Causo de Junior Almeida
A
banca de jogo de bicho “A Sorte” foi fundada em 1937, segundo as informações
que constam na placa de identificação em sua fachada. Sua sede fica em
Garanhuns, na Rua Santos Dumont, próxima à Praça João Pessoa, no local
conhecido como “Brás”, mas, suas filiais e seus passadores de jogo, os chamados
cambistas, estão espalhados pela cidade e por toda região do Agreste Meridional
de Pernambuco. Em Capoeiras, município vizinho à Suíça Pernambucana ocorreu um
episódio no mínimo curioso, que merece registro, envolvendo um funcionário da
referida banca. Foi assim:
Corria
a década de 1970, e já existia na cidade de Capoeiras, havia algum tempo, a sua
“banca de jogo do bicho”. Por essa época quem gerenciava o negócio, que desde
que se estabeleceu na terrinha, funciona no mesmo lugar, era um sujeito com
pouco mais de 60 anos, vindo das bandas de Belo Jardim. Era ele quem abria e
fechava a casa, que recebia o jogo dos cambistas e que pagava os prêmios. Era
gente de confiança do dono. O homem passava a semana toda por essas bandas,
comendo de freguesia nos hotéis e bares locais, tomando banho de cuia e fazendo
suas necessidades num precário banheiro do imóvel, e dormindo num quartinho nos
fundos da banca, só indo pra casa nos sábados depois da extração da tarde e retornando
na segunda-feira logo cedo.
O
cabra era “desenrolado”, bom de amizades, mas meio bruto. Zangava-se com
facilidade quando brincavam com ele ou quando se via contrariado. No seu
deslocamento não pagava condução, pois ia e vinha montado em sua lambreta verde
e branca, essa com aproximadamente 20 anos de uso. Mesmo com essa idade toda a
“bichinha” nunca tinha dado o prego, e o cambista se derretia em elogios
gabando a sua máquina. O sujeito pegava os 55 quilômetros de estrada, de barro
naquele tempo, que separam Capoeiras de Belo Jardim, e aproveitava a viagem
para ganhar mais uns trocos pelo caminho, passando jogo na Vila Maniçoba, Sítio
Una, cidade de São Bento e outros locais até chegar à Terra do Bituri.
Com
o passar do tempo já muito conhecido na cidade, pois não é que o cambista
começou a namorar por essas terras? Mesmo casado, com mulher e filhos morando
em Belo Jardim, o cabra começou de chamego com uma dona que tinha aparecido na
terra dos Borregos, e seu comportamento, antes exemplar, começou a mudar. Mesmo
tentando esconder o romance com a quenga, ele não conseguia disfarçar, pois
passou a ser relapso em seus afazeres. Muitas vezes abria a banca tarde, já
tendo gente esperando pra jogar, saia pra almoçar e enchia a cara de cachaça,
deixava de recolher apostas em determinados pontos e já tinha chegado ao ponto
de pagar do próprio bolso uma sorte, por não ter recebido no horário o talão de
um cambista.
Como
o lucro da banca diminuíra, tudo por culpa do novo comportamento do gerente da
casa, o dono foi à Capoeiras saber o que estava acontecendo. Não demorou achar
quem o deixasse a par da situação. O cambista era empregado de muitos anos e
não perdeu seu trabalho, mas não deixou de ser severamente advertido, com a
ordem expressa que deixasse a rapariga, pois seu emprego dependia disso. Como
se não bastasse a regulagem do patrão, o cambista soube de uns namoros da
mulher que ele julgava ser só dele e a sua lambretinha começou a dar defeito,
deixando-o com um mau humor desgraçado.
-É a peste mesmo! Além de estarem comendo
minha nega, minha lambretinha, que nunca tinha dado defeito, agora inventou de
viver se quebrando. Só falta mesmo agora, o “bicho” atentar, e a minha mulher
descobrir tudo. Dizia um enfezado cambista.
Não
era difícil ver o cabra nas ladeiras
de Capoeiras tentando botar a lambreta pra pegar no tranco. Alguns, escondidos,
evidentemente, mangavam de toda aquela situação. Umas carolas até insinuavam
que a maré de azar do cambista era castigo por ele ter arrumado uma “asa
negra”, termo como se referiam a uma puta.
