Por Junior Almeida
ESPECIAL - Cemitério é
um lugar estranho, bem estranho. Visitando o campo santo de
Capoeiras observamos que algumas ruas, praças e avenidas da nossa cidade estão
lá. Tem João Borrego, que dá nome a praça principal; seu filho Heronides, a
Praça da Cacimba do Pau, José Belarmino Teixeira - que foi o primeiro oficial
do cartório de Capoeiras - e empresta seu nome à rua da escola A Sementinha,
José Praxedes, que é a rua da cadeia, dentre outras. Foram pessoas,
humanos, hoje apenas nomes de vias públicas.
No cemitério estão também nossos amigos, companheiros de vários momentos, bons e ruins, e quando estamos ali, em frente de onde jazem seus corpos, lembramos das suas vidas ou como se deram as suas mortes. Doenças, acidentes, violência... Têm também nossos parentes, as pessoas que amamos em vida, que agora estão ali, pelo menos a matéria, pois a alma está onde acredita a crença de cada um. Um cemitério é um lugar estranho, não deixa de ser.
Tratando do doloroso assunto, o poeta paraibano Jessier Quirino, gênio das palavras e com uma sensibilidade capaz de fazer uma história bonita até para tratar de morte, tem um dos poemas mais bonitos do seu repertório, que é “amorrença dos meus compadres”, em que ele relata como se deu a hora derradeira dos seus conhecidos, amigos e compadres.
Estamos em março de 2016, e parece que a caetana anda solta por essas bandas. Para quem não sabe,caetana é o apelido que o mestre Ariano Suassuna colocou na morte. Pois bem, na véspera do dia de São José, padroeiro da cidade, foi enterrado Manoel do Fogão, ou Manoel do Doce, como alguns o chamavam, que tinha morrido no dia anterior. Tem um ditado que diz que “quer ser bom, morra ou se mude”. Comigo não! Bom é bom, e ruim é ruim. Não é por que morreu, mas o “veio” Mané do fogão era de primeira qualidade. Gente de bem, ele e toda a família, seu Mané era dessas figuras folclóricas que se tem em cidades do interior como a nossa.
Contador de causos só tinha até ele. Para se ter uma ideia da figura, o seu bar tinha o singelo nome de “Bar da Mentira”. Ultimamente criava um bode de estimação, tal como se fosse um cachorrinho. Todo dia ia de sua casa, perto da Cacimba do Pau, até o seu comércio, na rua da feira de frutas, com o bode andando atrás. A meninada adorava. Seu Mané certa vez me contou um de seus muitos causos. Disse que teve um prejuízo grande quando tinha sua bodega no Sítio Alto do Tejo. Perguntei o que tinha sido, já esperando a bomba. Ele então disse:
No cemitério estão também nossos amigos, companheiros de vários momentos, bons e ruins, e quando estamos ali, em frente de onde jazem seus corpos, lembramos das suas vidas ou como se deram as suas mortes. Doenças, acidentes, violência... Têm também nossos parentes, as pessoas que amamos em vida, que agora estão ali, pelo menos a matéria, pois a alma está onde acredita a crença de cada um. Um cemitério é um lugar estranho, não deixa de ser.
Tratando do doloroso assunto, o poeta paraibano Jessier Quirino, gênio das palavras e com uma sensibilidade capaz de fazer uma história bonita até para tratar de morte, tem um dos poemas mais bonitos do seu repertório, que é “amorrença dos meus compadres”, em que ele relata como se deu a hora derradeira dos seus conhecidos, amigos e compadres.
Estamos em março de 2016, e parece que a caetana anda solta por essas bandas. Para quem não sabe,caetana é o apelido que o mestre Ariano Suassuna colocou na morte. Pois bem, na véspera do dia de São José, padroeiro da cidade, foi enterrado Manoel do Fogão, ou Manoel do Doce, como alguns o chamavam, que tinha morrido no dia anterior. Tem um ditado que diz que “quer ser bom, morra ou se mude”. Comigo não! Bom é bom, e ruim é ruim. Não é por que morreu, mas o “veio” Mané do fogão era de primeira qualidade. Gente de bem, ele e toda a família, seu Mané era dessas figuras folclóricas que se tem em cidades do interior como a nossa.
Contador de causos só tinha até ele. Para se ter uma ideia da figura, o seu bar tinha o singelo nome de “Bar da Mentira”. Ultimamente criava um bode de estimação, tal como se fosse um cachorrinho. Todo dia ia de sua casa, perto da Cacimba do Pau, até o seu comércio, na rua da feira de frutas, com o bode andando atrás. A meninada adorava. Seu Mané certa vez me contou um de seus muitos causos. Disse que teve um prejuízo grande quando tinha sua bodega no Sítio Alto do Tejo. Perguntei o que tinha sido, já esperando a bomba. Ele então disse:
Meu filho, prejuízo grande eu tomei
lá no sítio. Madalena (sua esposa) fazia uns doces bons de mamão. Temperados
com cravo, canela em pau e ainda um pouco de coco ralado num marisco. Era tão
bom que não dava pra quem queria. A novidade se espalhou e eu vendia doce como
uma beleza. Tinha um rapaz filho de um vizinho que tinha chegado de São Paulo
que trabalhava abrindo letreiros. Era bom no que fazia. Então eu mandei ele
pintar a parede. Ele fez uma coisa diferente. Escreveu “VENDE-SE” e ao invés de
escrever a palavra doce, ele desenhou um pirex com o doce dentro. Ficou uma
coisa linda de tão bem feito. Paguei satisfeito o trabalho do rapaz.
