Por Juliana Bezerra*
A Revolta da Vacina foi um motim
popular ocorrido entre 10 e 16 de novembro de 1904 na cidade do Rio de Janeiro,
então capital do Brasil. Seu pretexto imediato foi uma lei que determinava a
obrigatoriedade da vacinação contra a varíola, mas também é associada a causas
mais profundas, como as reformas urbanas que estavam sendo realizadas pelo
prefeito Pereira Passos e as campanhas de saneamento lideradas pelo médico
Oswaldo Cruz.
No início do século XX, o planejamento
urbano da cidade do Rio de Janeiro, herdado do período colonial e do Império,
não condizia mais com a condição de capital e centro das atividades econômicas.
Além disso, a cidade sofria com sérios problemas de saúde pública. Doenças como
a varíola, a peste bubônica e a febre amarela assolavam a população e
preocupavam as autoridades. No intuito de modernizar a cidade e controlar tais
epidemias, o presidente Rodrigues Alves iniciou uma série de reformas urbanas e
sanitárias que mudaram a geografia da cidade e o cotidiano de sua população. As
mudanças arquitetônicas da cidade ficaram a cargo do engenheiro Pereira Passos,
nomeado prefeito do Distrito Federal. Ruas foram alargadas, cortiços foram
destruídos e a população pobre foi removida de suas antigas moradias. Ao médico
Oswaldo Cruz, que assumiu a Diretoria Geral de Saúde Pública em 1903, coube a
campanha de saneamento da cidade, que visava erradicar a febre amarela, a peste
bubônica e a varíola. Com este intuito, em junho de 1904, o governo fez uma
proposta de lei que tornava obrigatória a vacinação da população. A lei gerou
debates exaltados entre os legisladores e a população, e, apesar da forte
campanha de oposição, foi aprovada no dia 31 de outubro.
O estopim da revolta foi a publicação
de um projeto de regulamentação da aplicação da vacina obrigatória no jornal A
Notícia, em 9 de janeiro de 1904. O projeto exigia comprovantes de vacinação
para a realização de matrículas nas escolas, para obtenção de empregos,
viagens, hospedagens e casamentos. Previa-se também o pagamento de multas para
quem resistisse à vacinação. Quando a proposta vazou para a imprensa, o povo
indignado e contrariado iniciou uma série de conflitos e manifestações que se
estenderam por cerca de uma semana. Embora a vacinação obrigatória tenha sido o
deflagador da revolta, logo os protestos passaram a se dirigir aos serviços
públicos em geral e aos representantes do governo, em especial contra as forças
repressivas. Um grupo de militares florianistas e positivistas, com o apoio de
alguns setores civis, tentou se aproveitar do descontentamento popular para
realizar um golpe de Estado na madrugada do dia 14 para o dia 15 de novembro,
que, no entanto, foi derrotado.
No dia 16 de novembro, foi decretado o
estado de sítio e a suspensão da vacinação obrigatória. Dada a repressão
sistemática e extinta a causa deflagradora, o movimento foi refluindo. Na
repressão que se seguiu à revolta, as forças policiais prenderam uma série de
suspeitos e indivíduos considerados desordeiros, tivessem eles relação com a
revolta ou não. O saldo total foi de 945 pessoas presas na Ilha das Cobras, 30
mortos, 110 feridos e 461 deportados para o estado do Acre.
Quando o presidente Rodrigues Alves
assumiu o governo, em 1902, nas ruas da cidade do Rio de Janeiro acumulavam-se
toneladas de lixo.
Desta maneira, o vírus da varíola se
espalhava. Proliferavam ratos e mosquitos transmissores de doenças fatais como
a peste bubônica e a febre amarela, que matavam milhares de pessoas anualmente.
Decidido a reurbanizar e sanear a cidade, Rodrigues Alves nomeou o engenheiro Pereira Passos para prefeito e o médico Oswaldo Cruz para Diretor da Saúde Pública. Com isso, iniciou a construção de grandes obras públicas, o alargamento de ruas, avenidas e o combate às doenças.
A reurbanização do Rio de Janeiro, no entanto, sacrificou as camadas mais pobres da cidade, que foram desalojadas, pois tiveram seus casebres e cortiços demolidos. A população foi obrigada a mudar para longe do trabalho e para os morros, incrementando a construção das favelas.
Como resultado das demolições, os aluguéis subiram de preço
deixando a população cada vez mais indignada.
Era necessário combater o mosquito e o rato, transmissores das
principais doenças. Por isso, o intuito central da campanha era precisamente
acabar com os focos das doenças e o lixo acumulado pela cidade.
Primeiro, o governo anunciou que pagaria a população por cada rato
que fosse entregue às autoridades. O resultado foi o surgimento de criadores
desses roedores a fim de conseguirem uma renda extra.
Devido às fraudes, o governo suspendeu a recompensa pela apreensão
dos ratos.
Contudo, a campanha de saneamento realizava-se com autoritarismo,
onde as casas eram invadidas e vasculhadas. Não foi feito nenhum esclarecimento
sobre a importância da vacina ou da higiene.
Num tempo onde as pessoas se vestiam cobrindo todo o corpo,
mostrar os seus braços para tomar a vacina foi visto como "imoral".
Assim, a insatisfação da população contra o governo foi generalizada,
desencadeando "A Revolta da Vacina".
O médico Oswaldo Cruz (1872-1917), contratado para combater as
doenças, impôs vacinação obrigatória contra a varíola, para todo brasileiro com
mais de seis meses de idade.
Políticos, militares de oposição e a população da cidade se
opuseram à vacina. A imprensa não perdoava Oswaldo Cruz dedicando-lhe charges
cruéis ironizando a eficácia do remédio.
Agitadores incitavam a massa urbana a enfrentar os funcionários da
Saúde Pública que, protegidos pelos policiais, invadiam as casas e vacinavam as
pessoas à força. Os mais radicais pregavam a resistência à bala, alegando que o
cidadão tinha o direito de preservar o próprio corpo e não aceitar aquele
líquido desconhecido.
O descontentamento se generalizou, somando aos problemas de
moradia e ao elevado custo de vida, resultando na Revolta da Vacina
Obrigatória. Entre 10 e 16 de novembro de 1904, as camadas populares do Rio de
Janeiro saíram às ruas para enfrentar os agentes da Saúde Pública e a polícia.
O centro do Rio de Janeiro foi transformado numa praça de guerra
com bondes derrubados, edifícios depredados e muita confusão na Avenida Central
(atual Avenida Rio Branco). A revolta popular teve o apoio de militares que
tentaram usar a massa insatisfeita para derrubar, sem sucesso, o presidente
Rodrigues Alves.
O movimento rebelde foi dominado pelo governo, que prendeu e
enviou algumas pessoas para o Acre. Em seguida, a Lei da Vacina Obrigatória foi
modificada, tornando facultativo o seu uso.
Revolta teve saldo de 945 pessoas presas na Ilha das Cobras, 30
mortos, 110 feridos e 461 deportados para o estado do Acre.
Movimento inspirou novelas, minisséries e até ópera. A obra
"O Cientista", do maestro brasileiro Sílvio Barbato, conta a vida de
Oswaldo Cruz e dedica uma cena inteira ao acontecimento.
*Fonte: https://www.todamateria.com.br/revolta-da-vacina/
Juliana Bezerra - Bacharelada e Licenciada em História, pela PUC-RJ. Especialista em Relações Internacionais, pelo Unilasalle-RJ. Mestre em História da América Latina e União Europeia pela Universidade de Alcalá, Espanha.


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