinema diferente dos outros que existiam no centro da capital pernambucana, à época, que assisti obras de arte como “A Árvore dos Tamancos”, excelente trabalho do italiano Ermanno Olmi, e “Zorba, o Grego”, premiado filme do grego Michael Dcacovannis. Este esteve à frente das câmeras em outras produções, mas este citado foi o que lhe deu fama e tornou-se popular e cult ao mesmo tempo. É um clássico de 1964, indicado para sete Oscar, tendo ficado com três das famosas estatuetas.
O diretor grego era competente (Michael morreu em julho deste ano, aos 89 anos) e escolheu bons atores para os principais papeis do seu filme mais famoso. Não resta dúvida, porém, que o brilho de “Zorba, o Grego”, está principalmente no desempenho fabuloso de um dos maiores atores da história de Hoolywood.
Anthony Quinn nasceu no México e depois se naturalizou americano. Estrelou dezenas de filmes. Aventuras, faroestes, épicos, dramas, guerra... passeava com versatilidade por qualquer gênero. Esteve em A Estrada da Vida, de Federico Fellini; Viva Zapata (Elia Kazan), Os Canhões de Navarone (Lee Thompson), As Sandálias do Pescador (Michael Anderson, Ulisses (Mario Camerini ) , Buffalo Bill (William Wellman) e Zorba, o Grego, o objeto da nossa resenha semanal.
Críticos respeitados de cinema do Brasil e de outro países consideram que Anthony Quinn teve o melhor desempenho de sua carreira em Zorba. O ator deve ter se identificado ou gostado muito do roteiro, pois ele está tão à vontade na pele do personagem que parece está vivendo a própria vida. O artista brinca na frente das câmeras, sorri para os telespectadores e brinda à vida como figura chave da produção grega.
Mesmo Quinn sendo a alma do filme, Zorba não se limita a excepcional atuação do ator americano. O longa todo é bom, um trabalho muito acima da média capaz de freqüentar qualquer lista de clássicos ou de melhores filmes de todos os tempos. A fotografia, os atores, o cenário na bucólica ilha de Creta, a música, a história aparentemente simples, mas que possibilita leituras e observações várias a respeito das pessoas, dos lugares pequenos ou isolados, da vida.
“Zorba, o Grego” foi baseado num romance homônimo do escritor Nikos Kazantzakis. Não é preciso ter lido o livro para saber que se fez uma excelente adaptação da literatura para o cinema.
O filme começa num dia de chuva quando Basil, um tímido escritor inglês, precisa tomar uma embarcação para a ilha de Creta. Lá, vai tomar posse de umas terras, incluindo uma mina, deixadas como herança pela família.
Enquanto espera que o tempo melhore para poder viajar, Zorba chega e se apresenta. É um sujeito grande, rude, franco, com uma espontaneidade e gosto pela vida extraordinários.
O Grego faz uma proposta para trabalhar para o desconfiado e reservado escritor. Este reluta, depois aceita, principalmente porque irá precisar do grandalhão na atividade da exploração da mina. Naturalmente o charme natural de Zorba também ajudou, ele conseguiu “seduzir” o inglês.
O filme todo segue com Zorba dominando a cena. O sorriso, a estatura, o sorriso, a filosofia de vida ocupam toda a tela e chegam a ofuscar os outros personagens.
Claramente, conforme se desenrola a história, se faz o contraste do homem da cidade, culto, preocupado com as questões existenciais e o homem comum, ligado à natureza, voltado para a vida como ela é, sem encucações de ordem intelectual.
O Grego, iletrado, dá lições em Basil, um escritor, um homem de muitos saberes. Em Creta os livros e ideias do personagem vão se mostrar inúteis, enquanto o conhecimento natural das coisas, por parte de Zorba, representarão a essência de uma vida plena, coroada de alegria, felicidade.
Além de Anthony Quinn há de se elogiar a participação de Alan Bates (o escritor), da atriz Lila Kedrova (Oscar de coadjuvante) e da bela e expressiva Irene Papas. Esta interpreta uma viúva, desejada e amaldiçoada pelo povo ignorante do pequeno vilarejo.
"Zorba, o Grego” tem muitas cenas antológicas, inesquecíveis. A simples fuga de uma cabra pertencente à viúva e escondida pelos moradores de ilha, termina por se transformar num fato relevante, quando vai se descobrir a tensão existente por conta daquela presença feminina no lugar.
Há alguns momentos tristes, inevitáveis, porque o filme não foge à realidade do mundo – mesmo nos lugares bucólicos, bonitos, distantes de do barulho das grandes cidades, a tragédia acontece, a morte vem, de forma violenta ou natural -, contudo prevalece o sentimento de alegria e disposição de enfrentar as adversidades por parte de Zorba.
O Grego sente também as perdas, ele é humano. Sabe, no entanto, por instinto ou porque a vida lhe ensinou, que não se pode mudar o rumo das coisas. Por isso Zorba continua de pé, acredita, dança, ensina a Basil e a nós todos que a tristeza não vale a pena. Mais importante é celebrar a vida.
No final das contas, Zorba, o Grego é isso: um romance, um filme, uma história que celebra a vida. Se pudéssemos ser mais o homem rude e simples e menos o intelectual complicado, seríamos mais felizes.
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