Quase
em frente à banca, um pouco mais pra baixo, sendo do outro lado da rua, atual
Praça João Borrego, existia o bar e sinuca do Mestre Lau, prédio que fica entre
a loja de Celso e o supermercado de Jaelson. Pois bem. Em uma tarde de sábado
do verão de 1974 ou 1975, o bar estava lotado. Muitos “aperuavam” uma disputada
partida de sinuca entre Aleluia e Neílton de Dona Betinha, então os dois
melhores jogadores da cidade. Além do jogo das sete bolas no sinucão, outra
coisa chamava a atenção naquele dia: o cambista que por fina força tentava
colocar a sua lambreta pra pegar no tranco. O sujeito subia a ladeira
empurrando seu transporte e descia tentando fazer com que ela ligasse. Vez por
outra a lambreta dava uns tiros.
-É o platinado! Palpitavam alguns.
Foi
tanto tiro de lambreta nesse dia, que as pessoas nem reparavam mais a
tragicômica cena. Para os presentes no bar do Mestre Lau, o jogo de sinuca e as
apostas, seriam mais interesses pra eles, mas isso só até ouvirem uns tiros com
um barulho diferente. O cambista já tinha subido a rua empurrando sua lambreta
pelo menos umas cinco vezes, e descido em igual número montado, tentando
colocá-la pra pegar. Tava suado, cansado, e puto da vida. Pronto pra brigar com
qualquer um que ousasse dizer uma piadinha. A gota d’água para explodir em
fúria foi um “coice” que levou de sua lambreta. Ainda montado na moto,
acionou o seu pedal com o pé, na última tentativa de fazer o motor pegar, mas a
peça pegou compressão e deu retorno na canela do cabra.
-Puta que pariu. Febre do
rato. Peste! Esbravejou o homem, ao pular da lambreta,
deixando-a cair no chão.
Na
calçada da banca o cambista pulava num pé só, tentando em vão aliviar sua dor.
A pancada havia sido tão grande que no exato local do “coice” estava parecendo
mais uma manga, tamanho o hematoma. A perna do cambista começou a sangrar,
sujando toda calçada e, isso fez com que ele tomasse atitudes extremas. Entrou
na banca, abriu a gaveta do seu birô e pegou seu 38. Babando de ódio o cabra descarregou toda sua fúria e as
balas do seu revólver na indefesa lambreta, que já estava caída no chão. Do bar
do Mestre Lau o povo ouviu os tiros, percebendo que não eram mais os da
lambreta. Dentre os que assistiam o desafio de sinuca, o policial militar
Magalhães, que pensando em se tratar de uma briga, correu até o local, se
entrincheirando, mas de arma na mão. Com Magalhães à frente, o povo correu
atrás, inclusive os jogadores, para ver o que tinha acontecido. Em frente à
banca, todos puderam ver o “corpo” estendido no chão. Pobre lambreta, que tanto
tinha servido ao seu dono, agora jazia sem vida, com seu coração vazando seu
negro sangue nas ruas de Capoeiras.
Algum
tempo depois dessa “morte”, o cambista, se supõe, reatou o romance com sua
quenga e, depois arrumou um esquema de passar a mão no dinheiro do patrão,
recebendo antes dos outros o resultado da extração do bicho. Com a ajuda de
quem passava os números, era colocado um anúncio na rádio dizendo que tinha
sido roubado um carro de placa tal. Era essa a senha para o roubo. O gerente de
Capoeiras botava uns laranjas seus comparsas pra jogar por ele, gratificando-os
pela fraude. Não foi muito tempo e o esquema foi descoberto, tendo o cambista
que fugir para não arcar com maiores consequências.
Êita Júnior Almeida só faltou o famoso "bexiga-lixa". Kkkkkkk boas gargalhadas.
ResponderExcluirÉ o platinado!!!!
Este era um defeito muito comum nos transportes nas décadas de 70.
Pense num causo arretado.
Tu devia botar esses causos num canal próprio pra gente visitar.
Bom mesmo, manda mais, visse.
Kkkkkkkkkkkkkkkk