Também é Especialista em
Metodologia do Ensino de Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco e
Licenciado em Geografia pela Universidade de Pernambuco.
Nesta entrevista ao professor
Cláudio Gonçalves, o geógrafo e
educador Carlos Ubirajara fala de suas origens, sua trajetória acadêmica, suas
pesquisas e produções no campo da Geografia e da Educação.
Ubirajara é um educador
incansável que não para de trabalhar, pesquisar e se aperfeiçoar, lecionando
Geografia Regional e Geografia Política na Universidade de Pernambuco/Campus
Garanhuns, participando e ministrando palestras em seminários, conferências,
simpósios e congressos e, concomitante estruturando dois livros promissores a
partir de estudos sobre o turismo e as ações educativas em nossa região.
Confira:
Cláudio - Professor Carlos Ubirajara,
primeiramente fale um pouco de você e de suas origens?
Carlos - Eu sou Carlos Roberto Cruz
Ubirajara, Especialista em Educação e em Metodologia do ensino de Geografia,
Mestre e Doutor em Geografia, professor da UPE/Campus Garanhuns, natural de
Águas Belas-PE, descendente de família tradicional naquele município. Minha mãe
a professora Edméa Cruz Ubirajara natural de Caruaru e formada no Colégio
Sagrado Coração daquela cidade em 1943, foi uma das pioneiras em nossa região
quando da implantação de uma pedagogia nova no Brasil em um período em que
havia a necessidade de uma proposta de
superação do método tradicional de ensino, vinculado aos jesuítas, sobretudo,
na superação de um modelo elitista de escola.
Transferida de Caruaru para
Bom conselho em 1948 foi uma das agentes de um método de ensino, que buscava
instituir uma luta social e política
pela ampliação da escolarização em nome de uma nova forma de organização
social: a democracia, a partir da
passagem do modelo de produção colonial para o agrário industrial tendo como
prioridade acrescentar à instrução a
inserção de valores morais para a melhoria da cultura da população, que deixa
de viver no campo e vem para as cidades, em busca de melhores condições de
vida. Acompanhei quando criança já nos anos sessenta, sua luta em prol de uma
educação voltada para os princípios morais e éticos de um povo. Meu pai Acy Ivo
Ubirajara, neto do Cel. Sátiro Ivo de Garanhuns e Cel. Nicolau Siqueira de
Águas Belas, foi agente arrecadador do Estado o que seria hoje, auditor fiscal
da SEFAZ e, também, fazendeiro. Assim,
minha vocação de educador foi estimulada pela vivencia de uma mãe
professora/educadora e, de um pai proprietário de terras e arrecadador de impostos,
o que me possibilitou refletir sobre as condições de vida de um povo e a
necessidade de compreender a lógica que permeia as engrenagens sociais e
econômicas por meio da educação, encontrando respaldo na Ciência
Geográfica.
Cláudio - Antes
de falarmos sobre suas produções acadêmicas, comecemos pelo início de tudo: O
que despertou o seu interesse pela Geografia? Era mais o conhecimento
geomorfológico ou outros campos de estudos?
Carlos - A
geomorfologia é apenas um campo da Geografia, esta ciência é muito mais
abrangente, tem como objetivo principal compreender a lógica da organização dos
espaços e a definição dos territórios.
Busca entender a dinâmica de organização do espaço conforme o Geógrafo
Milton Santos, enquanto um conjunto indissociável e contraditório de sistemas
de objetos e sistemas de ações. Estabelecendo relações entre o contexto
histórico na formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza, por
meio da leitura do lugar, enquanto relação efetiva, sentimento de
pertencimento, e, do território enquanto porção do espaço definido por e a
partir de relações de poder. Sendo analisado, através da leitura do texto, que
a sociedade e a natureza imprimiram sobre a superfície terrestre que são as
paisagens, que é nesse caso, a materialização física de uma sociedade que a
construiu. Ou seja, por traz do que a gente vê existe uma dinâmica social que a
determina. Desse modo, auxilia no
planejamento das ações do homem sobre o espaço, buscando a compreensão das
formas de relevo, dos fenômenos climáticos, das composições sociais, dos hábitos
humanos nos diferentes lugares que são imprescindíveis para a manutenção da
vida em sociedade.
