Todos sabem que o diretor é o grande responsável pela qualidade artística de um filme. Escolhe os atores, define o roteiro, seleciona as músicas da trilha sonora, locais de gravação, cenários, figurinos... “Com uma câmera na mão e uma idéia na cabeça”, como se dizia no Brasil do Cinema Novo, o bom cineasta às vezes pode ser ao mesmo tempo autor, pintor, intérprete, produtor... Enfim pode ser um artista que tem dentro de si outros artistas, podendo ainda estar numa ponta, como empresário e na outra, como um simples cinéfilo, cidadão comum, com sua paixão pelos filmes.
Ocorre, também, de um grande ator ou atriz fazer toda diferença. Quando esses caem nas graças do público atraem multidões ao cinema e é comum as pessoas decidirem assistir um filme porque é com o ator ou a atriz do momento, sem nem procurar saber quem está por trás das câmeras.
Existem intérpretes realmente fenomenais. No Brasil temos dois excelentes veteranos, a Fernanda Montenegro e o Antônio Fagundes. Dos mais novos, tem se destacado muito nos últimos anos o Wagner Moura.
Do astros do cinema, do passado, quem tem mais de 40 anos com certeza lembra de Marlon Brandon, Jane Fonda, Kiri Douglas, Yul Brynner e Dustin Hoffman. São verdadeiros ícones do cinema, que foram substituídos, das décadas de 80 e 90 para cá por nomes como Brad Piit, Leonardo Decaprio e Julia Roberts.
Destes mais antigos ainda está vivo, e em grande forma, o baixinho Dustin Hoffman. A partir deste parágrafo ele passa a ser o foco do texto, ao mesmo tempo em que escrevemos um pouco sobre o Filme Inesquecível da semana.
Vi há pouco um trabalho de Hoffman mais ou menos recente. “Tinha que ser você” é um drama de bom gosto, em que o ator faz par com uma atriz do seu nível, a Emma Thompson. Mas o que mais me chamou a atenção mesmo foi como o tempo passou: o artista está velho, chegou aos 74 anos, um ar um tanto cansado, embora continue esbanjando talento.
Este sujeito tem uma filmografia na carreira que é de causar inveja a muitas outras estrelas: Rain Main (já resenhado nesta série), Papillon, A Primeira Noite de um Homem, Perdidos na Noite, Pequeno Grande Homem, Totsie, O Quarto Poder, Perfume – A Historia de um Assassinato, Kramer versus Kramer e Kung Fu Panda I e II. Pelo menos algum deles acredito que o leitor (a) já deve ter visto.
Deixando algumas obras primas de fora – é impossível escrever sobre todos neste artigo – e propositadamente desprezando os mais recentes (Kung Fu Panda II é de 2011), voltemos 32 anos no tempo para avaliar “Kramer versus Kramer”, um dos grandes trabalhos de Dustin Hoffman.
Ao rever boa parte deste filme, dias atrás, senti um impacto. Descobri algumas coisas escondidas dentro disso que chamam subconsciente. Dei-me conta de que já tive 26 anos e que naquela época Dustin Hoffman para mim era um veterano. Hoje, tendo passado dos 50, vejo que em 1979 o ator ainda tinha cara de menino, aparentando talvez 34 anos e não os 41 daquele ano.
Percebi o quanto ele era bom ao ponto de ser o maior responsável pelo êxito de um filme, fazendo até a gente se despreocupar com o nome do diretor. Mas não podemos chegar ao ponto de sonegar essa informação: “Kramer versus Kramer” é de Robert Benton.
A maior surpresa, no entanto, foi saber que um dia Meryl Streep foi nova e muito mais bonita, parecendo uma bonequinha. Explico: Essa atriz, uma das melhores do cinema, eu não tinha recordações dela com rosto de adolescente ou quase. Assisti muitos filmes dela, nos últimos anos, mas sempre ela já madura e nos últimos tempos já envelhecendo. Lembro de Meryl segura de si, com uma beleza pouco comum, sem ar de dondoca, uma espécie de Fernanda Montenegro branca, de origem americana e de ascendência européia.
Este par, Dustin Hoffman e Meryl Streep, está brilhando em Kramer versus Kramer, o filme que arrebatou cinco Oscars em 79, inclusive os de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator e Melhor Atriz.
É um trabalho inteligente que antecipa em anos a discussão sobre casamento, divórcio, guarda dos filhos, relações de trabalho e muita coisa mais que hoje é super normal.
Ted Kramer é um publicitário de uma grande empresa que privilegia o trabalho, deixando a família em segundo plano. Joanna, sua esposa, um belo dia cansa dessa situação e resolve dar uma guinada de 360º em sua vida. Deixa a casa, o marido, o filho e vai em busca da felicidade.
Krammer sente um tombo, tem de mudar tudo em sua vida, rever conceitos e cuidar do pequeno Billy passar a ser o mais importante. A princípio o “pai solteiro” apanha, se enrola todo nas coisas, mas com o tempo vai pegando jeito.
O publicitário, no entanto, paga o preço de “negligenciar” o trabalho. Termina perdendo o emprego.
Para completar, Joanna, que abandonara esposo e filho, resolve lutar pela guarda do menino. Os dois, que um dia se amaram, vão se confrontar no tribunal e de antemão se sabe que as chances de Ted vencer são remotas, pois há 30 anos atrás os juízes dificilmente deixavam uma criança sob os cuidados do pai.
Billy está envolvido com o pai, apaixonado com suas histórias e seu carinho e não deseja ficar com a mãe. Os sentimentos da criança, no entanto, não são levados em conta.
Um drama que nas mãos de um diretor incompetente e sem a participação do atores talentosos poderia descambar para o chororó ou mesmo o ridículo. Em vez disso, temos um espetáculo de sensibilidade, um show de interpretação e a antecipação de um debate oportuno sobre a desmoronação da família tal qual a conhecíamos.
As separações, as brigas nos tribunais, o sofrimentos dos filhos viriam a ser tornar comuns nos anos subseqüentes e hoje até nas pequenas cidades do Nordeste aumenta a cada ano o número de divórcios.
Kramer versus Kramer é um filme bonito, comovente, que está pelo menos um passo à frente do seu tempo. Tem uma direção digna de aplausos e os três atores envolvidos na trama principal – Dustin Hoffman, Mery Streep e Justin Henry (o pequeno Billy) – não podem receber uma nota menor do que 10.
Mais de três décadas depois o filme continua atual, difícil de esquecer.
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