Por Michel Zaidan Filho*
Duas características marcam o ano político de
2017: ilegitimidade e arbítrio.
O que se anunciava de forma
imprecisa e casuística, se apresentou com clareza brutal no segundo
ano do golpe. A ilegitimidade do Poder Executivo e do Poder Legislativo para
fazer reforma da Constituição, foi a condição necessária para que tanto um como
outro tivesse a audácia de atacar abertamente direitos, garantias,
comandos constitucionais, o patrimônio público etc.
Com a conivência de dois partidos
derrotados eleitoralmente nas últimas eleições presidenciais: PSDB e DEM. A
revanche política veio na forma do golpe e a compensação, em termos de uma
agenda que jamais passaria pelo crivo da sociedade, se estivéssemos num
período de legalidade democrática ou em época de eleição.
Nem no Congresso, onde viceja o
mais crasso fisiologismo entre os nobres deputados e senadores, havia consenso
necessário para as emendas constitucionais atentatórias de direitos e
conquistas sociais.
Mas o ambiente de
ilegitimidade - juntamente - com a corrupção política - deve ter
permitido a tramitação e aprovação céleres de medidas e propostas, que
ninguém teria coragem de apresentar em outras circunstâncias. Quando se fala de
"Estado de exceção", "insegurança jurídica", "partidarização
da justiça" e "crise de representação", alguns tomam isso
como exagero. Mas só num ambiente de decomposição partidária como o que estamos
vendo nas casas legislativas, estimuladas por uma verdadeira quadrilha de
rufiões, explica como foi possível assaltar à cidadania do povo
brasileiro, através de uma pretensa legalidade.
Dado o golpe parlamentar, como bem disse o ex-advogado-geral da União, foram arrombadas as portas do Constitucionalismo social de 1988 e sua pletora de direitos sociais. O programa ultra-liberal, já anunciado pelo PMDB na TV, "pontes para o futuro", foi muito além do neoliberalismo desavergonhado de Fernando Henrique Cardozo, que aliás nunca quis se assumir como tal.
A audaciosa alienação do patrimônio
nacional (a venda do pré-sal por uma bagatela, a venda da Eletrobrás, dos
bancos públicos, da Amazônia) jamais tinha sido sonhada pelos mais
privatizantes do PSDB.
O negócio só foi possível graças a
ilegitimidade dos atuais mandantes. Não foram eleitos. Não precisam ser
reeleitos. Não devem satisfação a ninguém. Agem como gerentes, os prepostos de
interesses antinacionais, antidemocráticos, antipopulares.
Voltamos a ser aquela "colônia
de banqueiros" de que se falava antigamente. Paraíso da especulação
financeira, governado por ministros e intendentes que são dublês de
"homens de negócio" das grandes empresas, como se tivessem sidos
colocados em seus postos por elas, para cuidarem de seus interesses.
Está aí o caso clamoroso desse
malfadado ministro da fazenda, presidente do Conselho de Administração do grupo
JBS, de quem recebeu milhões por "consultorias" prestadas aos
irmãos Batista. Há quem duvide da ação desses "dublês" na condução
das coisas públicas?
Enquanto isso, a sociedade ainda
não despertou da letargia do golpe desferido contra as instituições. Uns, por
vergonha, outros por fraqueza, sectarismo e divisão. As centrais sindicais
estão sendo chantageadas pelo governo, por conta do imposto sindical
compulsório, além das divisões naturais. A classe média, ainda destilando o seu
ódio contra Lula, Dilma e o PT. Quem nos salvará da catástrofe? - Marina Silva?
Jair Bolsonaro? Rodrigo Maia? Ciro Gomes?
É o momento de muita angústia e expectativa esse
que acompanha o fim do ano. O ambiente eleitoral de 2018 (e há quem
duvide se teremos eleições) não é só indefinido. Parece sombrio, diante da
possibilidade de não termos boas candidaturas competitivas, para disputar as
eleições. Aguarda-se o segundo julgamento de Lula.
Aguarda-se a estratégia dos
partidos de esquerda ou centro-esquerda. Aguarda-se o nome dos candidatos. No
momento, o que se tem de certo são duas direções: a cruz e a espada. Nenhuma
delas é boa para o país.
*Michel Zaidan Filho é cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco.
Um comentário lúcido e bem equilibrado nos trazendo informações úteis e necessárias.Precisamos ouvir,ler e interpretar as opiniões divergentes e tirar as nossas próprias conclusões.
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