Neste sentido, essa ciência
também, de acordo com Rui Moreira, passou a ser utilizada para desvendar as
máscaras sociais, uma vez que revela como os sistemas econômicos, políticos,
ideológicos e sociais se manifestam sobre as pessoas e sobre o espaço. Temas
como a segregação espacial, o processo de favelização, a evolução e
espacialização da violência e marginalidade são estudados e explicados em suas
raízes pela Geografia, o que pode auxiliar no planejamento social, bem como nas
críticas e ações populares que auxiliem no combate a este e outros problemas
socioespaciais. Daí o meu interesse pela ciência geográfica.
Cláudio - Conte-nos
um pouco sobre a sua formação acadêmica e sua trajetória como educador.
Carlos - Como
já frisei, a partir do momento que decidi ser um educador busquei e busco me
aperfeiçoar sempre para contribuir com alguma coisa e para valorizar o mundo.
Para tanto, fiz graduação em Geografia pela UPE, especialização em metodologia
do Ensino Superior e em Programação do ensino de Geografia também pela UPE,
Especialização em Metodologia do Ensino de Geografia pela UFPE. Mestrado em
geografia pela UFPE e Doutorado em Geografia pela -UECE – Universidade Estadual
do Ceará. Iniciei minha vida profissional lecionando no Colégio Municipal
Gerson de Albuquerque Maranhão em Águas Belas-PE quando era apenas Técnico em
Contabilidade (1974), em seguida na Escola Estadual João Rodrigues Cardoso na
mesma cidade (1979), dez anos depois, em 1989, me submeti a uma seleção e fui
selecionado para compor a equipe interdisciplinar (Geografia) na Gerência
Regional de Educação do Agreste Meridional para implementar uma nova concepção
de Educação já que estávamos saindo do Regime Militar. Já residindo nesta
cidade de Garanhuns, onde tenho fincada raízes familiares, uma vez que sou
bisneto de Sátiro Ivo, atuei como professor de Geografia durante seis anos no
ensino médio do Colégio Santa Sofia.
Atualmente leciono Geografia Regional e Geografia Política na
Universidade de Pernambuco-UPE/Campus Garanhuns.
Cláudio - Qual
a sua concepção do papel do profissional em Geografia?
Carlos - Na
sociedade atual, conforme afirmado por (Santos: 1997) graças à unicidade da
técnica que possibilita a convergência dos momentos, configurando o que se
denomina meio-técnico-cientifico- informacional, que impulsiona sobremaneira, o
processo de globalização, torna-se evidente que os impactos das novas
tecnologias impulsionam novos olhares, novos conceitos e, novas formas de
produzir, consumir e pensar estimulando nesse sentido, novas posturas no campo
educacional, a partir de uma escola voltada não apenas para ensinar conteúdos e
sim desenvolver competências, para um mundo cada vez mais complexo e
multifacetado, cheio de conflitos e contradições, para um novo mercado de
trabalho, para sociedades multiétnicas e multiculturais conformando desse modo,
um novo conceito de cidadania. Neste
sentido, o processo de ensino e aprendizagem passou a exigir das práticas
pedagógicas a organização de um currículo voltado para o desenvolvimento de
competências e habilidades, inteligências múltiplas e atitudes, ou seja, novas
formas de apropriação e compreensão de conhecimentos e saberes que possibilitem
a formação dos sujeitos numa perspectiva integral, dinâmica e
contemporânea.
Diante do exposto, a
Geografia está inserida neste processo, pois é uma ciência dos fenômenos
cotidianos. Assim, no âmbito da sociedade da informação e na construção do meio
técnico-científico-informacional, conforme já apontava Milton Santos, o
professor se vê inserido em um ambiente em que muitas informações e dados sobre
os mais diversos processos e fenômenos são disseminados no espaço da sociedade.
