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O IRMÃO MAIS VELHO DO CRISTIANISMO


Por Michel Zaidan Filho

A frase foi pronunciada, certa vez, pelo papa João Paulo II, no esforço do exercício de um ecumenismo religioso incompleto, em relação ao Judaísmo. Mas o problema começa quando se analisa o vínculo genético que uniria uma e outra religião: a figura do messias cristão. Neste ponto, o livro de David Strauss, “Vida de jesus”, tratando dos aspectos históricos da vida do fundador do Cristianismo. Quem foi Jesus Cristo?

Poderia Cristo se considerar o messias, ansiosamente, aguardado pelos filhos de Judá ou não? – Sabe-se que até hoje os israelitas esperam a vinda de seu messias; outros acham que ele nunca virá. De toda forma, Jesus Cristo não é reconhecido pelos judeus como seu messias. Mas Jesus, como Moisés, era judeu. Tinha nascido na Judéia, Samaria. Sua trajetória parecia ter sido antevista ou profetizada pelos profetas do Velho Testamento. A questão não é esta. A questão é quem diz e quem escreve sobre o que Jesus é. Trata-se de uma hermenêutica dos textos neo e vestutamentários que consagraram a doutrina da religião cristã. E aí sobressai a figura do apóstolo Paulo de Tarso, judeu – formado no espírito da filosofia neoplatônica, e convertido ao Cristianismo. Ninguém mais do que Paulo ajudou a criar a figura – tão conhecida – de Jesus Cristo de Nazaré. É preciso pois considerar o Cristianismo, antes e depois de Paulo de tarso. Mais ainda, se for levado em consideração as vozes do cristianismo primitivo, associado aos Essênios. O Jesus Cristo apresentado pelo apóstolo Paulo, através de suas epístolas, é uma construção doutrinária (e exegética) que ajudou a fixar a visão oficial da figura do messias cristão. Sobretudo, aquela que foi apropriada, segundo suas conveniências, por Martinho Lutero e seus seguidores.

 A relação (que se quer genética) entre o Judaísmo e o Cristianismo passa, naturalmente, pelo esforço exegético de São Paulo, como passa pela doutrina dos primeiros padres da Igreja (a patrística). Mas não leva em consideração a mudança que se opera na visão de “um Deus, senhor dos exércitos”, com a espada na mão para combater os gentios, para a imagem de um Deus que oferece a outra face aos inimigos. O que o Cristianismo deixou para trás foi o conceito de um ideal de “justiça retributiva” (a lei de Talião), em favor de uma justiça restaurativa, que não busca vingança, retaliação, mas sim restauração de uma eticidade cindida, quebrada. A ética do Cristianismo primitivo pode ser tudo, menos guerreira, punitiva.

Naturalmente, esse ideal ético e religioso sofreu mudanças. Desde a transformação do Cristianismo em religião oficial do Império romano, por Constantino, passando pelo Concílio de Trento e a contrarreforma, esse ideal sofreu profundas e inúmeras transformações. A mais séria delas, com todo um cortejo de consequências para o mundo ocidental foi a operada por Martinho Lutero: a transformação da ética restaurativa  numa ética puritana do trabalho, que elege a iniciativa do indivíduo e o papel do indivíduo na salvação. Deve-se a Lutero e mudança de ter introduzido no coração do Cristianismo o chamado “individualismo possessivo”, a ideia de que o crente ou piedoso se salva através de seus atos, não de suas crenças, de suas atividade cotidiana, prática, material. E a manifestação da graça divina se dá através da prosperidade material (“presente de Deus”), como se diz comumente.
 É dessa interpretação individualista, calculista e abstemia (não gasta, acumula bens) que se alimenta a Igreja reformada e suas inúmeras ramificações. Tendo como origem uma leitura fundamentalista dos evangelhos, sobretudo paulinos, os cultos reformados serviram como uma luva ao formidável esforço de acumulação de capital dos países ricos e exportaram para a periferia do mundo capitalista uma versão abastarda do cristianismo reformado. Esta versão tem um nome, chama-se “pentecostalismo” e “neopentescostalismo”, e uma teologia própria, a teologia da prosperidade (para se contrapor à teologia dos oprimidos). Ela funciona à base de uma lógica simplista: quando mais se dá a Deus (ou a seus prepostos), mais aumenta o crédito do crente ou do cristão diante de Deus. Teologia conservadora em matéria de costumes e orientada para a canalização dos instintos para a acumulação de bens e de capitais.  A virtude é ser rico e se dá bem. O pecado é ser pobre e viver na miséria. Nem o estado ou as condições sociais têm nada a ver com isso. O indivíduo e sua profissão de fé são os únicos responsáveis pelo sucesso ou o fracasso de cada um.

Como era de se esperar a disseminação de uma religião como essa entre os pobres e os moradores da periferia das cidades brasileiras iria produzir a vinda e a eleição de outro “messias”: Jair Bolsonaro. Com o fim da Teologia dos oprimidos e as comunidades eclesiais de base, os pobres foram entregues à ilusão do enriquecimento fácil, da ascensão social garantida, no acesso ilimitado aos bens de consumo duráveis, que garantem status e reconhecimento social. Ser cristão, nessa versão, é ser um vencedor, naturalmente compartilhando com o pastor e sua família os frutos de seu sucesso pessoal. Bom crente é o que  prospera, fica rico e sonha com o “american way life”. Não espere desse tipo de cristão nenhuma simpatia pelos mais pobres, os negros, os homo e transexuais. Querem se identificar com a elite branca, cosmopolita e milionária.

Esta foi a revolução tardia  da Igreja reformada  no Brasil. 

* Michel Zaidan Filho é natural de Garanhuns. É professor da UFPE, na área de ciências humanas, escreve para jornais e sites, colabora regularmente com este blog e tem diversos livros publicados.

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