Nos anos 60 tivemos a consolidação da Bossa Nova, o surgimento da Jovem Guarda e do tropicalismo. João Gilberto, Roberto Carlos, Wanderléia, Caetano Veloso, Maria Betânia, Gal Costa e Gilberto Gil. Na década seguinte esses e outros artistas consolidaram suas carreiras e surgiu o Pessoal do Ceará: Fagner, Ednardo, Belchior, Roger, Teti e Amelinha. E tivemos dois grandes “fenômenos isolados” que causaram uma verdadeira explosão na MPB: Raul Seixas, com a loucura de Ouro de Tolo, e Secos e Molhados, um grupo totalmente inovador, desbocado, criativo, com um som que sacudiu o Brasil em plena vigência do regime militar.
O grupo gravou apenas dois discos, em 1973 e 1974, mas foi o bastante para projetar os rapazes, principalmente o vocalista de voz feminina, por todo o Brasil. Rosa de Hiroshima (música feita a partir de um poema de Vinícius de Moraes), Sangue Latino, Patrão Nosso de Cada Dia e o Vira rapidamente se tornaram hits nas rádios e a banda revolucionária se apresentava nos principais programas de televisão. Quem teve a oportunidade de ver, pela primeira vez, o Secos e Molhado na "Discoteca do Chacrinha", tomou um susto e se apaixonou. A música de João Ricardo, Gerson Conrad e Ney Matrogrosso era contagiante.
Desentendimentos entre o “cabeça” do grupo, João Ricardo, e o cantor, Ney Matogrosso, levou ao rompimento da banda. Cada um seguiu carreira solo, porém só o vocalista continuou a fazer sucesso e hoje é reconhecidamente um dos maiores intérpretes da música popular brasileira.
Ney de Sousa Pereira é do Mato Grosso do Sul, tendo nascido em Bela Vista, no dia primeiro de agosto de 1941. Está para completar 69 anos, portanto. O cantor de voz andrógina, imagine, é filho de um militar. Ele mesmo tentaria seguir o caminho do pai, entrando para a Aeronáutica. Nada a ver. Terminou mesmo foi virando artista, vocação desenhada desde criança. O menino solitário de uma cidadezinha distante dos grandes centros - na fronteira com o Paraguai -, dançava, pintava, cantava e questionava o mundo dos adultos.
O nome Ney Matogrosso foi adotado já no tempo dos Secos e Molhados. Em 1975, já sem os companheiros da banda, lançou um disco pretensioso, trabalhado de forma inovadora a partir da capa. O álbum “Água do Céu – Pássaro” trazia músicas de Milton Nascimento, João Bosco e Aldir Blanc, Sueli Costa e até um fado da portuguesa Amália Rodrigues. Um trabalho muito bonito, mas que não foi compreendido pelo público da época. O vinil obteve vendagem inexpressiva, ao contrário dos primeiros discos da banda que levaram, cada um, em torno de um milhão de pessoas às lojas.
No ano seguinte, no entanto, com o disco Bandido Corazón, título de uma música de Rita Lee, gravada por Ney, o artista acertou no gosto popular e emplacou diversos sucessos nas rádios, fazendo o disco vender muito bem. O segundo vinil incluía ainda músicas de Rosinha Valença (Usina de Prata), Gilberto Gil (Gaivota) João da Silva e Caboclinho (o clássico “Pra não Morrer de Tristeza") e Chico Buarque (uma interpretação arrojada de Mulheres de Atenas).
A partir daí a carreira de Ney Matogrosso foi quase sempre ascendente e seu nome se firmou definitivamente como cantor e intérprete. Gravou os melhores compositores brasileiros como Noel Rosa, Cartola, Lupicínio Rodrigues, Chico, João Bosco e Aldir Blanc, Sueli Costa, Gil, Caetano, Tom Jobim, Cazuza, Renato Russo e até Raul Seixas. Deste regravou “Metamorfose Ambulante”, que fez sucesso também na sua voz.
Em 1990 gravou um dos melhores discos de sua carreira, À Flor da Pele, com o violinista Raphael Rabello. Neste álbum fez uma seleção de grandes clássicos da música popular brasileira, resgatando Noel, Ary Barroso, Adelino Moreira, Cartola e Herivelto Martins. Ainda nesta década faria uma homenagem a Ângela Maria, gravando um disco com canções conhecidas na voz da grande cantora nacional.
Na década atual Ney continuou se reinventando, gravando, em 2004, com um grupo bem mais jovem, denominado “Pedro Luís e a Parede”. É particularmente bela a música “Mundo”, resultado do encontro com essa banda.
Ney Matogrosso esteve duas vezes no Festival de Inverno de Garanhuns. Da primeira vez, sozinho, lotou completamente a Praça Guadalajara e fez um grande show. Da segunda, com Pedro Luís e a Parede, causou certa estranheza em parte dos fãs do interior, que possivelmente não estavam preparados para as inovações, para a “guinada” na vida do cantor.
Uma vez, numa entrevista, o cantor confessou o seguinte: “Quando chegar aos 50 vou começar a parar. Já estou com 60 e ainda me sinto com o mesmo pique, estou muito bem”. Ney Matogrosso já se aproxima dos 70 e é ainda um artista jovem, bonito, de voz maravilhosa e com um repertório normalmente de extremo bom gosto. Acredito que ainda tem muito a oferecer ao Brasil e ao mundo, pois com certeza é um dos grandes nomes da nossa rica MPB.
*Fonte de Consultas: Biografia resumida de Ney no site oficial do artista, enciclopédia google e discografia do cantor.
**Grandes Nomes da MPB é uma série que vem sendo escrita há alguns meses, sempre com o perfil de um grande artista da música nacional, nos finais de semana. Alguns nomes já incluídos: Vicente Celestino, Nélson Gonçalves, Renato Russo, Martinho da Vila, Fagner, Elba Ramalho, Gal Costa, Zeca Baleiro, Adriana Calcanhoto, Marisa Monte, Eliseth Cardoso, Rita Lee, Cássia Eller, Simone e Paulinho da Viola. O texto é sempre acompanhado de um vídeo do youtube, com a interpretação de uma canção marcante da carreira do cantor ou cantora. Para ver a relação completa é só buscar "grandes nomes da mpb".
***Clicando no nome Ney Matogrosso, todo maiúsculo, acima, você acessa um vídeo do cantor interpretando de forma magistral "Balada de um Louco", de Arnaldo Baptista e Rita Lee.
Só uma observação: para João Ricardo, dono da marca "Secos & Molhados", a banda nunca acabou. Tanto que ele gravou muitos discos depois dos três com Gerson e Ney com a marca (é que além dos de estúdio, houve um ao vivo no Maracanã, se não me engano)... Tenho todos os discos, desde Ney até quando o grupo realmente "apagou", e creio que sejam ao todo uns oito discos.
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