Por isso, mais do que oferecer conteúdo escolares para os seus alunos, o
profissional de Geografia tem a missão de auxiliá-los na absorção e na reflexão
crítica de toda essa massa de informações que lhes chega todos os dias. Desse
modo, o novo contexto tecnológico deverá propiciar as condições epistemológicas
para o educando emancipar-se, sendo o aprender uma atividade contínua, e a
emancipação total do sujeito é meta prioritária para toda a vida. Assim sendo,
em função do aparato tecnológico vivenciado na atualidade, a escola deverá
rever seus desafios, que é trabalhar o conhecimento, não só a informação. As novas tecnologias digitais têm um papel
primordial nesses encaminhamentos, processar as informações, e a escola,
sistematizar, normatizar, hierarquizar as mesmas. Neste sentido, o professor
deverá ter noção da “realidade tecnológica” e das competências do novo aprendiz
já que precisa desenvolver um novo perfil: ser pesquisador, não mais um
repetidor de informações; articulador de saberes, não mais fornecedor único de
conhecimentos; gestor de aprendizagens, não mais instrutor de regras; motivador
da aprendizagem pela descoberta, não mais transmissor de informações
empacotadas a serem assimiladas e reproduzidas pelo aluno. Neste sentido, o
profissional em Geografia deve oferecer a partir de uma metodologia de ensino
mais dinâmica e propositiva, as condições necessárias para que o educando
compreenda as transformações estabelecidas no espaço geográfico de sua
vivência, tendo em vista que o mesmo é dinâmico e complexo, e, a sua construção, se dá em função das relações
que vão se estabelecendo entre o contexto histórico na formação das sociedades
humanas e o funcionamento da natureza.
Nesta perspectiva, Edgar Morin (2002), destaca que o homem cria o meio,
e, este, por sua vez, cria o homem.
Desse modo, homem e meio se
retroalimentam. Pois, todas as formas de
ações abstratas política/jurídicas estão conectadas a dinâmica das formas e dos
conteúdos espaciais, uma vez que de acordo com George (1993), “toda a geografia
é solidariamente, uma explicação da condição humana, mais precisamente, das
formas e vicissitudes da existência dos homens nos espaços mais ou menos
delimitados, uniformes e diversificados, num dado momento da evolução geral dos
grupos humanos e seus confrontos”. Diante desse contexto, é possível reafirmar
a importância do profissional de Geografia tanto para a pesquisa quanto para a
formação de sujeitos que reconheçam a dimensão social de sua participação na
apropriação do espaço, que é construída a partir da operacionalização de
categorias e conceitos que fundamentam a ciência geográfica.
Cláudio - Como
os conceitos geográficos de materialidade na configuração do espaço e de sua
dinâmica sócio-espacial podem contribuir para uma visão de mundo e da
realidade?
Carlos - De
acordo com o professor Antônio Carlos Robert de Moraes, uma primeira questão a
ser considerada, que já contém uma diversidade incrivelmente grande, e que o
planeta é naturalmente diversificado, há diferenças de lugar a lugar, de porção
a porção da superfície da Terra.
Existem diferenças zonais, de
relevo, de clima, de vegetação, enfim, o mundo está dividido em biotas, biomas,
em ecossistemas, termos que tentam dar conta (já numa visão sintética) da
diversidade natural da Terra. Mas, além da diversidade natural, há que relevar
a ampla diversidade das culturas. Os habitantes do planeta se formaram, vivem e
convivem imersos em culturas diferentes, que vão redundar em diferentes formas
de apropriação dos lugares, em diferentes construções sobre o espaço terrestre.
As formas espaciais criadas por um grupo humano, por exemplo, revelam de
imediato muito do acervo cultural e tecnológico que ele dispõe. Assim sendo, é
necessário levar em conta os meios técnicos disponíveis, para entender as
formas de instalação e de transformação dos habitats. Essas formas de
construção, de organização, também respondem a arranjos sociais vigentes, isto
é, os espaços construídos visam ser funcionais ao modo de vida de seus
habitantes. Com isso eu quero dizer que é possível ler nas formas que se
materializam na superfície da Terra, as relações sociais vigentes na época da
sua edificação.