Então eu perguntei se o prejuízo
tinha sido esse. Seu Manoel disse que não, e então continuou:
Ficou uma pintura bonita, chamava
atenção, mas a desgraça foi aí. Fechei a bodega e fui pra casa, quando fui
abrir no outro dia me espantei. As formigas tinham comido todo o reboco da
parede onde tava o doce.
Disse isso e saiu como se tivesse falado a coisa mais séria do mundo. Assim era “seu” Mané do fogão. Que Deus o tenha.
Disse isso e saiu como se tivesse falado a coisa mais séria do mundo. Assim era “seu” Mané do fogão. Que Deus o tenha.
Seu Manoel não era tão velho, tinha
apenas 69 anos, mas seu coração o traiu. Era um dos antigos por essas bandas,
um dos troncos velhos da cidade. Outros troncos já
fizeram suas viagens. Foram embora Lula Cordeiro, Sebastião Leitão, Gildo
Marques, Olegário, Alvinho, Eutrópio, Pedro Cândido, Miguel David, Adalberto,
Superpino, Major, Zé Fogueteiro, Zé Galindo... Viajou meu pai Euclides, meu avô
Zé Teixeira, Zé Marques, Seu Doca, Zé Mandu, Alfredo, Manoel Souto, Adauto
Praxedes, Zé Pretinho e tantos outros que fizeram parte da nossa história, que
deixaram suas sementes em Capoeiras.
As muitas mulheres de fibra também
deixaram um pouco de si nessa terra. Dona Maria Nunes, Dona Joana
Bezerra, Dona Izabel Pesqueira, Santina, Iraci, Zuleide, Maria de Aluizio,
Antônia Turunga, Dona Betinha, Terezinha, Olivia Lino e de Adalberto, Alice de
seu Doca, Lia Urbano, Lídia de Zé Marques, Dona Adelaide, Josefa Claudino e Chico,
Maria de Gabriel Branco e tantas outras mulheres e homens de outras gerações
que já se foram. Falta muita gente pra citar, mas essas foram as que eu
lembrei. Atualmente resta pouca gente dos chamados troncos velhos.
O primeiro prefeito de Capoeiras, Gabriel Branco, é de 1917, ano de nascimento do meu pai, e ainda está entre nós. Zezinho Borrego que governou Capoeiras por três vezes completou noventa anos. Ainda dirige e toma umas caipirinhas antes de almoçar. É firme e forte como uma rocha. Dona Moça de Elói, que faz 97 anos dia 21 de março deste ano, e que mesmo com essa idade não reclama do tanto de barulho que fazem perto de sua casa diariamente. Nelson de Lau passa dos noventa e também é firme e forte, assim como Dona Marinete, pessoa caridosa e de fé da nossa cidade.
O primeiro prefeito de Capoeiras, Gabriel Branco, é de 1917, ano de nascimento do meu pai, e ainda está entre nós. Zezinho Borrego que governou Capoeiras por três vezes completou noventa anos. Ainda dirige e toma umas caipirinhas antes de almoçar. É firme e forte como uma rocha. Dona Moça de Elói, que faz 97 anos dia 21 de março deste ano, e que mesmo com essa idade não reclama do tanto de barulho que fazem perto de sua casa diariamente. Nelson de Lau passa dos noventa e também é firme e forte, assim como Dona Marinete, pessoa caridosa e de fé da nossa cidade.
Essas pessoas têm muito a nos ensinar. Já passaram por guerras, ditaduras, eleições, cangaço e vários momentos desse país. Têm que ser respeitadas, merecem nossa admiração. Daqui uns tempos seremos nós os troncos velhos de Capoeiras e também faremos nossas viagens para que venham as novas gerações, os ramos novos. Encerramos com o final da poesia de Jessier Quirino que diz:
Perdi
meus compadres, não sei quando eu vou...
Foto: Manoel Antônio,
Adalberto Bezerra, Doca Teixeira, José Manoel (sentado de chapéu), Gabriel
Branco, Euclides Almeida (meu pai) e Luiz Branco. Gildo Marques (foto
incompleta), Zé Galindo(com cigarro), Zé Pretinho e Louro Tenório.
Dona Betinha, tenho boas recordações do hotel de D.Betinha.!
ResponderExcluirAgradecido em nome de toda familia por essa homenagem linda, esse homem que amou de tudo e a todos! e agora recebeu a sua paz tão merecida.
ResponderExcluirMeus amigos, veja como meu pai era tudo de bom. foi homenageado até na cidade q ele escolheu como morada, eu mesmo fui testemunha de várias discussão dele c minha mãe pq ele queria mora na cidade e ela não queria deixar seu sítio , hoje essa cidade faz essa homenagem a meu herói. Muito obrigada por toda a família eu sou a mais velha de todos seus sete filhos q ele cuidou muito bem.
ResponderExcluirConheci seu Zé do Doce, gostava muito dele. Me fazia rir demais sempre que eu o encontrava, fosse em Recife ou em Alto do Tejo. A Terra ficou um pouco mais triste e o céu mais alegre.
ResponderExcluirBela matéria, Junior. Zé pretinho, o meu avô.
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