Ferreira Gullar, para muitos o maior poeta vivo da língua portuguesa,
escreveu "Traduzir-se", que ficou conhecida por "meio
mundo", após ser musicada pelo cantor Fagner.
"Metade", poema de Osvaldo Montenegro, lembra muito os versos
espalhados ao vento pelo cearense. Através do blog "Sopa de Poemas",
ficamos sabendo que Gullar acusou Montenegro de plágio e este negou. As duas
poesias são lindas, com muitas semelhanças e algumas diferenças.
De acordo com a Assessoria de Oswaldo Montenegro, o poema “METADE” foi escrito e publicado em 1974 no libreto de sua peça “João sem Nome”. Já poema “Traduzir-se”, de Ferreira Gullar, foi publicado em 1980, em seu livro “Na vertigem do dia”. Ou seja, seis anos após a publicação do poema “Metade”, de Oswaldo Montenegro.
METADE - Oswaldo Montenegro
Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece
e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta
a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso
mas a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste,
e que o convívio comigo mesmo
se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é plateia
E a outra metade é canção.
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.
TRADUZIR-SE - Ferreira Gullar
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
- que é uma questão
de vida ou morte -
será arte?
Vi este comentário em um blog:
ResponderExcluir"Metade é de autoria de Oswaldo Montenegro, que o lançou em 1975 no libreto da peça teatral João sem Nome. Ferreira Gullar é autor do poema Traduzir-se, lançado no livro Vertigens do Dia, publicado em 1980. Os dois poemas tratam de um tema recorrente na literaura universal - os paradoxos do ser humano. Ambos, belíssimos poemas."
É verdade. Se alguém tivesse plagiado alguém teria sido o Gullar. Mas eu nem diria isso. São obras diferentes e igualmente respeitáveis.
ResponderExcluirE Ferreira Gullar precisa plagiar alguém? Nasceu poeta. Não há plágio nenhum. Apenas a temática - dualidade - aparece em ambos os poemas, mas as palavras não são as mesmas.;
ExcluirNão vejo porque dizem que é plágio!
ResponderExcluirESCLARECIMENTO - O poema “METADE”, de Oswaldo Montenegro, foi escrito e publicado em 1974 no libreto de sua peça “João sem Nome”.
ResponderExcluirO poema “Traduzir-se”, de Ferreira Gullar, foi publicado em 1980, em seu livro “Na vertigem do dia”. Ou seja, 6 anos APÓS a publicação do poema “Metade”, de Oswaldo Montenegro.