Cada época cria as suas
formas, cada modo de organização da sociedade gera as suas paisagens. Assim, é
possível ler, nas formas criadas, os processos sociais que engendraram essas
formas. Pode-se citar como exemplo o feudalismo que em um determinado momento
cria a forma castelo e aldeia, o escravismo colonial que explica a casa grande
e a senzala, e, num certo momento o capitalismo concorrencial pode ser lido na
existência da fábrica com a vila operária do lado, assim como essa aglomeração na qual nós estamos
inseridos hoje em dia é uma forma do
nosso tempo. Em suma, as formas criadas, materializadas pela sociedade se
ajustam à sociabilidade reinante. Desse modo, os lugares vão se tornando diferentes,
não só por suas características naturais, mas também pelas heranças espaciais
acumuladas, pelos espaços construídos que cada um contém. São heranças
espaciais variadas. Para usar uma bela expressão do professor Milton Santos,
essa diferenciação do espaço significa “tempo materializado na paisagem”. Os
lugares têm uma temporalidade distinta, e cada época agrega, a um dado lugar,
as formas que lhe são próprias.
Cláudio - Algumas
das suas produções acadêmicas são voltadas para a análise geo-ambiental, diante
dessa problemática, o que você considera relevante para elaboração de um
planejamento territorial ambiental e necessidades concretas de desenvolvimento
sustentável e educação ambiental, tendo como campo de estudo Garanhuns e
Agreste Meridional.
Carlos - Como
sabemos o espaço geográfico é a porção da superfície terrestre que abriga as
sociedades, envolvendo também os pontos utilizados para a exploração e consumo
dos recursos naturais. Não se trata apenas de um palco ou um produto, pois ele
é resultado e também resultante das ações humanas. Diante do exposto, torna-se
imperativo compreender que além do próprio ser humano, compõem o espaço
geográfico todas as suas obras e os meios naturais que interferem em suas
atividades, como as cidades, as plantações, o meio rural, as indústrias, os
objetos, os rios, os climas etc. Desse modo à produção do espaço geográfico –
ou seja, o processo pelo qual o homem transforma e habita o meio em que vive –
depende da natureza.
A partir da exploração e do
aproveitamento dos recursos naturais, o ser humano desenvolve as suas
atividades para a sua reprodução e sobrevivência. Dessa forma para o
desenvolvimento de um estudo e/ou planejamento geo-ambiental sustentável
devemos analisar a paisagem não apenas a partir da simples localização deste ou
daquele objeto geográfico particular, mas a distribuição de todos os objetos e
as diversas fisionomias de conjunto que revelam o meio, influenciando desse
modo na forma pela qual os homens interagem com o seu entorno, tirando proveito
do mesmo. Desse modo, ao estudarmos a região de Garanhuns, deveremos buscar a
compreensão de que o espaço é uma localização física, uma peça de bem imóvel, e
ao mesmo tempo o local geográfico da ação e a possibilidade social de
engajar-se na ação. Num plano individual, por exemplo, ele não só representa o
local onde ocorrem os eventos (recebe), mas também significa a permissão social
de engajar-se nesses eventos (função da ordem social).
Cláudio - Uma
das temáticas que também envolvem o seus estudos é a difusão da função
turística e o Ecoturismo. Neste sentido, como você avalia a reorganização
sócio-espacial do município no contexto do seu desenvolvimento turístico? Quais as potencialidades, perspectivas e
desafios?
Carlos - A
Região de Garanhuns oferece um patrimônio de paisagens pouco usuais e de
extrema beleza que vão desde a presença de remanescentes de vegetação florestal
de altitude, até esculturas naturais e cachoeiras de águas frias e permanentes.
Há uma combinação rara de patrimônio natural e estrutura de assentamentos
tradicionais (fazendas e sítios). Neste sentido a região que já foi calçada
pelo pisar vigoroso das boiadas e que se tornou importante devido ao consorcio
das atividades agropastoris abre-se também agora – em função da implementação
das atividades turísticas - àqueles que a procuram pelo interesse de investir
em hotéis (urbanos ou hotéis fazendas), bem como em atividades associadas aos
eventos em um cenário de um verdadeiro Oásis
- área ecologicamente
diferenciada – em pleno interior do nordeste semiárido.
