Uma polícia federal é boa se
investigar os “inimigos” políticos, vazar informações, devassar e destruir
reputações; uma polícia federal está "aparelhada" e é persecutória,
agride e ameaça "a liberdade" se investigar “meus filhos e meus
militantes”. Uma Justiça é boa se “me contempla e é servil”, uma Justiça é
parcial se "me impede de fazer o que quero e pode condenar os meus por
delitos”. Eis um pensamento tirano, eis um pretendente: Jair Bolsonaro.
"Eu blindo os meus e persigo e puno os teus", raciocina uma mente
tirana.
O presidente da República, no
alto dos delírios - um dia conciliador, o outro, terror - não esta só.
Bolsonaro não se limita a suas milícias virtuais. Calculista, o presidente
conta com generais como aliados, pelo menos os que estão no terceiro andar do
Planalto. Militantes digitais e de rua, militares radicais e o mundo obscuro do
sistema de segurança do Estado dão a Bolsonaro a sensação de poder para blindar a si mesmo, os filhos e os
"amigos" contra investigações e processos. Blindagem contra a
autonomia da Polícia Federal, a independência constitucional do STF e do
Congresso e a oposição de seus adversários políticos. A parcela eleitoral, que
decresce nas ruas, serve-lhe como massa de propaganda.
No Brasil de hoje é improvável um Estado fascista, mesmo que generais de extrema-direita estejam ao redor do presidente, porque a formação ideológica restrita da maioria do governo não respalda essa possibilidade. Os contextos externos e internos também são desfavoráveis a aventuras desconexas do mundo. Mas, e um Estado fora da lei? Um Estado policialesco? Um Estado miliciano? Aquele que sirva aos interesses de uma família, de um grupo, de uma ideia de "limpeza" social que se concilie com a ocultação dos malfeitos do governo.
Um Estado que atropele a
Constituição, algeme as instituições e tente silenciar a oposição não ficaria
impune ao final. Antes, porém, faria seu estrago. O receio que existe tem
sentido nas frequentes ameaças. Não está unicamente nas faixas dos militantes
nas ruas. Está mais nas palavras, vídeos e redes digitais de Bolsonaro, seus
filhos e de militares, como o general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança
Institucional. Ao receio interno se junta a imagem de párea que o Brasil acaba
passando no concerto das nações democráticas a cada ameaça verborrágica. Uma
ditadura sob controle de uma família seria uma encenação ridícula de circo
mambembe.
Em um ano e cinco meses de
governo, não são só as ideias e surtos ditatoriais que têm assustado o país. A
obsessão por liberação de armamento, a violência como discurso político de
segurança e como solução contra a violência urbana, a pregação do ódio e do
militarismo e as relações com milicianos cariocas complementam o teatro
governista. A apologia a 64, a desconsideração a organismos internacionais, a
leitura distorcida da história, a saudação a personagens que cometeram crimes
contra a humanidade e os direitos humanos, tudo agrega-se a um governo que
arrisca-se a ficar fora da Constituição.
Atacar a imprensa e
jornalistas, macular adversários e apontar conspiração inimiga nas instituições
que limitam as ações ilegais parecem parte da estratégia de poder. Ameaçar
descumprir ordens do STF seria, porém, o gesto mais irracional de Bolsonaro.
Não seriam as milícias digitais ou as armadas que dariam segurança a um Estado
fora da lei. Muito menos os generais leais iriam querer ser confundidos. O jogo
de Bolsonaro e seus radicais correria o risco de não suportar uma aposta
alta.
*Ayrton Maciel é jornalista. Artigo publicado também no blog de Magno Martins.
Nenhum comentário:
Postar um comentário