Já publicamos aqui mesmo um texto sobre a forte influência da literatura na música de Belchior.
Garcia Lorca, Fernando Pessoa, João Cabral de Melo Neto, Dante... são muitas as citações do cantor e compositor de Sobral.
O artista também, do início ao fim da carreira, sempre incluiu uma pitada de crítica social nas suas canções.
Crítica aos governantes, aos políticos, que chamou de estúpidos e idiotas em "No Maior Jazz", música que começa com um trocadilho em cima de "Guerra e Paz", monumental romance de Leon Tolstói.
Ora, Ora! Até vocês que ouvi dizer/São gente quase honesta, de "Arte Final", traduzida para os dias atuais, serviria para os "homens de bem" dos tempos bolsonaristas que infelizmente ainda estamos vivendo.
A canção citada no parágrafo anterior, por sinal, termina praticamente com um discurso revolucionário (e poético) de Belchior:
E então, my friends?
Bastou vender a minha alma ao diabo
E lá vem vocês seguindo o mau exemplo
Entrando numas de vender a própria mãe
Alguém se atreve a ir comigo
Além do shopping center? Hein? Hein?
Ah! Donde están los estudiantes?
Os rapazes latino-americanos?
Os aventureiros? Os anarquistas? Os artistas?
Os sem-destino? Os rebeldes experimentadores?
Os benditos? Malditos? Os renegados? Os sonhadores?
Esperávamos os alquimistas, e lá vem chegando os bárbaros
Os arrivistas, os consumistas, os mercadores
Minas, homens não há mais?
Entre o Céu e a Terra não há mais nada
Do que sex, drugs and Rock 'n' Roll?
Por que o Adeus às armas?
Não perguntes por quem os sinos dobram
Eles dobram por ti!
Ora, senhoras! Ora, senhores!
Uma boa noite lustrada de neon pra vocês
E o último a sair apague a luz azul do aeroporto
E ainda que mal me pergunte
A saída será mesmo o aeroporto?
Como o leitor com o mínimo de informação literária vai perceber, no trecho discursivo há duas citações ao genial escritor americano Ernest Hemingway.
"Balada de Madame Frigidaire" pode ser considerada uma canção mais simples.
Nela, a crítica à classe média e ao sistema é mais explícita.
Um trecho da letra da música:
Ora, desde muito adolescente me arrepio ante empregada debutante/Uma elétrica doméstica então, que sex-appeal! Dá-me o frio na barriga!
Essa deusa da fertilidade, ready made à la Duchamp, já passou de minha amante
Virou super-star, a mulher ideal, mais que mãe, mais que a outra
Puta amiga!
Pra que Deus, Dinheiro e Sexo, Ideal, Pátria e Família se alguém já tem Frigidaire?
É Freud, rapaziada! Vir a cair na cantada dum objeto-mulher.
Oh, eu me confundo, madame! E a classe média que mame se o céu, a prazo, se der!
As letras das canções citadas neste texto são dos anos 80. Quem conhece a obra do cearense sabe na década de 70 ele produziu suas músicas mais conhecidas.
Que uniam filosofia, literatura, história, política e poesia, é claro.
Se alguém quiser conferir o artigo citado, com as referências literárias na obra de Belchior, é só clicar no link abaixo:
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