Assim, a difusão da função turística na Região de
Garanhuns está relacionada com os condicionantes naturais, uma vez que a mesma
possui características diferenciadas daquelas dominantes no semiárido do
Agreste Pernambucano. Isto possibilita a
implementação de iniciativas de uso turístico na região, um turismo
diferenciado, peculiar e raro, do tipo serrano e interiorizado, o que contrasta
com o padrão dominante do turismo comumente desenvolvido no nordeste do Brasil
(Padrão litorâneo/praias ou que os estudiosos chamam do tipo SSS: ‘sun’ = sol,
‘sea’ = mar e ‘sand’=areia). A inserção dessa nova dinâmica funcional começa
por redefinir a região funcionalmente, ao mesmo tempo em que redesenha as
paisagens, e reforça características herdadas (história, fazendas, café) nessa
área integrante do agreste meridional Pernambucano. A difusão do turismo tem
sido extremamente relevante na organização e redefinição da dinâmica de uso do
solo regional e, por conseguinte das alterações ocorridas nas paisagens, alterações
ocasionadas pela implementação de uma nova via de turismo interior, integrando
a região de Garanhuns a dinâmica dos serviços turísticos, e criando rupturas
nos estilos de vida das populações regionais ao alterar códigos de valores,
padrões de consumo e horizontes profissionais e de negócios (abertura de bares,
restaurantes, postos de gasolina, hotéis, etc.). Diante do exposto a região
tomou um grande impulso e vem buscando melhor se equipar para receber os
visitantes vindos de toda parte do nosso Brasil a procura dos seus hotéis, de
seus colégios, de suas fazendas, de seus encantos serranos.
Este progresso evidenciou-se
na configuração das paisagens com o crescimento e estilização dos equipamentos
urbanos (Parques, ruas saneadas e pavimentadas, cinemas, praças e
ajardinamentos e etc.) além do incremento do comercio local. Porém, torna-se imperativo e necessário
valorizar os seus espaços de cultura, como por exemplo, o centro cultural, um
belo patrimônio que precisa de mais cuidados. Além de uma melhor qualificação
dos agentes sociais e econômicos locais envolvidos com o processo. Por exemplo,
taxistas, empresários, funcionários de hotéis, bares e restaurantes precisam
conhecer além da técnica de atendimento, os valores e atrativos locais para
quando questionado saber responder adequadamente. Vender de forma positiva a imagem de
Garanhuns e Região. Desse modo, o desencadeamento das atividades turísticas
cria mudanças - uma vez que também impulsiona os agentes públicos (Estado e
Município) - em fragmentos do ambiente físico e sócio cultural do município e
região redefinindo e redesenhando paisagens.
Cláudio - Garanhuns-PE,
Ações Educativas e Dinâmica SocioEspacial: Um Análise Geo-histórica das
Relações Estabelecidas entre Religião, Estado e Educação foi sua tese de defesa
do Doutorado pela Universidade Estadual do Ceará. Que contribuições a pesquisa
trouxe para a compreensão da análise de espacialidades, complexidade das ações
dos agentes (sociais, políticos e econômicos) e das alterações sócio-espacial?
Carlos - As
ações educacionais materializadas a partir da implantação e expansão de
instituições educativas resultam no desenvolvimento de sistemas de objetos,
sobretudo aqueles relacionados ao ensino bem como, no surgimento e
potencialização de fluxos e/ou sistemas de ações correlatas. Em nossa pesquisa,
percebe-se que as diversas ações educativas, desenvolvidas ao longo de um
contexto histórico, ocasionaram diferentes formas de uso do solo, refletindo-se
isto diretamente na dinâmica das paisagens tendo em vista que as referidas
ações educacionais operacionalizadas pelo Estado, Município e pelas igrejas
(Católica e Presbiteriana) em Garanhuns-PE a partir da instalação das
instituições de ensino (Fundamental, Médio e Superior) estão
correlacionadas/associadas com a materialização da dinâmica socioespacial e na
definição de territórios, ou seja, as ações educativas ancoradas nas
normatizações estatais à partir da instalação de instituições de ensino em
Garanhuns-PE estão correlacionadas/associadas com a dinâmica socioespacial.
Entretanto, apesar da
reconhecida importância desses estudos, a análise das espaciais advindas de
ações na área educacional ainda não se acha muito presente na produção
acadêmica nacional, muito embora, os estudos sobre geografia urbana e serviços
analisem o assunto, apenas como reflexo das políticas de desenvolvimento
econômico. Neste sentido, reduzir essa análise tão somente como consequência de
outros macroprojetos políticos institucionais, ao nosso ver, sempre
inviabilizaram pesquisas que tivessem a probabilidade de analisar a dinâmica
sócio espacial tendo, como fundamento maior, projetos no âmbito educacional.
