Histórias
de vida não terminam com diagnósticos médicos. Ainda mais quando se é criança.
Mesmo se falamos de câncer. Os alunos da Classe Hospitalar Semear contam sobre
isso todos os dias. Basta querer ouvi-los. Somente assim é possível entender a
importância de uma sala de aula dentro de um hospital. Apesar de ser um direito
de toda criança internada, a Semear é a única classe hospitalar em Pernambuco.
Fica no Hospital Universitário Oswaldo Cruz, em Santo Amaro, no Recife. Atende
a pacientes do setor de oncologia pediátrica que cursam da educação infantil
até o 5º ano, pois é ligada à Escola Municipal Herbert de Souza, unidade aberta
à comunidade em geral.
Quem está à frente da Semear também deseja receber jovens
pacientes do Oswaldo Cruz matriculados no Ensino Médio. Mas aí é preciso um
convênio com o governo do estado. E esse passo ainda não foi dado. Pablo Rian
Lopes, 11 anos, está internado no Huoc há duas semanas. Foi transferido de João
Pessoa, na Paraíba, onde mora, por causa de problemas na oferta de
quimioterapia em um hospital público da cidade. Está no quinto ano. No dia da
visita do Diario, fazia tarefa de português ofertada pela professora Cristiane
Pedrosa. A ideia era avaliar o nível do estudante para sugerir outras
atividades ao longo do internamento. A equipe da Semear também troca
informações com a escola onde o paciente está matriculado para ajudar no
preparo das aulas.
“Ao ser internada, a criança perde a rotina da vida e também a
relação com a família, pois muitas moram longe do Recife e nem sempre podem
fazer visitas por conta das condições financeiras. As crianças se sentem
isoladas e a classe hospitalar é o contato delas com o mundo exterior. Há pouco
trabalhamos o período junino, como em qualquer escola, e elas terminam
esquecendo que estão em um hospital. Aqui é onde fazem mais barulho na unidade,
leem, cantam”, brinca Cristiane.
Na Semear, o tempo pedagógico é diferente por conta das particularidades
dos alunos. Uma hora é o período de permanência em sala de aula. A escola abre
às 9h. Antes disso, a professora Cristiane se informa sobre os nomes dos
estudantes que terão aula em sala ou no leito. O quadro pode mudar a qualquer
momento. Quando o atendimento é no quarto, as atividades são mais lúdicas e
envolvem pintura e contação de histórias. A oncologia pediátrica do Huoc é
formada por 24 leitos e ocupa dois andares. A Semear funciona desde 2015.
Devison Riquelme, 8, frequenta a Semear entre as idas e vindas
ao Recife por exigência do tratamento. Ele també é de João Pessoa. Gosta de
pintar e de matemática. Quer estudar para ser pedreiro, assim como o pai. “A
história da criança não termina com o diagnóstico. A classe traz um ganho enorme
no tratamento. Não falo só de ficar bom. Falo de ofertar humanização. O ideal é
atender a todos, mas não podemos colocar os mais velhos na sala porque falta
convênio com o estado, responsável pelo Ensino Médio”, explica a médica Vera
Morais, do Grupo de Ajuda à Criança Carente com Câncer, de quem a Prefeitura do
Recife é parceira para montar a classe no Huoc.
Rafael Gomes, 30, é formado em pedagogia pela UFPE e já
fez tratamento de câncer no Huoc quando tinha 3 anos. Na época, a Semear não
existia, mas, durante a graduação, Rafael conheceu a iniciativa na função de
estagiário. Por isso fez o trabalho de conclusão de curso abordando a
importância da Semear na escolarização das crianças com câncer. “O lúdico é
muito importante no tratamento das crianças. A sala ameniza a dor e o
sofrimento agudo na alma. A classe é importante não porque os pacientes são
coitadinhos, mas porque é um direito ter acesso à educação.”
Ao final do internamento, o aluno volta para a escola de origem
com um portfólio de atividades feitas em sala de aula. Segundo Priscila
Angelina, que coordena a intermediação dos alunos com as escolas, um estudo de
2015 apontou só 155 classes hospitalares no Brasil. A classe hospitalar era
respaldada pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e
Inclusão, do Ministério da Educação, que no início do ano foi extinta.
Maria Costa, diretora executiva de gestão de rede da Secretaria
de Educação do Recife, disse que o objetivo é ampliar a classe hospitalar para
outros hospitais do Recife. Mas isso depende de convênios com as unidades de
saúde.
*Fonte: Diário de Pernambuco/Cremepe
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