Desse modo A minha pesquisa busca oferecer uma contribuição ao estudo desta
temática. Tem por objetivo compreender como as ações educacionais a partir da
instalação de instituições de ensino passam a desempenhar a função articuladora
no contexto urbano e regional em que estão inseridas. Para o entendimento desse
processo partimos do pressuposto de que a organização da dinâmica sócio espacial,
ocasionada pelas ações educacionais, enquanto práticas espaciais, promovidas
inicialmente pelas igrejas e pelo Estado, viabilizaram uma demanda para o
desdobramento do ensino superior, propiciando desse modo a instalação e
ampliação das referidas instituições em Garanhuns-PE – em meados dos anos 60
(UPE) e AESGA e a partir de 2005 (UFRPE/UAG) e várias outras IES. Desse modo as
práticas espaciais estabelecidas a princípio pelas igrejas (Católica e
Presbiteriana), possibilitadas pelo Estado, criaram uma estrutura educacional
de referência na região, pela concentração de estabelecimentos de ensino de
qualidade, instituindo desse modo uma centralidade regional, direcionando
sobretudo fluxos e refluxos de pessoas e ideias e propiciando desse modo, novas
demandas sociais e econômicas. Podemos então concluir que a criação desse polo
educacional, considerando que esta ação localizada em um núcleo urbano criou
processos e formas espaciais concentradoras de um determinado serviço,
juntamente com outras ações políticas, consorciado a um ecossistema
diferenciado no semiárido nordestino, foi responsável por uma nova lógica
espacial e uma concentração populacional expressiva, gerando vida e movimento
ao espaço urbano, transformando Garanhuns na principal cidade do agreste
meridional pernambucano.
Cláudio - Pretende
publicar futuramente um livro a partir desta tese?
Carlos - Pretendo
sim, estou apenas atualizando dados e muito em breve estarei lançando os dois
trabalhos, os estudos sobre o turismo e as ações educativas em nossa região.
Cláudio - São
muitos geógrafos que tem contribuído para a compreensão da configuração e produção
do espaço. Que correntes filosóficas e geógrafos se alinham ao seu pensamento
geográfico contemporâneo?
Carlos - O
entendimento dos mecanismos e da importância dos fatos geográficos, naturais,
culturais e econômicos passa necessariamente pela compreensão do significado do
espaço geográfico, definido por Milton Santos (1994) em sua vasta obra sobre o
assunto, como um [...] conjunto indissociável de que participam de um lado,
certo arranjo de objetos geográficos, objetos naturais e objetos sociais, e, de
outro, a vida que os preenche e os anima. Nesta perspectiva, avalia-se que as
ações humanas enquanto ação pontual que tem repercussão no próprio ponto e no
que está à sua volta, ou seja, no seu entorno, compõe a ideia de espaço
geográfico que passou a ser constituída a partir do conjunto de localizações e
de ações vividas. Dessa forma evidencia-se por sua vez, a questão da identidade
territorial que no dizer de Santos (1999, p. 08): (...) não é apenas o conjunto
dos sistemas naturais e de sistemas de coisas superpostas. O território tem que
ser entendido como o território usado, não o território em si. O território
usado é o chão, mais a identidade. A identidade é o sentimento de pertencer
àquilo que a nós pertence. Reportamo-nos também - estabelecendo é claro, as
devidas adequações - as teorias desenvolvidas por Zeny Rosendahl (2001) onde a
autora formula teorias acerca da Geografia e Religião, tendo como maior desafio
esquadrinhar o entendimento das dinâmicas espaciais envolvendo a religião e sua
influência na organização espacial. Este comparável facilita e auxilia na
compreensão da dinâmica espacial permitida pelas ações educacionais. E, grandes
outros Geógrafos como: Rui Moreira, Antônio Carlos Robert de Moraes, Paulo
Cezar Gomes, só para citar alguns.
Cláudio - Diante
do mundo globalizado e seus eternos conflitos, qual a contribuição da Geografia
para a compreensão da Nova Ordem Mundial?
Carlos - Globalização
é o ápice do processo de internacionalização do mundo capitalista, e para seu
entendimento devemos levar em conta: o estado das técnicas e o estado da
política. As técnicas são oferecidas como um sistema e realizadas
combinadamente através do trabalho e das formas de escolha dos momentos e dos
lugares de seu uso. Portanto, a globalização não é apenas a existência desse
novo sistema de técnicas, é também o resultado das ações que asseguram a
emergência de um mercado dito global, responsável pelo essencial dos processos
políticos atualmente eficazes. Neste sentido a contribuição da ciência
geográfica está contida em sua finalidade que é compreender a dinâmica social e
espacial, que produz, reproduz e transforma o espaço geográfico nas diversas
escalas (local, regional, nacional e mundial). Desse modo as relações
socioespaciais devem ser consideradas tendo em vista a historicidade do espaço,
não como enumeração ou descrição de fatos que se esgotam em si mesmos, mas como
processo de construção social numa relação estabelecida entre o contexto
histórico na formação das sociedades humanas e o funcionamento da natureza.
Cláudio - Reconhecido
no campo educacional, qual a sua visão de Educação e Sociedade?
Carlos - Historicamente
os sistemas educacionais capitalistas vêm desenvolvendo mecanismos de filtragem
social para garantir o acesso diferenciado aos diversos graus e ramos de ensino
que terminam por privilegiar o acesso e permanência no sistema escolar dos
representantes da classe dominante e de seus aliados, contudo a socialização da
política nas sociedades contemporâneas, ao proporcionar às classes menos
favorecidas maiores espaços de controle social da riqueza e do poder - apesar
de que nos dias atuais, estamos sofrendo uma pressão muito grande, por parte do governo recém instalado em nosso
pais, quando observa-se a tentativa de desqualificação das universidades e dos
educadores, demonizando-os - vem
possibilitando também o controle social da produção e da transmissão do saber.
O controle democrático das
políticas educacionais constitui, desse modo, um elemento fundamental para que
a escola garanta, ao trabalhador, conteúdos necessários à compreensão e à
intervenção na civilização técnico-científica, instrumental político
indispensável ao exercício pleno de sua cidadania. A sensação de que se vive em
uma época de grandes transformações que se desdobram em novos desafios e
oportunidades deixou de ser um dado subjetivo para se tornar uma diretriz que
orienta a agenda de governos e a atuação de movimentos sociais, partidos
políticos e organizações públicas e privadas, inclusive instituições de
educação superior e centros de pesquisa.
Cláudio - Se
pudéssemos usar os óculos da Geografia como enxergaríamos o mundo em nossa
volta?
Carlos - Extremamente
complexo e multifacetado, cheio de conflitos e contradições, torná-lo
inteligível é, para nós geógrafos, uma tarefa inicial. Decifrando-o, como diz
Lefébvre, revelamos as práticas espaciais dos diferentes grupos que nele
produzem, circulam, consomem, lutam sonham, enfim, vivem e fazem a vida
caminhar.
Cláudio - Atualmente
está trabalhando em novos projetos?
Carlos - Sim,
além da atualização de dados dos meus trabalhos sobre a Região de Garanhuns e a
Difusão da Função Turística (Dissertação de Mestrado) e Ações Educativas e a
Dinâmica Socioespacial (Tese de Doutorado) para publicação, estou trabalhando
também na orientação do programa Residência Pedagógica da CAPES em parceria com
a UPE, que naturalmente rendera boas produções textuais sobre o assunto.
Cláudio - Agradeço pela oportunidade de entrevistá-lo e peço-lhe que deixei uma mensagem aos seus alunos, amigos de profissão e aqueles que pretendem seguir formação em Geografia.
Carlos - Eu é que agradeço a atenção e, me ponho sempre à disposição para quando se fizer necessário uma boa conversa. Aos meus queridos alunos só tenho a dizer que, como afirmado por Jigoro Kano fundador do Judô: “só se aproxima da perfeição quem a procura com constância, sabedoria e, sobretudo com muita humildade”. Vamos à luta!
Muito bom, parabéns
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